- ‘Estive a reler com mais atenção o balanço da governação recentemente apresentado pelo Compromisso Portugal e partilho convosco algumas das ideias que retive:
O estudo é apresentado como sendo do Compromisso Portugal, uma iniciativa da sociedade civil com mais de 1.000 promotores. Mas, se virmos com atenção, na p. 3 esclarece-se que, afinal de contas, esse mesmo estudo é da responsabilidade exclusiva e só vincula três – sim, 3 – pessoas: António Carrapatoso, Joaquim Goes e Rui Ramos. Tudo não passa, portanto, do pensamento destas três almas iluminadas. Delas e das empresas de consultadoria que certamente contrataram para lhes fazerem os gráficos catitas, recolherem a informação, etc.. Em suma, temos a governação a ser avaliada por BCGs, Mckynseys e quejandos (sem que isso alguma vez seja admitido, claro). Começa bem, esta avaliação da governação pela sociedade civil.
O sistemático «sim, mas»
O Compromisso Portugal – rectius, os três mosqueteiros do Compromisso Portugal – lá decidiram que tinham de dizer mal da governação, mantendo um estratégico e útil distanciamento crítico face ao actual Governo. Sucede que, passo a passo, se foram confrontando com os vários sucessos e bons resultados da governação socialista. O que fazem, então, os três estarolas? Muito fácil: engolem a seco e lá concedem o bom resultado, acrescentando imediatamente um “mas” à frente: foi bom, mas insuficiente; foi positivo, embora os resultados tenham ficado aquém das expectativas; estava no bom caminho, porém faltou um enquadramento estratégico. Todo o suposto “estudo” é feito disto. Para serem minimamente sérios, não podem escamotear totalmente os bons resultados; mas como, à partida, o objectivo estava definido e consistia em criticar a governação, logo inventam uma desculpa qualquer (às vezes, muito esfarrapada) para desmerecer as conquistas deste Governo. Querem ver?
Pp. 19/ 20 (sobre o Plano Tecnológico): «é justo dizer que o Governo conseguiu, assim, a melhoria da posição do País em índices relevantes, como por exemplo no ranking Global e-Government 2007 da Brown University (48º em 2006 para 7º em 2007) ou no relatório da Comissão Europeia (Lisbon Strategy Annual Review) sobre disponibilidade e sofisticação (respectivamente, 3ª e 4ª posições na Europa Comunitária). No entanto, apesar dos sucessos alcançados em algumas medidas, o Plano tecnológico, tal como o Compromisso tem vindo a apontar, enferma de três grandes vulnerabilidades: na sua génese, não foi inspirado por uma visão estratégica que lhe dê coerência (…)); assume-se principalmente como um “technology push” induzido pelo Estado (…); não é explícito quanto à preocupação em utilizar este “momento de excepção” como uma oportunidade para a renovação / reestruturação da Administração Pública (…)»
P. 21: «A redução do défice das Administrações Públicas é geralmente apontada como um aspecto meritório da actuação do Governo na actual legislatura. (…) Porém, importa avaliar com rigor se este recuo do défice esteve associado a uma verdadeira consolidação orçamental»
P. 24 (sobre reestruturação da Administração pública): «os progressos conseguidos nesta legislatura foram insuficientes face às expectativas criadas e às exigências de crescimento e de competitividade da economia» (ie, houve progressos, mas insuficientes)
P. 25 (sobre reestruturação da Administração pública): «Todas estas medidas vão no bom sentido, criando condições para uma gestão mais racional e flexível da AP. No entanto e em termos práticos, é visível um conjunto de insuficiências de implementação»
P. 28: «A contenção da despesa de Segurança Social [foi] um dos aspectos mais positivos da governação durante este legislatura (…). No entanto, apesar da introdução de medidas de ajustamento de carreira contributiva e de longevidade, tratou-se de uma reforma essencialmente paramétrica»
P. 28: «Outra medida que tem de ser considerada positiva no quadro da coesão social, tem a ver com a criação pelo Governo do “complemento solidário para idosos” (..). No entanto, o número de idosos que actualmente beneficiam deste subsídio (141.000 no final de 2008) estava longe do objectivo estabelecido pelo Governo (300.000)»
P. 29: «Na área dos apoios à família e à natalidade, o Governo adoptou medidas interessantes, embora de impacto ainda limitado»
P. 29: «Introdução de um conjunto de medidas positivas na área da Educação, mas globalmente sem o alcance e a profundidade necessários para fazer da qualificação um dos vectores estratégicos do desenvolvimento futuro»
P. 30: «A taxa de abandono escolar (…) reduziu-se de 38,6% em 2005 para 36% em 2007. Ficou assim muito aquém dos objectivos estabelecidos pela Estratégia de Lisboa, ou seja, atingir 20% em 2010» (comparar dados de 2007 com objectivos de 2010, só para desmerecer a evolução positiva já alcançada, não vale, tá?)
