domingo, julho 30, 2006

Envelope 9 e Estado de direito



Discutir o Estado de direito com quem sabe



Um leitor do CC poupou-nos trabalho. Fez-nos chegar, por e-mail, o artigo de Francisco Teixeira da Mota a que fizemos alusão no post anterior. Reproduz-se a parte que respeita às peripécias em torno do Envelope 9:

    "A estratégia seguida pela Procuradoria-Geral da República no caso do "envelope 9", para bem de todos nós, falhou estrondosamente. E se, em geral, será incorrecto falar de vitória e derrota da actuação de um órgão que se move somente pela defesa da legalidade (e que, assim, ganhará sempre, mesmo que perca), a verdade é que neste processo, a PGR, apoiada pelos sectores menos "esclarecidos" do Ministério Público, declarou abertamente guerra a uma das maiores garantias do nosso sistema democrático, a liberdade de imprensa.

    Parece desnecessário sublinhar, uma vez mais, que a liberdade de imprensa, o direito ao sigilo profissional dos jornalistas e ao segredo das suas fontes não constituem quaisquer privilégios dos jornalistas, antes garantias essenciais para todo e qualquer cidadão, de que se encontra minimamente garantido o direito de se poder escrever ou falar sem medo de perseguições retaliatórias dos mais diversos "poderes".

    A forma verdadeiramente sinistra como o processo urgente pedido pelo ex-Presidente da República se tornou num processo moroso perdido pelo futuro ex-Procurador Geral da República é fascinante: desde o início, o PGR optou pela não realização de um processo urgente, de carácter administrativo que teria permitido saber quem tinha colocado dados pessoais das mais diversas individualidades no "processo Casa Pia" e escolheu a via de um processo crime, objectivamente para "apanhar" os jornalistas e quem lhes tinha fornecido os elementos que constavam do processo. Na lamentável entrevista dada ao jornal "Expresso" pelo PGR que ficou claro que o arrastar do processo servia um único fim: perseguir jornalistas e, "cereja em cima do bolo", o(s) eventuai(s) advogados(s) da defesa no referido processo se se conseguisse provar que tinham fornecido o material em causa à imprensa. Não só esse(s) advogado(s) seriam criminalmente perseguidos como a defesa no "caso Casa Pia" seria descredibilizada no seu conjunto para gáudio da acusação. Os sectores mais obscurantistas do Ministério Público, indiferentes ao "esmagamento" da liberdade de imprensa, sempre vista como algo de instrumental e não de estrutural, regozijavam com a hipótese de "humilhar" ou mesmo "queimar" algum advogado na praça pública e, de caminho, "colocar a imprensa na ordem" - uma ambição não assumida publicamente mas , infelizmente, com muitos adeptos nos meios judiciais para quem o "respeitinho" é um valor constitucional. Provavelmente da Constituição de 1933...

    Contava o Ministério Público com tal "ambição oculta" e que seria aceite pelos tribunais o entendimento de que a administração da justiça que se prosseguia com a apreensão dos computadores e a sua devassa, "valia" mais do que o sempre dispensável sigilo profissional dos jornalistas.

    Como muito justa e corajosamente, referiu o juiz conselheiro Artur Costa num debate público realizado na altura, há uma tendência dos tribunais para neste confronto entre os diversos legítimos interesses em causa, sobrevalorizar o interesse na administração da justiça e desvalorizar o sigilo profissional e a liberdade de imprensa. E, na 1.ª instância, o juiz que apreciou a questão, sem quaisquer dúvidas visíveis, entendeu que efectivamente os computadores dos jornalistas deviam ser apreendidos e devassados.

    Mas as garantias do nosso sistema judicial permitiram que os juízes desembargadores Telo Lucas, Rodrigues Simão e Carlos Sousa do Tribunal da Relação de Lisboa, apreciassem a questão e também não tiveram dúvidas: o segredo profissional dos jornalistas é um direito fundamental e uma garantia do nosso Estado de direito democrático que não pode ser posto em causa pelo interesse na administração da justiça, quando estão em causa razões menores como a perseguição e eventual punição de um invocado crime de acesso indevido a dados pessoais. Acrescentando o acórdão: "É claro que noutras situações assim não será, soçobrando aquele direito perante o valor e o interesse público na realização da justiça - pense-se, a título de mero exemplo, nos casos em que está em causa a violação do direito à vida ou naqueles que constituem factos típicos contra a realização do próprio Estado de direito". Um acórdão curto e sensato que "lembra" à Procuradoria-Geral da República que os fins nem sempre justificam os meios...

