quarta-feira, setembro 12, 2012

Um pingo doce sobre Salazar

• José Neves, Políticas da História [hoje no Público]:
    ‘4. O maior problema que encontro na actual polémica reside, porém, no facto de deixar na sombra um conjunto de questões que não implicam directamente o debate sobre a natureza política do Estado Novo (em que tendo a concordar com a posição de Loff) ou o modo como Ramos dá conta da repressão salazarista (já criticado por Rosas, Costa Pinto ou Lucena) e da Guerra Colonial (desconstruído por Ramada Curto). A primeira destas questões tem que ver com a ideia de política subjacente ao olhar de Ramos. Procurando contrariar o que entende ter sido uma tendência historiográfica para a sobrevalorização do económico, do social e das estruturas, e para a desvalorização do político e da acção, o esforço de Ramos tem acusado dois vícios: tende a circunscrever o poder à esfera da política e, como sublinhou Francisco Bethencourt, a confinar o domínio da acção política às atitudes e aos comportamentos do que chama elites. A esta luz, teria sido porventura mais ajustado, no que à parte contemporânea diz respeito, que se tivesse optado por um título como "História Política de Portugal" ou "História Elitista de Portugal".

    5. A segunda questão que não tem sido debatida é a da escrita da história. Existem factos para quase todos os gostos, o que, não querendo dizer que não há risco de um historiador simplesmente inventar acontecimentos que não sucederam, exige que também foquemos não apenas o modo de selecção mas também a forma de enunciação dos factos. A título de exemplo, chamo a atenção para a relação que na escrita de Ramos se tece entre a sua voz de narrador e a fala das fontes por ele citadas. Na negociação destes discursos, essa escrita tende, frequentemente, a criar uma indefinição entre a fala do narrador e a fala dos documentos que cita, deste corpo-a-corpo nutrindo-se, em parte, a ilusão de neutralidade que ampara o entusiasmo pueril de um Barreto. (…) A única coisa inadmissível em toda esta polémica é o apelo de Filomena Mónica ao silenciamento de Manuel Loff.’

1 comentário :

Teófilo M. disse...

À História, o distanciamento temporal faz-lhe sempre bem.