domingo, setembro 10, 2006

As corporações não têm capacidade crítica [2]




Basta ler o post anterior para perceber a forma como se processa o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça: um “sistema viciado” que permite o recurso a todo o “tipo de batotas”.

O acordo para a reforma da justiça prevê a alteração deste estado de coisas. Parece uma proposta razoável:

    “O acesso ao Supremo Tribunal de Justiça faz-se mediante concurso curricular aberto a magistrados judiciais e do Ministério Público e a outros juristas de mérito.
    O concurso incluirá uma apreciação pública dos currículos dos candidatos perante um júri composto pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, um Juiz Conselheiro e um Professor Catedrático de Direito.”

Acabam-se as graduações por antiguidade, limita-se a possibilidade de ocorrerem jogos de bastidores. A Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) não se conforma com esta medida. E porquê? Eis as suas razões:

    “No acesso aos tribunais superiores, concordando embora a Associação de pleno com o princípio da progressão na carreira por critérios de mérito, não compreende a desvalorização do papel do Conselho Superior da Magistratura, que é o órgão com competência constitucional para proceder ao recrutamento e nomeação dos juízes para esses tribunais, substituindo-o por um júri sem a mesma composição plural e democrática daquele Conselho.”

“Plurais” e “democráticas” vêm sendo, sem dúvida, as escolhas do vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura, como recorda o Juiz Desembargador António Santos Carvalho nas páginas do Público:

    “(…) o domínio que o sindicalismo judiciário tem conseguido nas eleições para o Conselho Superior da Magistratura concedeu ao vice-presidente de um órgão de simples disciplina dos juízes e também juiz do Supremo, indigitado nas listas da Associação dos Magistrados, uma importante capacidade de manobra para influenciar a eleição do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, cargo que, em regra, não tem deixado de alcançar. Com efeito, os outros juízes deste tribunal têm vindo a ser escolhidos ao contrário da lei, da publicidade e racionalidade dos concursos públicos, em Conclave do Conselho, onde o vice-presidente é, pela natureza das coisas, presença primaz. São, apesar deles próprios e do mérito de cada um, cardeais-eleitores de uma instituição laica e (qual espanto!) republicana, como continua a não deixar de se afirmar o Supremo Tribunal de Justiça. No seguimento, o seu presidente corre o risco de ficar refém e de adquirir os tiques, os desígnios e o poder de facto de um chefe corporativo (…).”

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