domingo, abril 01, 2012

Escutas a Sócrates? "São completamente irrelevantes!"

Entrevista TSF/DN a Noronha do Nascimento, presidente do Supremo Tribunal de Justiça, sobre as escutas no pocesso "Face Oculta":
    O caso das escutas a José Sócrates, obtidas no âmbito da Investigação do processo “Face Oculta”, continua na agenda da justiça. Foram mandadas destruir por si, algumas, e agora o Tribunal Constitucional veio dizer, em resumo, que a sua decisão não terá sido definitiva e as escutas podem ser ouvidas se o Tribunal de Aveiro assim o entender. É esse também o entendimento que tem desse despacho?
    Não, a decisão do Tribunal Constitucional (TC) foi muito mal lida por quem disse isso. Dei quatro despachos, dois no último semestre de 2009 e os outros dois no primeiro semestre de 2010. Quatro despachos sobre a destruição das escutas, e nenhum deles, nenhum!, foi objeto de recurso sobre a inconstitucionalidade. O recurso que foi para o TC não tem nada a ver com esses meus despachos.

    A versão que esteve subjacente à minha pergunta foi a leitura que se fez na comunicação social. Qual é então a leitura, de facto, que se deve fazer desse acórdão?
    O que o TC decidiu não teve nada a ver com os quatro despachos de destruição de escutas. Isto é surrealista, porque é ler o que lá não está! Eu mandei destruir quatro vezes, ninguém recorreu. Ninguém recorreu, isto é, ninguém disse “isso é inconstitucional”. Porque esse poder que o presidente do Supremo tem, em casos muito específicos, é o poder que o juiz de instrução criminal de primeira instância tem nos mesmos casos, em relação a qualquer arguido. Imagine este caso: imagine que sou suspeito e estou a ser escutado. O senhor é meu conhecido, está comigo, quer fazer um telefonema para a sua mulher e diz “estou sem bateria, empreste-me o telemóvel” e faz a chamada para a sua mulher, a marcar o jantar à noite, com uns amigos. Esta escuta tem de ser destruída, e imediatamente, que é o que diz a lei! Não tem nada a ver com a investigação, nem com quem está a ser escutado, como suspeito.

    E havia escutas irrelevantes, desse tipo, neste processo?
    As escutas que são mandadas destruir são irrelevantes. E, como digo, nenhum dos quatro despachos foi objeto de recurso para o TC sobre a inconstitucionalidade. Aquilo que é objeto de recurso para o TC é um despacho que dou quase sete, oito, nove meses depois, que não tem nada a ver com a inconstitucionalidade. E é esse despacho que depois um dos arguidos diz que é inconstitucional não haver recurso do despacho dado pelo presidente. E o TC disse: “Não é nada inconstitucional.”

    Portanto, é sua convicção que essas escutas não vão ser analisadas no julgamento?
    Não podem! A ordem de destruição é definitiva.

    É absolutamente definitiva?
    Sim. O que o TC lá diz é outra coisa. Há lá uma passagem do TC que, tanto quanto me apercebi, porque também li o acórdão do TC, foi interpretada um pouco “à vontade do freguês”. Ou seja, o que o TC acaba por dizer é isto: da destruição das escutas, o que se pode é discutir, eventualmente, se a destruição das escutas vai ou não inquinar outra prova que se faça no julgamento. Isto pode discutir-se, mas isto é regra do direito!

    Portanto, é só essa parte?
    Só isto.

    Nunca estará em causa que as escutas lá passem...
    Nunca. Aliás, o TC utiliza uma expressão que diz tudo: isso pode ser usado na valoração de provas de julgamento. Quer que lhe dê outro exemplo, e que penso que é percetível? Imagine que se faz uma busca a casa de um suspeito, sem autorização de juiz. Normalmente, tirando casos muito especiais, as buscas têm de ser autorizadas pelo juiz. Imagine que há uma busca sem autorização e são apreendidos documentos que vêm para o processo. O juiz anula a busca, os documentos continuam no processo. Se chegar a julgamento, aqueles documentos estão perfeitamente inquinados, não podem ser usados, porque a nulidade da busca — e isto é que se pode discutir em julgamento —, que já ninguém mais discute, pode ter efeitos, isso sim, sobre aqueles documentos que foram apreendidos através de um ato que é nulo.

