terça-feira, dezembro 17, 2013

Da banalização da mentira
— Os casos do plano B e da saída à irlandesa portuguesa

1. Ainda na semana passada, Passos Coelho repetiu que o Governo não se precaveu com um plano B para o caso de o Tribunal Constitucional chumbar o corte de 10% a aplicar às pensões acima de 600 euros pagas pela Caixa Geral de Aposentações. A troika desmentiu, através de um comunicado, o Governo: “Se algumas destas medidas forem consideradas inconstitucionais, o governo reafirmou o seu compromisso de que irá então identificar e aplicar medidas compensatórias de elevada qualidade para cumprir o objectivo do défice de 4% do PIB”.

2. Também na semana passada, Passos Coelho reafirmou que só em Janeiro do próximo ano o Governo irá estudar o que se segue ao programa de “ajustamento”, tendo colocado apenas duas hipóteses: ou uma saída à irlandesa ou um programa cautelar. Ontem, enquanto Paulo Portas e a Miss Swaps papagueavam a narrativa do alegado primeiro-ministro, o presidente do BCE, Mario Draghi, trocava-lhes as voltas: à saída do actual resgate, em Junho de 2014, Portugal só terá duas possibilidades — ou um novo resgate se não for capaz de se financiar no mercado ou um programa cautelar.

Mario Draghi dá três pauladas no Governo:
    • Deixa implicitamente cair que as negociações para a saída do programa de “assistência” estão em curso, ao contrário do que garantiu Passos Coelho;
    • Desmente o Governo de que uma saída à irlandesa é uma possibilidade;
    • Sublinha o falhanço do Governo no regresso aos mercados (anunciado por Vítor Gaspar para 23 de Setembro de 2012), que era o objectivo nuclear do programa de “ajustamento”.

3. Mas Draghi foi mais longe: ao sustentar que o fim do programa de “assistência” implicará um 2.º resgate ou um programa cautelar, arrancou das mãos do Governo a possibilidade de justificar o falhanço do regresso aos mercados com um eventual chumbo do corte das pensões. Antes de se conhecer o acórdão do Tribunal Constitucional, a sentença de Draghi é demolidora: Portugal terá necessidade de um novo programa.

4. Nem perante as derradeiras pressões sobre o Tribunal Constitucional por parte de entidades não nacionais — BCE, através de Draghi, e a troika —, o Presidente da República quebrou o seu ensurdecedor silêncio para as condenar e defender um órgão de soberania previsto na Constituição que jurou cumprir e fazer cumprir. Nada de novo na frente de Belém.

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