• António Correia de Campos, Humilhação, novela e drama:
- «Humilhação. Quando vi a nossa ministra das Finanças a ser exibida em improvisada conferência de funcionários e jornalistas, ao lado do colega alemão, senti a humilhação de me ver representado por gente disposta a tudo aceitar para agradecer favores do mais poderoso Estado-membro da nossa união. Atentos, veneradores e obrigados.
Se foi por manha, há uma recidiva da servil obediência de Gaspar, revelada à Europa por um microfone indiscreto. Não comento as analogias zoológicas feitas na imprensa escrita sobre afagos e carinhos ao animalzinho de estimação para garantir amor ao dono. Não entro por aí. Mas confesso-me humilhado com a proximidade ao comportamento, que sempre detestei, dos lambe-botas da vida, dos “bem-comportadinhos” da política, dos “meninos da sôtora”. Até admito que fosse patriótica a intenção, proteger o nosso pobre país, acoitando-o à sombra do poderoso e irascível teutónico. Mas a realidade venceu a intenção: Maria Luís deu ao mundo a imagem de um país manipulável, pau para toda a colher, utilizável para exemplo perante os mal-comportados. Com risco de descartável na primeira oportunidade, como acontece quase sempre aos muito servis. Bem dizia o povo sans cullottes, em plural de simpatia, “quanto mais a gente se agacha, mais se nos vê o rabo”. Perante este modelo de comportamento já não admira que até Marques Guedes, normalmente sóbrio e comedido, tenha deixado fugir o dispéptico lamento sobre o desabafo assassino de Juncker, que se veio a revelar um forte argumento negocial a favor dos gregos. Não admira a defesa áspera e quase só retórica, no fio da navalha, de Passos Coelho no debate quinzenal. Não admira o que transpirou das negociações finais do Eurogrupo sobre engulhos na garganta de representantes de Espanha e Portugal, a que Varoufakis respondeu com a elegância olímpica do respeito pelas posições e opiniões dos pares. Quanto se entra no caminho da humilhação, a cada uma se segue outra. Espero que se aprenda, mesmo que falte pouco para o final da genuflexão.
No dia 16 de Fevereiro no DN (cf. no CC aqui, aqui e aqui) |
Dr. Jekyll e Mr. Hyde. A novela de Robert Louis Stevenson sempre actual. Encarregado pelo chefe da coligação de tratar da reforma do Estado, Paulo Portas produziu um irrelevante guião de banalidades e redundâncias. Não era difícil prever que tal reforma nunca levantaria voo e o lastro da máquina se tornaria cada vez mais pesado à medida que se aproximava o final de mandato. Pois bem, com mandato e sem obra, Portas reúne-se com empresários e desanca a burocracia lusitana, os licenciamentos desnecessários, os entraves que afugentam investidores. Isto é, bate em si próprio, porventura esquecido do seu papel principal: Mr. Hyde rapou da bengala para bater em Dr. Jekyll. Na novela, o repelente Mr. Hyde aparece morto e vestido com as roupas do Dr. Jekyll. Poupe-nos ao final, Dr. Portas. (…)»
ResponderEliminarO nobre escriba que se acautele pois ironia e inteligência são perseguidos pela vil gente.
Grande artigo de hoje, no Publico, da autoria do Prof Correia de Campos. Sobre a Saúde e o estado a que chegou.
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