    As escutas foram destruídas, de facto?
    Isso agora escapa-me. O juiz de instrução criminal de Aveiro, daquilo que vi no processo, é um juiz tecnicamente muito bom. Mandou destruir três lotes que lhe chegaram. O último [lote] já não foi com ele. Não sei se foram destruídas, não faço ideia. As de Aveiro foram destruídas, tanto quanto sei Já ouvi dizer entretanto que depois disso haverá outras cópias perdidas, que é uma história mal contada, como é óbvio.

    Mal contada porque não será verdade ou mal contada porque será mesmo verdade? Porque admito que seja verdade...
    Mas não acredito que tenham sido encontradas meio perdidas. Porque é que há, constantemente, violações de segredo de justiça? Porque há coisas que ficam escondidas ou que ficam retidas.

    E porque a justiça não cuida bem dos segredos que tem também a seu cargo...?
    Provavelmente. Agora, porque é que nunca veio para a opinião pública o conteúdo das escutas, que, afinal, se descobriu agora que têm duplicados? Porque, provavelmente, não interessa. Aliás, é talvez a demonstração, digamos, da irrelevância delas, e esse foi um dos fundamentos para ter mandado destruir imediatamente as escutas.

    Sente-se completamente confortável e à vontade com as decisões que produziu?
    Nunca tive problema de consciência em relação a isso.

    O artigo da lei que dá competência ao presidente do Supremo nas escutas ao primeiro-ministro, Presidente da República e presidente da Assembleia, na sua opinião, está bem redigido? A lei diz “escutas em que intervenham”. Deveria precisar que o presidente do Supremo só intervém quando aquelas três figuras forem alvo de escuta e não apanhadas em escuta?
    Está bem redigida. Num despacho, refiro-me a isso. Uma interpretação mais restritiva, como se quis fazer, do artigo, pode levar a um caso de fraude à lei. Imagine que se quer pôr sob escuta o Presidente da República, o presidente da Assembleia ou o primeiro-ministro, mas sem que o presidente do Supremo intervenha. E muito simples: põe sob escuta toda a gente com quem ele contacta, os familiares, os amigos, os assessores...

    É a forma segura de chegar a ele...
    Exatamente, põe sob escuta todo o seu círculo de amigos. Isto é uma fraude à lei. A lei, a meu ver, está bem redigida.

    Podemos pensar nós, cidadãos, que algures no interior do edifício da Justiça alguém pode pensar num esquema desses?
    A fraude à lei é um conceito que existe porque ela existe. Os conceitos jurídicos existem, os institutos jurídicos existem porque as coisas existem.

    Desabafou uma vez que lhe daria muito prazer que todas as escutas que envolviam o ex-primeiro-ministro fossem conhecidas. Porque é que disse isso? E mantém?
    São completamente irrelevantes! Primeiro, são completamente irrelevantes! Segundo, acabava-se o romance. Aliás, penso que o próprio procurador-geral disse isto.

    Não era mais fácil então, para si…
    (interrompendo) Sim, mas repare: há coisas nas escutas que têm a ver com a vida pessoal de cada um. E isto iria dar, não tenho dúvida nenhuma, um caso similar (também citei isso no meu despacho) ao que aconteceu com Bettino Craxi. Ele estava sujeito a escutas. Houve escutas que deviam ter sido destruídas porque tinham a ver com conversas pura e simplesmente familiares, privadas, devida pessoal, que vieram a ser publicadas. E o Estado foi condenado por responsabilidade extracontratual. E, neste caso, não tenho dúvidas de que o desfecho iria ser o mesmo.

    Haveria um processo de José Sócrates e ele ganharia ao Estado?
    Seria um caso similar.

    Ouviu todas as escutas? Acha que ouviu? Tem a certeza de que ouviu todas?
    Não ouvi as escutas todas, ouvias escutas todas que tinha de ouvir. Ouvi algumas outras que considerei que deveria ouvir, porque poderiam ser importantes em relação à perceção daquilo que era o objeto da investigação. E li praticamente quase todos os resumos das escutas, que me serviram de guião para aquelas que depois fui ouvir.

    Chegou a falar, na sequência das escutas a José Sócrates, que foi movida contra si uma campanha por jornalistas e pseudocomentadores que tentavam sugerir um favor a José Sócrates. Foi assim que sentiu nessa altura, é assim que ainda sente hoje?
    Por alguns jornalistas, alguns! Aliás, fiz referência expressa quando fui uma vez à televisão. Li muitos comentários, uns num sentido, outros noutro sentido. Li comentários críticos que compreendi perfeitamente. Li dois que considerei que Leram ofensivos]... Curiosamente, penso que um deles era até de um professor universitário, mas não era de Direito. Toda a gente percebeu, pelo menos ficaram a saber a quem me referia.