P. 31 (sobre educação): «Algumas iniciativas do governo (Ministério da Educação e Ministério da Ciência) durante a legislatura apontam na direcção correcta, mas foram claramente insuficiente para a transformação necessária neste domínio»
P. 31: «Deve salientar-se como aspecto positivo da acção governativa o desenvolvimento de esforços determinados no sentido de melhorar o modelo de gestão das escolas públicas (…). No entanto, sendo este o caminho correcto, os instrumentos de autonomia de gestão que oferece às escolas são insuficientes»
Pp. 31/32: «o governo teve o mérito de iniciar reformas muito importantes, como por exemp0lo as alterações ao nível do estatuto da carreira docente ou a introdução do novo sistema de avaliação de desempenho (…). No entanto, quer ao nível do conteúdo das iniciativas, quer ao nível da implementação no terreno, notaram-se bastantes insuficiências»
P. 32 (sobre o Programa Novas Oportunidades): «Esta foi uma das iniciativas mais emblemáticas do Governo na área da formação para esta legislatura. (…) No entanto, e à luz dos dados disponíveis, as Novas Oportunidades transformaram-se mais numa iniciativa de certificação de níveis de escolaridade do que de efectiva formação»
P. 35: «Poucos progressos no aumento da qualidade de vida dos Portugueses num quadro sustentável de desenvolvimento» (ie, houve progressos, mas foram poucos)
P. 37: «Na área dos meios alternativos de resolução de litígios, o avanço ficou aquém das expectativas» (ie, houve avanço, mas não chega)
P. 38: «Relativamente à desjudicialização, foram tomadas algumas medidas, mas tal esforço, que é louvável e vai no caminho certo, não logrou aliviar significativamente o congestionamento dos Tribunais»
P. 48 (sobre as medidas anti-crise): «a prioridade dada pelo Governo à protecção do emprego, à extensão de alguns benefícios sociais e ao apoio à actividade das PME’s deve ser vista como positiva, podendo no entanto ser discutidas as escolhas concretas de instrumentos e a implementação prática dessas medidas»
P. 56: «Na educação houve diversas medidas de natureza positiva (…). Dito isto, é preciso acrescentar que o Governo não actuou suficientemente ao nível estrutural»
P. 58: «Perante a crise internacional, o governo actuou com eficácia na estabilização do sector financeiro, mas as suas intervenções de estímulo à economia real foram limitadas ou discutíveis»
Em suma, uma no cravo e outra na ferradura, que é para estar bem com Deus e o Diabo. Contudo, se o caminho do Governo nos mais variados domínios é correcto, embora com resultados insuficientes, é caso para perguntar se o Compromisso Portugal não deveria então explicitamente apoiar a re-eleição do actual Governo, para que possa continuar o bom caminho e assim atingir os resultados que até agora ainda não conseguiu atingir…
A cartilha do costume: privatizar, privatizar, privatizar
P. 54: «O XVII Governo Constitucional no decorrer da legislatura de 2005-2009 demonstrou dificuldade em conseguir responder aos verdadeiros problemas estruturais do País. Nisso não foi, aliás, pior que os governos que o antecederam [o de Manuela Ferreira Leite também, portanto], os quais também pouco fizeram nesse sentido» (p. 54). E quais são, então, para o Compromisso Portugal, as questões estruturais? «1) quando é que o Estado deve ser garante de serviços, e quando é que deve ser garante e simultaneamente prestador de serviços; 2) que lugar pode existir nos serviços públicos para a iniciativa privada; 3) em que situações deve o Estado permanecer como accionista de empresas» ( p. 55). Em suma, a velha conversa neo-liberal da revisão das funções do Estado.
Mas, no capítulo da educação, o Compromisso Portugal é ainda mais explícito: «há que referir que os caminhos do futuro, também na educação e qualificação dos portugueses, passam pela redefinição do papel do Estado no sentido da separação de funções do Ministério da Educação enquanto empregador e gestor da rede pública de escolas, e por outro lado, enquanto agente regulador/avaliador de todo o sistema educativo. A visão do Compromisso Portugal é de que compete ao Estado essencialmente assumir-se como definidor das políticas de enquadramento do sector» (p. 34). Isto é, privatizem-se as escolas!
O despudor, a lata, o descaramento
P. 57: «A promiscuidade entre política e negócios ter-se-á agravado». Diz o Compromisso Portugal, de que um dos principais dirigentes (Vaz Guedes, ex-CEO da Somague) foi condenado por financiamento partidário ilícito ao PSD…
O apelo: lembrem-se de nós, que somos tão bons!
P. 58: «Seria importante que os futuros Governos aprendessem a respeitar e aproveitar melhor tudo aquilo que a Sociedade Civil em Portugal é e está disponível para dar»
E, por fim, a grande solução do Compromisso Portugal para o futuro: «Não será possível evitar uma atitude de moderação salarial» (p. 60). Dos outros, certamente. Bonito, bonito, era ver os próprios quadros e gestores do Compromisso Portugal darem o exemplo e baixarem as suas remunerações. Que tal?’
- Enviado por José M.
1 comentário :
Esses babons que vão catar formigas para o deserto e aí poderão dar largas às suas incompetencias, politicas e profissionais...pois não há nada para gerir, aqui sim tenho a certeza que serão bons...
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