segunda-feira, novembro 07, 2011

Aristocracia fiscal

• J. Albano Santos, Aristocracia fiscal:
    'Esta moderna "aristocracia fiscal" é um grupo vasto e heterogéneo: pode envolver gente tão diversa como o biscateiro ou o empresário, o merceeiro ou o profissional liberal, o feirante ou o senhorio Pessoas estimáveis, unidas por um traço comum – o de poderem subtrair o seu rendimento (ou boa parte dele) ao imposto devido. Não o fazem, aliás, por sofrerem de qualquer perversidade pessoal mas, simplesmente, porque os proventos que recebem têm características especiais do ponto de vista fiscal.

    De facto, as matérias tributáveis não são todas iguais quanto à possibilidade de controlo pelo Fisco: umas são de difícil ocultação (v.g., rendimentos do trabalho por conta de outrem, património imobiliário); outras são mais fáceis de dissimular (v.g., rendimentos do trabalho por conta própria, património mobiliário). É nesta diferença que assenta a discriminação dos cidadãos em dois grupos: os que são forçados a contribuir para os cofres públicos e a dita "aristocracia fiscal" a quem é dado escapar alegremente.

    Em condições normais, esta discriminação já é grave, dados os efeitos perniciosos que tem a vários níveis: no plano político, corrompe a cidadania e a coesão social; no plano económico, subverte a concorrência; no plano financeiro, lesa o erário público em somas avultadas (admitindo uma economia subterrânea na casa dos 20% do PIB e a sua tributação em termos médios, pode estimar-se que deixa de ser cobrado um valor da ordem dos 7% do PIB – algo que se aproxima do actual défice das contas públicas).

    Na presente situação, porém, o fenómeno toma-se especialmente perverso: cada novo aumento de impostos que se decide vai sempre recair sobre os mesmos – os já sacrificados detentores de matérias tributáveis que o Fisco controla. Deste modo, agrava-se progressivamente a intolerável iniquidade entre uma classe média cada vez mais oprimida pelo esforço que lhe é exigido e uma "aristocracia fiscal" que permanece incólume, olhando para a crise com comentários piedosos.

    Esta injustiça pode, aliás, vir a ter embaraçosas repercussões com a previsível ligação das condições de acesso a alguns serviços públicos (v.g., saúde, educação) ao rendimento das pessoas. Com este a ser aferido pelas declarações de IRS, não é impensável que, então, possamos ver, lado a lado num hospital público, um abastado homem de negócios e um professor de liceu – o primeiro isento de qualquer pagamento e o segundo obrigado a pagar uma parte significativa dos custos que origina.'

4 comentários :

Francisco Clamote disse...

Digamos que a injustiça denunciada já não é novidade. Vamos tê-la é ainda mais agravada: os "tansos" serão cada vez mais tansos

Anónimo disse...

Faço parte do grupo profissional liberal que ainda tem vergonha na cara e sempre pagou os impostos que lhe são devidos. Custa-me vêr colegas a queixarem-se que os impostos são muito altos e que se os pagam depois não ficam com nada para viver, por isso, não os pagam. Acontece que não os pagando estão a viver acima das suas possibilidades, pois estão a gastar dinheiro que não é fruto do seu trabalho mas sim da parte que todos nós devemos á comunidade.Acresce o facto de usarem serviços para os quais não contribuem um centimo e que aqueles que contribuem tem de pagar a dobrar, porque os que não pagam também os gastam.
Pagar impostos é uma questão de educação, que infelizmente a maioria deste povo não têm. A prova é o governo que escolheram lá meter depois do único que, com erros como qualquer ser humano, mais fez para alterar o status quou reinante neste pais.

sepol disse...

Só não se combate a fraude e evasão fiscal porque não querem ou não estão interessados, bastava mudar o "onus da prova" e estava tudo dito!!!

Júlio de Matos disse...

No dia em que os Funcionários Públicos deixarem de ser tansos, os Polícias, os Professores, os Médicos, os Funcionários Autárquicos, etc. passarão a tratar de forma diferente quem de facto contribui para salvar o País e sustentar os seus Salários e quem se eximiu alarvemente a esse esforço nacional. Nesse dia, o abastado homem de negócios nem da sua garage há-de poder saír com o seu carro para uma ruela pública. Muito menos aparecer à porta de um Hospital, de uma Esquadra, ou de uma Escola. Seja sepultado em casa, puta que o pariu!