    E, assim, o processo urgente pedido pelo Presidente que tinha rapidamente "despachado" as responsabilidades dos funcionários da PT e do M.ºP.º, para se centrar gulosa e morosamente nos jornalistas e eventuais advogados, foi "despachado", na prática, para a prateleira das inutilidades. Espera-se que, para além de um sabor amargo, este acórdão tenha deixado também alguns ensinamentos aos "fundamentalistas" da realização da Justiça."

11 comentários :

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  2. Como vai ser possível que o MP acuse a equipa do MP que investigou o caso Casa Pia, por ser responsável por essa trapalhada dos telefones e telefonemas feitos por o PR e outros altos funcionários do Estado?
    Vão continuar todos impolutos. A investigação do envelope 9 fica em nada.
    O PGR vai sair do cargo com fraca imagem perante a opinião pública.
    É pena, pois caiu-lhe nas mãos um processo ( Casa Pia) que o anterior PGR não mandou investigar e atirou para o lixo. Não soube, ou não conseguiu, liderar o MP aumentar-lhes a eficiência e a produtividade.
    Receio que o próximo seja pior e venha outro "Arquivador" Geral da República.

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  3. Concordo com o que o primeiro comentador escreveu, salvo nos insultos. Por isso, foi apagado o comentário.

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  4. O futuro ex-PGR defende o MP como se estivesse no Estado Novo. Sem "objectividade" e sem respeito pela "legalidade".
    Ele é o grande culpado pela descridibilização do MP e (por arrastamento) de toda a "justiça".
    Não defende(u) a sociedade contra o verdadeiro crime, mas perseguiu ferozmente quem criticava a "sua" coutada.
    Nunca teve visão nacional, mas apenas a perspectiva curta e míope de um pobre corporativista.
    Com prejuizos irreparáveis para muita gente de bem...

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  5. OH Miguel, e Israel, (também), não o preocupa???

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  6. A impressão que o PGR me deixa é que manda muito pouco dentro do MP.

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  7. Ó Abrantes no essencial estou de acordo, mas por vezes interrogo-me, Será que os Jornalistas podem dizer e escrever tudo sem qualquer tipo de responsabilidade, refugiando-se no segredo de justiça. Tambem e preocupante ou não será?, não sendo qual é o limite?

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  8. Ó Cleópatra!

    Israel está lá tão longe e o "gato constipado" está cá tão perto a azucrinar-nos a cabeça e a enterrar o que resta do pouco prestígio do Ministério Público, tanto que este já é confundido com o do Estado Novo ou, pior, com uma Mafia qualquer. Um pouco de realismo. Só quando formos sensíveis em casa poderemos falar das coisas de fora. Continua, Abrantes, eles não gostam porque não sabem nem conhecem a realidade, pois vivem no alto do seu pedestal de pés de barro e não querem saber da populaça para nada. Enganam-se, porém, porque nem tudo é populaça, nem tudo está para os aturar. A "justiça" já bateu no fundo da panela. Agora está a fazer um buraco na Terra para ver se encontra o centro desta. E a escavadora tem sido conduzida pelo "gato"...

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  9. Toda esta questão faz-me lembrar um jornalista amigo que me disse um dia: "Aqui há gato!!!" E não era que SM também lá tinha o nome...

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  10. Eh pá, atenção que o Teixeira da Mota tb faz parte do lobbie...

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  11. MIAU????
    MIAU mesmo?
    Não me miem, digo, digam!!!
    Ora bolas!
    Ando distraída.
    Isto é mesmo um blog de indignação,
    um Blog anti Justiça, um Blog, olhem para eles e não para mim...
    Ai MIguel!
    Ai Miguel!!!

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