O ministro da Saúde publicou hoje um artigo de opinião sobre a auditoria realizada pelo Tribunal de Contas às listas de espera nas cirurgias. Correia de Campos revela-se manifestamente agradado com os resultados da acção, embora sublinhe que o trabalho está desactualizado, por o âmbito da análise não ter ido além do final de 2006. O que mudou em 2007 não está contemplado.
Correia de Campos faz também alusão à circunstância de os media — suponho que estará a pensar no Sol e no Público — terem apresentado de uma forma distorcida as conclusões da auditoria. Já aqui eu havia mencionado a forma como o Sol chegara a mutilar as passagens transcritas para adulterar o sentido das conclusões.
Comprometi-me, de resto, embora o tempo não chegue para tudo, a olhar para o relatório da auditoria. Depois de ler o artigo de Correia de Campos, julgo que ainda mais se justifica voltar ao tema, discordando de certa forma da orientação do artigo do ministro da Saúde. Se puder, retomo amanhã o assunto, escolhendo desde já o título do post: É o Tribunal de Contas populista?
Entretanto, transcrevo o artigo de Correia de Campos, que vale a pena ler:
«Recomendações [do Tribunal de Contas são] bem focadas e coincidentes com as prioridades do ministério
Listas de espera: ler tudo
O relatório do Tribunal de Contas (TC) sobre a Auditoria ao Acesso aos Cuidados de Saúde do SNS – Sistema Integrado de gestão de Inscritos para Cirurgia SIGIC, divulgado na semana passada, é um documento útil e de leitura indispensável para o Governo, administração do SNS, hospitais, profissionais, cidadãos em geral e, certamente também, para a comunicação social especializada.
O TC fez um esforço de adaptar a metodologia caso/controlo à análise das unidades onde mais cedo ou mais tarde foi adoptado o SIGIC. Como o processo foi sempre dinâmico, as comparações nem sempre são escorreitas. E como o período de análise (ano de 2006) não pode ser integralmente isolado, a fotografia é trémula, além de que o dia 31 de Dezembro de 2006 é já muito diferente do dia de hoje. É que a dinâmica não tem ritmo linear. Por isso, uma das mais importantes e positivas conclusões – até 31/12/2006, após a aplicação do SIGIC, diminuíram a média e a mediana dos tempos de espera dos inscritos para cirurgia, face às da data da sua implementação, em quatro regiões, tendo apenas aumentado em Lisboa e Vale do Tejo (a maior e a menos operacionalizável) –, passou quase despercebida. Por outro lado, o facto de em 31/12/2006 a média e a mediana do tempo de espera serem, a nível nacional, respectivamente de 10 e sete meses acaba por se desactualizar com a aceleração do processo: em apenas dois meses, a mediana global de tempos de espera baixou de sete para menos de cinco meses.
Também é recompensador o reconhecimento de que “o peso do número de utentes com mais tempo de espera diminuiu no período analisado” ou que “o efeito de diminuição dos tempos médios de espera é mais pronunciado nos hospitais que funcionam com ou SIGIC à mais tempo”, bem como que “a produtividade cirúrgica melhorou por médico nos hospitais referência, face ao grupo de controlo”, ou ainda que “num primeiro momento de adopção do SIGIC insistiu um aumento de custos e, posteriormente, após este estar em funcionamento, um menor crescimento”.
Do lado crítico afirma o relatório que o SIGIC não conseguiu atingir, em pleno (sublinhado nosso), os objectivos de universalidade e de equidade no tratamento de utentes e de rentabilização da capacidade instalada, não tendo influenciado a produção, a produtividade (o que contradiz o reconhecimento do aumento da produtividade cirúrgica por médico), ou a eficiência financeira. Sobretudo, o relatório chama a atenção para a realidade pré-SIGIC: “o acesso aos cuidados é dificultado pela morosidade na marcação, quer de consulta no centro de saúde, quer da 1.ª consulta hospitalar”. Judiciosas palavras, de que ninguém discorda e devem ajudar-nos a encarar o ambiente geral do acesso aos cuidados, que não apenas às cirurgias.
O relatório também reconhece não ter havido melhor utilização da capacidade instalada, medida pela taxa de utilização do bloco operatório no grupo de referência. Uma vez que a produtividade cirúrgica aumentou, ficamos sem saber se tal se deveu a aumento da oferta de blocos operatórios, razão que tem plausibilidade, ou a razão espúria, como a redução do tempo médio por intervenção. O mais importante, para o signatário, são as recomendações que o TC directamente lhe endossa: melhorar o acesso já referido aos centros de saúde e à 1.ª consulta do hospital; garantir equidade e universalidade; rentabilizar a capacidade instalada; definir conceitos como o tempo máximo de espera; aprovar manuais de gestão e aperfeiçoara normativos legais.
Recomendações bem focadas e coincidentes com as prioridades do ministério: anular os tempos de espera dos centros de saúde está a ser obtido com as USF; a “consulta na hora” centra-se no encurtamento do prazo entre a necessidade expressa e a marcação de consulta hospitalar; a contratualização da ARS com os hospitais, públicos e privados, é feita em nome da equidade, universalidade e rentabilização da capacidade instalada. Estamos, pois, no bom caminho.
Embora a leitura de alguma comunicação social e, dentro dela, o tratamento dos títulos, veja apenas o copo meio cheio, quando não totalmente vazio, como o relatório é público, todos podem julgar por si. É um bom relatório e confirma a linha do ministério de, ao ter chegado, em Março de 2005, não destruir o SIGIC, antes aplicá-lo bem e aperfeiçoá-lo.»
2 comentários :
Só não vê os progressos nos hospitais quem não quer ver. Mas não percebo porque os blocos operatórios não são utilizados 24 horas por dia. Os médicos não querem?
Grande ministro de um fantastico governo. O resto é poeira.
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