Viegas, o corajoso

Francisco José Viegas distinguiu-se, enquanto secretário de Estado da Cultura, pelas omissões. Não fez nada e nunca se queixou de falta de condições para o exercício do cargo. No fim, teve uma saída digna do seu mandato: alegou cansaço e razões de saúde para abandonar o Governo pela direita baixa.

Mas o seu único acto como secretário de Estado ainda estava para vir. Num assomo de coragem (?), Viegas prometeu que mandaria “tomar no cu” o inspector das finanças que lhe viesse exigir facturas das suas compras. Animou-se o pequeno círculo de admiradores de Viegas e houve logo quem dissesse que esta atitude revelava a erudição e o espírito poético do ex-secretário de Estado da Cultura, que proferiu a afirmação inspirando-se em Millôr Fernandes. Por este andar, Viegas qualquer dia manda alguém à merda, citando Fernando Pessoa, que, segundo consta, terá proferido esta expressão no Martinho da Arcada por mais de uma vez…

Sucede que a melhor parte da história veio a seguir. Assustado com as possíveis retaliações dos seus companheiros do Governo, Viegas acaba de dar uma entrevista (parte da qual está aqui) em que elogia o alegado primeiro-ministro, certamente na mira de alguma sinecura. Entretanto, aproveita para esclarecer que a sua crítica fiscal não se dirigia ao Governo, mas aos funcionários do fisco. Está tudo dito, portanto, sobre a coragem de Viegas.

As coimas para os consumidores que não pedirem facturas estão previstas no Orçamento do Estado para 2012 proposto pelo Governo (de que Viegas fazia parte) à Assembleia da República (artigo 123.º do Regime Geral das Infracções Tributárias). Acresce que foi o próprio secretário de Estado dos Assuntos Fiscais — Paulo Núncio do partido do contribuinte — que assumiu ter ordenado a aplicação de coimas. Segundo nos diz agora o erudito Viegas, a culpa é dos mangas de alpaca da Administração Fiscal…