domingo, setembro 10, 2006

Ainda acerca do pacto (I)




Em termos globais, concordo com a análise, sob uma perspectiva de custo-benefício, de Paulo Gorjão. Mas gostaria de chamar a atenção para alguns aspectos:

1. Na maioria das matérias, o pacto é sobretudo simbólico (salvo talvez as questões do segredo de justiça e das escutas). O pacto é no entanto mais afirmativo no que respeita ao desmantelamento de (alguns) privilégios das corporações. Propõe-se, nomeadamente, acabar com o intolerável estatuto de excepção de que gozam os magistrados jubilados (sem igual na sociedade portuguesa para outros grupos profissionais) e quebrar o monopólio de acesso aos tribunais superiores.

Ora as corporações da magistratura estavam a utilizar os partidos da oposição como caixa de ressonância de defesa dos seus privilégios. Recordam-se da semana dedicada à justiça por Marques Mendes, na qual tantas foram as reivindicações dos operadores judiciários que o líder do PSD nem se atreveu a apresentar as propostas que prometera divulgar no fim da maratona?

O acordo — tão reclamado pelos operadores judiciários —, ao mesmo tempo que neutraliza o PSD, isola as corporações.

Veja-se, a este propósito, as hesitações e flutuações da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (que, de súbito, voltou a utilizar o termo “Sindical” que havia abandonado quando a actual direcção foi eleita). Quando foi conhecido publicamente o acordo, «[o] presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) considerou (...) "importante" que a Justiça seja tratada "como uma questão de Estado" e que nessa matéria "haja responsabilidades dos dois principais partidos (PS e PSD)".»

No dia seguinte, a ASJP divulga um comunicado em que se distancia desta sua posição e procura o apoio das franjas do espectro político.

3 comentários :

Anónimo disse...

Portanto se for so de um partido que tenha a maioria do voto popular, já não vale.

A Justiça e os seus sindicatos tratam da justiça do cidadão um acto meramente politico.

Nunca tive duvidas disso

Anónimo disse...

DEMOCRACIA, QUE DEMOCRACIA ?
"(...) Comecei por uma visita aqui que me deixou com a sensação de que tão cedo não voltaria…Não sonhava ainda o que estava para chegar. Um pacto. Chamam-lhe «político-partidário».Um pacto cuja celebração a todos colheu de surpresa, mas um pacto assinado diante das câmaras de televisão e celebrado com almoço, e tudo, para que o optimismo fosse visível e a alegria contagiante.
(...) Mas nada. Os elogios continuavam a sustentar-se da enorme vantagem que um tal acordo traria para o país. A estabilidade que aí vinha e “assim”. A nova credibilidade que traria para a justiça, “porque sim”.Sobre o conteúdo do pacto, propriamente dito, nada.
Por aqui, continuava um «luto» pesado que não adivinha nada de bom. Mas mesmo assim indicou-me o caminho até ao “Meu Monte” onde, finalmente, encontrei a jóia de que todos falam. Abri a arca, tomei conhecimento do segredo e …NÃO PERCEBO. … tão consensual satisfação.
Como pode tranquilizar quem quer que seja, como pode esclarecer o cidadão?
Como escapou à observação crítica dos jornalistas?
Não me refiro às poucas medidas que alcançaram a honra de concretização no anexo. Algumas delas até me parecem correctas e mesmo justas. De resto, em matéria que pressupõe opção vincadamente política até tenho por hábito guardar para mim as minhas impressões.
Refiro-me ao acordo, propriamente dito.Basta ler a primeira cláusula para se ficar perplexo: podem duas assinaturas vincular a votação de centenas de deputados?
Sem discussão!Já não vivemos numa democracia parlamentar?
Agora, primeiro assina-se e depois é que se discute?
(...) Nem falo do teor do pacto (qualquer um seria bom se, no respeito pela lei fundamental, fosse celebrado na casa dos deputados. Com alma de deputado!). Falo dessa “coisa” que dá pelo nome de DEMOCRACIA. Onde anda?»
Dra. Maria de Fátima Mata-Mouros, in Dizpositivo

Anónimo disse...

