segunda-feira, dezembro 17, 2012

A incompetência torna tudo isto mais aflitivo


• João Galamba, Refundar às cegas:
    'Pedro Passos Coelho fez mais uma descoberta fascinante. Depois de descobrir que duplicar a austeridade prevista no memorando fez disparar o desemprego, colapsar a procura interna e criou uma desagradável ‘surpresa orçamental', Passos Coelho também descobriu que são os portugueses com maiores rendimentos os que tiram maiores benefícios dos vários mecanismos de redistribuição de rendimento. Esta descoberta, ao contrário do que pensa Passos Coelho, não põe a nu qualquer tipo de injustica. Demonstra, isso sim, que Passos Coelho desconhece o Estado Social que diz querer refundar.

    Na Saúde e na Educação o problema de Passos Coelho não se coloca, porque a justiça faz-se, no financiamento, via impostos progressivos e, no acesso, garantindo a igualdade de todos os cidadãos. A única componente do Estado Social em que podemos dizer que quem tem mais rendimentos recebe mais do que quem não tem é a parte contributiva da Segurança Social. Mas isto decorre da própria natureza contributiva do sistema e não constitui qualquer tipo de injustiça.

    No caso das pensões, por exemplo, estamos perante uma forma de justiça inter-geracional: garante-se que o pensionista tem direito a uma pensão redistribuindo rendimentos entre quem trabalha e desconta e quem já trabalhou e descontou. Se Passos considera que o sistema actual é injusto, pode instituir uma progressividade, semelhante ao IRS, nas contribuições sociais; ou reduzir a disparidade entre o valor das pensões pagas. Isto seria uma reforma que reforçaria a dimensão redistributiva do sistema de pensões. Mas o que Passos Coelho sugere é outra coisa: que o sistema contributivo é, em si mesmo, injusto. Ora isto, como é evidente, é absurdo.

    O que Passos considera justo já existe hoje nos regimes não-contributivos da Segurança Social. O subsídio social de desemprego, o complemento solidário para idosos, o rendimento social de inserção, por exemplo, são todas prestações eminentemente redistributivas. O que Passos não entende é que o Estado Social não se limita a prover aos mais necessitados. É muito mais do que isso. É uma forma, complexa e plural, de institucionalizar a solidariedade e a igualdade entre todos os cidadãos. Não é apenas para os pobres. É para todos nós.'

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