    Sentiu-se atacado na sua honorabilidade?
    Não. O juiz tem de estar preparado, e isso aprendi quando era muito novo com um juiz que me marcou profundamente. Ainda eu não era juiz, ainda era do Ministério Público, e ele disse-me: “Nós, o que temos é de estar de bem com a nossa consciência, porque muitas vezes ninguém acredita naquilo que a gente fez.”

11 comentários :

Fernando Romano disse...

Não tomo essa iniciativa, porque só o conheço pela televisão e jornais e não tenho nenhuma confiança com ele.

Mas permitam-me fazer daqui um apelo a quem se relacione ou tenha confiança com o Dr. António José Seguro:

-Enviem-lhe esta entrevista com a sugestão de que a leia acompanhado de um exegeta sério, daqueles que não interpretam discursos e textos das áreas de Direito, social,económica e política segundo as suas conveniências.

Faço esta proposta sem o mínimo intuito provocatório.

Fica claro que José Sócrates tem sido alvo de um processo inquisitorial, que resultou já na confiscação do poder democrático de que foi legitimado; e fica-se a saber também, que, não contentes com isso, o pretendem levar à fogueira.

O que se passou e continua a passar é um golpe de Estado contra a democracia e contra o povo português.

Ao contrário dos que praticam a resignação cínica, José Sócrates está vivo, presente como nunca e há um ajuste de contas a travar.

Há quem queira lavar as mãos, mas vão ser intercetados pela História.

Porque foi um crime lesa-pátria. O primeiro Heterodoxo da política portuguesa não será esquecido. Se os canalhas querem preencher o espaço público em torno de Sócrates, pois é aí que o combate deve ser travado. Sem cobardia, sem meias tintas.

Sem traição!

Anónimo disse...

O Seguro é um oportunista inerte que ocupa o absoluto vazio deixado pela grandeza de Sócrates.

Anónimo disse...

Os "Lauteiros" são muitos e filhos da mesma mãe, pai e com padrinho.

Tambem acho, que o novo SG não tem minimamente a grandeza do Sócrates, diga-se, não é fácil

Os "lauteiros" ainda vivem o trabalho pelo anterior governo

Picamilho /elvas disse...

A direita,vai todos os dias ao cemiterio ver se Socrates já foi enterrado. Vem de lá fod..da,porque o homem tem sete vidas.O José a mim nada me deu em particular,mas deu muito a este pais.Faço minhas as palavras de Almeida Santos que disse numa entrevista em grandes titulos no DN em 20010:- JOSÉ sOCRATES,é o melhor PM que Portugal já teve.Mesmo depois da crise e da perda da maioria por força das calunias,mantenho tudo que disse, e estou convicto que ha-de ser resgatado um dia,mais cedo do que tarde,para a politica em Portugal.

Anónimo disse...

À atenção da 11.01


Essa é a minha opinião há muito

Anónimo disse...

A prova de que as escutas são irrelevantes é o facto de nunca terem saido cá para fora.
Houvesse algo que indiciasse a minima possibilidade de crime por parte de Socrates, há muito que estavam escarrapachadas nas capas do correio da manha ( sem til, propositadamente).
E esta é que é a verdade dos factos.

Anónimo disse...

Sócrates foi uma pedrada no charco.Foi um tempo em que tive orgulho em ser Português.O resto é conversa!!!!!!

Um independente/ inojado disse...

É verdade,se há cópias das escutas, e se elas não vieram cá para fora,é porque o seu conteúdo não interessa por irrelevante, para a estrategia de certa escória deste país.Não sou Socratico,mas sou um homem sério,por isso não alinho em assinatos politicos,por parte de quem devia ser isento a bem da justiça.

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Karocha disse...

Para mim é complicado, comentar o que o Sr. diz.
A partir do momento da morte da minha melhor amiga em 2001,Maribel Torres Paulo, isso mesmo a mulher do "Homem mais bonito da AV. Roma" Juiz Armando Torres Paulo dixit, ex presidente da alta autoridade para a comini8cação social, vê-los a todos qual monte de piranha a olhar para mim, no alto de S. João e de repente o Cardona Ferreira vir perguntar-me como é que eu pertencia a esta família,até o meu rapaz mais velho se passar e correr com ele aos gritos!!!
Tudo o que eu digo e afirmo, ele há sempre testemunhas.

Anónimo disse...

Também acho... o Sócrates foi uma pedrado no charco... só é pena é hoje estarmos na miséria... mas foi uma pedrada no charco.