OPORTUNIDADE PERDIDA
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O pacto constituiu mais uma vitória da partidocracia sobre a democracia: a corporação dos políticos, em vez de produzir actividade legislativa parlamentar com toda a transparência, segundo as regras que o próprio Parlamento aprovou, optou pela opacidade de um acordo elaborado em segredo, por meia dúzia de pessoas.
A celebração do acordo não seria grave, per se, se as partes outorgantes não tivessem já anunciado que a (necessária) discussão dos termos do acordo em sede parlamentar apenas visa a recolha de apoios e não a sua eventual correcção para encontrar soluções porventura mais eficientes.
Trata-se de uma manifestação de arrogância partidária no seu melhor, que menospreza, porque vincula, o próprio órgão de soberania com função legislativa. O Parlamento aparece reduzido a mera correia de transmissão e caixa de ressonância de algumas cúpulas partidárias. Acentua-se, ainda mais, a vertente partidocrática do regime.
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Nos próximos dias - no caso de surgir tempo disponível para o efeito - alguns aspectos do «Pacto» serão analisados no Blog de Informação, adiantando-se, desde já, algumas observações:
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a) a revisão do Código Penal corre o risco de - contrariamente ao desejado - aumentar a criminalidade;
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b) a revisão do Código de Processo Penal revela claras insuficiências, não tendo sido devidamente aproveitadas as propostas do projecto «Tribunal XXI» que teriam como consequência um aumento significativo da eficiência da administração da justiça, acompanhado de um aumento também significativo das garantias judiciárias;
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c) a mediação penal a nível nacional é inexequível a curto e médio prazo;
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d) quanto à acção executiva, o aspecto positivo a salientar, com implicações a curto prazo, é... o «regresso ao passado» para os exequentes que sejam pessoas singulares, passando estas a poder recorrer aos oficiais de justiça para assegurar as funções de agente de execução;
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e) no tocante à reforma dos recursos cíveis, a solução encontrada continua a não combater a litigância temerária;
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f) quanto à revisão do mapa judiciário, apenas se destacam, como novidades, uma maior flexibilidade na gestão dos meios humanos e materiais, com menores custos financeiros, a extinção do Tribunal da Relação de Guimarães e a criação do Tribunal da Relação de Faro (será, mais uma vez, só no papel?...), nada sendo esclarecido quanto a aspectos essenciais e concretos da nova organização judiciária, que permitam aferir a sua adequação à realidade e, consequentemente, a sua eficácia;
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g) relativamente ao regime de acesso à Magistratura, saúda-se a abolição do período de dois anos que actualmente se interpõe entre a conclusão da licenciatura e a entrada no CEJ e a filosofia de maior formação específica para a judicatura;
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h) no tocante ao Estatuto dos Magistrados Judiciais, apenas se constata o seguinte:
1) não foi introduzido o modelo de carreira plana que ainda há poucos dias foi anunciado pelo Ministro da Justiça;
2) optou-se, sem qualquer fundamento, por excluir o C.S.M. do recrutamento dos magistrados judiciais do STJ e das Relações;
3) não se percebe, ainda, a inclusão de um Professor Catedrático no júri que apreciará publicamente os candidatos às Relações, uma vez que não está prevista a entrada de "juristas de mérito", além dos juízes, nos Tribunais de segunda instância;
4) não foram clarificados os critérios de aferição dos currículos dos candidatos aos tribunais superiores;
5) dominam preocupações de ordem financeira nas alterações propostas para os estatutos da aposentação e jubilação (que nada têm a ver com «a reforma da justiça»;
6) diminuem os direitos dos Magistrados, sendo mantidas as suas obrigações que, nalguns casos, apenas faziam sentido há mais de cem anos e outras... há cerca de meio século.
Continua a desprezar-se a formação contínua ou permanente dos Magistrados, não sendo a mesma contemplada no acordo político-partidário.
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i) saúda-se a consagração do regime de autonomia administrativa e financeira para o Conselho Superior da Magistratura.Lamenta-se que (todos) os Tribunais não beneficiem também de idênticas autonomias, tão necessárias à eficiência da sua gestão.
Finalmente, constata-se que o acordo é praticamente omisso em relação à organização do Ministério Público e à advocacia, áreas que também estão carecidas de intervenção legislativa.
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Em conclusão: trata-se de um Pacto criticável quanto à forma assumida na sua divulgação - por menosprezar, ostensivamente, a função legislativa do Parlamento - e insuficiente, em termos substanciais, por ignorar algumas soluções modernas, há muito preconizadas pelos profissionais do foro, que apresentam a tão desejada e necessária potencialidade reformista e que permitiriam um aumento significativo da eficiência da administração da justiça portuguesa, com um reforço das garantias judiciárias do cidadão.
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Dr. Jorge Langweg, in Blog de Informação