terça-feira, janeiro 28, 2014

O défice resiste à aritmética variável
(porque a austeridade se derrota a si própria)


O Governo brinca com as metodologias para apurar o défice orçamental. Mas faz mais: para além de se agarrar à metodologia que permite a contabilização de receitas extraordinárias (com que se comprometeu a não recorrer), o Governo permite-se ainda considerar algumas receitas, mas abstém-se de contemplar algumas despesas (v.g., varre para debaixo do tapete a injecção de capital no BANIF, mas inclui o valor pago em 2013 pela ANA).

Em todo o caso, o que conta para efeitos do Eurostat (e dos sacrossantos mercados) é o défice em contabilidade nacional. Depois de a ministra das Finanças ter primeiramente admitido, na Assembleia da República, que reduzira o défice real de 2013 em 500 milhões de euros, Miguel Frasquilho corrigiu o tiro da Miss Swaps, prevendo que a diminuição do défice em relação a 2012 poderá ter atingido cerca de mil milhões de euros, um valor que rondará cerca de 0,6% do PIB.

Temos, assim, que a evolução do défice orçamental, em termos de contabilidade nacional, é a seguinte (expurgadas as medidas extraordinárias):
    • 2011 – 7,1%;
    • 2012 – 5,8%;
    • 2013 – 5,2%.

Esta evolução do défice suscita duas questões:
    1.ª Apesar de as brutais medidas de austeridade terem retirado cerca de 24 mil milhões de euros à economia nos últimos três anos em aumentos de impostos e cortes nos salários e pensões, o défice orçamental não diminuiu mais do que seis mil milhões de euros, a dívida pública agravou-se, o PIB caiu mais de sete mil milhões de euros e foram destruídos mais de 450 mil empregos. As sucessivas doses de austeridade revelam não apenas que a austeridade não funciona como se derrota a si própria no propósito de atingir a consolidação orçamental.

    2.ª O ex-ministro das Finanças Vítor Gaspar considerou que o “incumprimento dos limites originais do programa para o défice e a dívida, em 2012 e 2013”, “minou” a sua “credibilidade enquanto ministro das Finanças”. Por isso, apresentou a demissão. A questão que se coloca é a de saber por que razão a situação que conduziu à demissão de Vítor Gaspar é agora servida em bandeja como um sucesso. O que mudou para que um ajustamento pífio seja comemorado com banda e foguetes?

4 comentários :

Rosa disse...



O debate de João Galamba com a ministra foi fenomenal...ele desmontou tudo, ela não conseguiu responder nem atalhar as razões bem fundamentadas do João em relação ao défice"fictício"...

Unknown disse...

O problema é que, apesar do galamba e outros parlamentar do ps desmontarem o governo, o partido não consegue transmitir cá para fora essas ideias. O que fica para a população, em relação ao défice, foi uma vitória do governo, pois atingiu o défice pretendido.

james disse...



Subscrevo integralmente Count Zaconne.

Se António José Seguro não consegue fazer melhor que Hollande - e já se viu a indigência entre o proclamado em campanha eleitoral e a política concreta feita em França por este pateta - é melhor que Seguro desampare a tenda quanto antes.

Evaristo Ferreira disse...

Este texto do Miguel está muito bem apresentado. A foto de cabeceira também valoriza muito este seu trabalho. Repare-se nos dois monos: Mis Swaps ou está a vituperar alguém ou então acordou agora e está a bocejar de boca aberta; a seu lado, está o Vitor Gaspar Schäuble, dormindo ou então pensando sobre o "enorme aumento de impostos". Isto é sim,
é teatro burlesco.