sexta-feira, outubro 20, 2006

Sugestão de leitura - "uma tirinha esquálida e apinhada de gente, no fundo da Europa"

Também tenho dúvidas sobre as scuts, quando me lembro da Via do Infante repleta de carros de turistas espanhóis. Mas será útil ler Vasco Pulido Valente no Público de hoje:

    «As Scut não foram um “disparate” e uma “asneira”. Foram um esforço e um esforço necessário, para ligar o interior ao litoral. Ou, se quiserem, para diminuir a distância crescente entre a civilização do interior e a civilização do litoral. O valor das Scut não se mede em “desenvolvimento”. O que interessa saber é se mudaram o interior e, para bem ou para mal, às vezes para muito mal, mudaram. Quem sugere que o principio do utilizador-pagador se aplique às Scut não percebe com certeza esta evidência primária: faz todo o sentido que toda a gente pague uma política que na prática se destina a transformar todo o país.»

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1 comentário :

  1. As Scut

    Nunca me apanharam na estúpida campanha contra a “política do betão” do dr. Cavaco. Se há alguma coisa historicamente indiscutível é que o isolamento mata. Não se trata só, como certa gente de pouco espírito parece supor, da economia (embora se trate também disso), mas, sem hipérbole, de civilização. Não vale a pena um comentário “erudito”. Basta pensar em Portugal. Como nenhum outro factor, a posição periférica de Portugal determinou o atraso e a semibarbárie em que sempre vivemos. Mesmo hoje o essencial não mudou. Se dantes se costumava dizer que a Europa começava nos Pirinéus, começa agora, para nossa desgraça, na fronteira de Espanha. A mais longa ditadura do Ocidente, o mais velho império colonial, a anacrónica extravagância do PREC e o Estado corporativo e parasitário que a democracia produziu deviam ter educado uma geração. Não educaram.

    Sem que isto seja uma defesa da irresponsabilidade de Guterres, que nada desculpa, é um erro e uma injustiça arrumar sumariamente as Scut na gaveta da inconsciência, do “disparate” e da “asneira”. As Scut não foram um “disparate” e uma “asneira”. Foram um esforço e um esforço necessário, para ligar o interior ao litoral. Ou, se quiserem, para diminuir a distância crescente entre a civilização do interior e a civilização do litoral. O valor das Scut não se mede em “desenvolvimento”. O que interessa saber é se mudaram o interior e, para bem ou para mal, às vezes para muito mal, mudaram. Quem sugere que o principio do utilizador-pagador se aplique às Scut não percebe com certeza esta evidência primária: faz todo o sentido que toda a gente pague uma política que na prática se destina a transformar todo o país.

    Claro que existem incongruências. No Alentejo, por causa do trânsito para Espanha e para o Algarve; e no Algarve por causa dos milhões de turistas que lá caem no Verão. E claro também que o eng.º Sócrates, faltando a uma promessa eleitoral, resolveu abolir as Scut na Costa da Prata, no grande Porto e do Porto a Viana. Mas, felizmente, ficou o resto e o resto é um terço de Portugal, que precisa de mais Scut, não de menos. Como a Ota e o TGV (que, aliás, me custaram a engolir), as Scut não são uma despesa inútil ou facultativa. São a única maneira de Portugal deixar de ser uma tirinha esquálida e apinhada de gente, no fundo da Europa.

    Vasco Pulido Valente, Público, 20 de Outubro

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