segunda-feira, junho 24, 2013

“A requalificação dos funcionários faz lembrar os duches de Auschwitz, antes do gás letal”

• António Correia de Campos, Os meirinhos [hoje no Público]:
    ‘1. O CDS gosta mesmo muito de estar no Governo. Para já neste, depois se verá se também com o PS. O dr. Paulo Portas reconhece que vivemos uma situação económica e social difícil, afirmando que o CDS não contribuirá para o excesso de crispação política, ou seja, recusa uma crise política antecipada. Mas tirando o facto de fazer número, o CDS nada propõe para se tirar o país da situação em que, sempre à janela e sem sujar as mãos, ajudou a criar e pacatamente observa. O CDS deseja que se evite um segundo resgate, um segundo programa, um segundo calendário, mas não adianta como pode ser posto o país a crescer para evitar o caminho deslizante e fatal para a alternativa entre o hair-cut profundo e a saída do euro. O CDS defende a mobilidade social, julgávamos que ascendente, mas afinal é a descendente, com a passagem dos donos de pequenos restaurantes, de contribuintes da Segurança Social a beneficiários do desemprego, de inquilinos de um trespasse que lhes custou caro, a cedentes de um espaço que fica agora desocupado. De cobradores de IVA a 13% a cessantes contribuintes do IVA a 23%. De partido dos contribuintes, o CDS passou a partido dos meirinhos. E mesmo quando gostaria de ver a mobilidade social ascendente, resigna-se a que a mudança de escalões do IRS transforme os rentistas em espoliados, os idosos que trabalharam e descontaram o tempo todo sem manipulações, em desolados pensionistas que dividem o que lhes resta com filhos desempregados, substituindo o autocarro do colégio pela espera sorumbática dos netos na escola oficial.

    2. Ao mesmo tempo que procura manter o Governo a flutuar, com ele lá dentro, já se inscreveu no governo futuro. É assim que recomenda se preservem espaços de diálogo e acordo político com o principal partido da oposição para "partilhar reformas estruturantes para o futuro". O que levanta a dúvida sobre se hoje reconhece reformas na coligação a que está colado e se as identifica como estruturantes. Dificilmente se pode ser mais explícito. Sempre a bem do país.

    Como o optimismo é contagiante, o doutor Poiares Maduro afirma que Portugal tem uma coligação muito coesa, muito mais que as do Reino Unido ou da Holanda. Com a bondade natural dos neófitos, admite que o executivo é um colectivo com várias perspectivas dos seus membros, ou seja, uma espécie de caleidoscópio que ao rodar reconstrói imagens, cada qual mais atraente que a anterior. O Governo não governa mal, tem é um problema de comunicação. É assim que os erros de política se escamoteiam. Não é o fundo, é apenas a forma. Todos se deixaram atrair pela dialéctica de Marcelo. O Governo garante que não pretende despedir funcionários, sem prometer que o não fará. Guardadas todas as proporções, a eufemística requalificação dos funcionários faz lembrar os duches de Auschwitz, antes do gás letal.’

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