sexta-feira, março 02, 2007

Sugestões de leitura




    • Fernanda Câncio [Rocky Portas, a sequela, parte 4]:

      «(…) Paulo Portas é uma espécie de mutante da direita. Foi o pequeno génio liberal bon chic-bon genre, com mundo, cultura, insolência e ironia, dos anos Indy anti-Cavaco, aliado estratégico da esquerda contra o oásis novo-rico, provinciano e tecnocrático do professor Aníbal. Foi depois, como se não fosse o mesmo, a eminência parda de Manuel Monteiro, o do discurso ultramontano do aumento das penas de prisão ("30 anos para traficantes de droga", gritavam os cartazes), dos "empregos para os portugueses" e anti-Europa, entre tantas outras pérolas a emular os slogans de um Le Pen que em França capitalizava na insegurança e no nacionalismo mais xenófobo. Foi a seguir o irmão desavindo, o pai espiritual que atraiçoa a um tempo filho e jornalismo, num célebre congresso em que recolheu de maduro o "seu partido" e se erigiu em líder salvífico.

      Da direita liberal, "moderna" e desempoeirada de que dera sinais nos seus tempos de "Antes pelo contrário" (o nome da coluna que assinava no Independente) não deixou rasto nos anos seguintes. Nem nos da aliança com Marcelo, da luta "contra o aborto" ( "Ganharam os bebés", cantarolava um Portas em pulos de exultação na noite do referendo de 1998), nem depois, quando no parlamento descobria uma súbita "eurocalmia" enquanto temperava a viabilização dos orçamentos guterristas com extremos de marialvismo (como aquele em que, forcado de mão na anca, ofereceu "as fuças da direita" ao então primeiro-ministro). Nem quando ministro da Defesa rumsfeldista esculpia o perfil de estadista hirto em memória de outro "pai de Portugal" no terraço de São Julião da Barra e lançava, com o sinal da cruz, navios de guerra contra o bote das "holandesas abortistas".

      Mas a direita liberal e desempoeirada sempre esteve lá, afinal. A hibernar, à espera do seu momento, da aclamação possível, do golpe oportuno. Like a virgin, agora em "moderno", em cinéfilo maneirista, um pouco mais loiro e talvez até laico-calmo, Portas regressa ao ringue. Os tempos são outros, ele também não.»

      «Portas foi igual a si próprio. Logo depois de se ter afastado, humildemente, humilhado pelos resultados nas legislativas de 2005, começou a tecer a sua teia. Primeiro em silêncio, na trincheira parlamentar em que tornou a bancada do CDS. Depois, em letra de forma na Atlântico, a seguir, ao vivo na televisão.

      Na AR, ele era o verdadeiro treinador da bancada. Não ia a jogo, não interpelava os outros deputados, não fazia perguntas a ministros, não fazia frente ao primeiro-ministro. Mas, por trás dessa imagem de discrição cuidadosamente cultivada, Portas foi sempre a mão invisível. Quando Ribeiro e Castro afirmou que não era ele "o chefe da banda", sabia bem de quem falava. Má sorte ser líder partidário com uma representação parlamentar escolhida por outrem.»

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