terça-feira, janeiro 17, 2012

"A civilização consiste na contenção do poder, incluindo, como elemento essencial, a auto-contenção"

João Pinto e Castro, Os dois capitalismos e a cafrealização dos costumes:
    'Para o público, o capitalismo obcecado com o lucro é por vezes inevitável; mas só aquele que contribui para a melhoria do bem-estar colectivo é desejável. O primeiro será um mal menor; o segundo, um bem maior. O primeiro é um problema dos seus acionistas; o segundo, um ativo para todos nós. Com o primeiro mantemos uma relação interesseira; com o segundo, uma relação interessada. Entendemos que o progresso do país depende de reduzirmos o poder de influência de empresas do primeiro tipo e de conseguirmos ter mais do segundo.

    A doutrina que concede toda a prioridade ao lucro não é uma teoria empiricamente sustentada, apenas uma prescrição que visa justificar a total subordinação da gestão empresarial aos interesses dos acionistas em detrimento de todas as restantes partes envolvidas, incluindo trabalhadores, clientes, parceiros, fornecedores, comunidade local e comunidade nacional.

    Os empresários e gestores que se acham no direito de usar sem entraves o poder de que desfrutam estão a contribuir para a cafrealização dos costumes. "Se tens poder, usa-o": é este o conselho que nos dão. Ora a civilização consiste na contenção do poder, incluindo, como elemento essencial, a auto-contenção. Inversamente, quem entende que o poder sobreleva quaisquer outras considerações coloca-se "ipso facto" do lado da força bruta.

    Cheira-me que não agradará muito àqueles que hoje tudo podem o que um dia poderão vir a poder aqueles que, de momento, nada podem.'

1 comentário :

jpm disse...

Apesar de não ver nada de mau no sentido geral do artigo, a expressão cafrealizar posta como oposto de civilização, convenhamos, não é das coisas com mais bom gosto que vi por aí.