quarta-feira, maio 19, 2010
Mais um pulo do Lomba (sem rede)
Pedro Lomba tenta com algum engenho e muita persistência demonstrar o indemonstrável para legitimar a utilização das escutas do processo Face Oculta por uma comissão parlamentar de inquérito. Mas dá pena — porque se trata, segundo se ouve por aí, de uma pessoa não destituída intelectualmente — observar a indigência da sua argumentação jurídica. Às vezes, a paixão cega (ou será a falta de escrúpulos que mata?).
O ponto de partida é uma interpretação literal rasteira do artigo 34.º, n.º 4, da Constituição. Que diz Lomba? Diz que, como o artigo se refere “apenas” à ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação (salvos os casos previstos na lei em matéria de processo penal), apenas abrange a actividade de intercepção, mas não a utilização das próprias escutas.
É de pasmar! Lomba acha que é necessário juiz, processo penal e lei estrita para proceder às escutas, mas uma vez realizadas vale tudo. Podem ser utilizadas na Assembleia da República ou — por que não? — num programa de variedades na rádio e na televisão.
O “equívoco” de Lomba é que não “percebe” que a interferência nas comunicações abrange a intercepção, a gravação e a utilização das conversações — seja em que contexto for.
Só assim se compreende o cuidado do legislador constitucional. Este pretende salvaguardar, acima de tudo, a reserva da vida privada. A interferência refere-se a todas estas actividades, sob pena de a proibição constitucional ser absurda e ineficaz.
É isso que explica o regime do processo penal, com o qual Lomba não parece estar familiarizado. Veja-se que a lei até restringe a possibilidade de as escutas serem utilizadas em processo diferente daquele em que foram autorizadas. Essa utilização depende de estar em causa um crime daqueles que admite a realização de escutas (artigo 187.º, n.º 7, do Código de Processo Penal).
Pela mesma razão, o artigo 126.º, n.º 3, do mesmo código diz que não podem ser utilizadas as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações fora dos casos previstos na lei.
A todos estes imperativos constitucionais e legais Lomba é indiferente. Na sua douta opinião, escutas efectuadas no processo penal, por autorização do juiz com a única finalidade de investigar crimes, podem ser utilizadas para apuramento de responsabilidades políticas, no âmbito de uma comissão parlamentar de inquérito, que não tem autorização legal para produzir ou apreciar esses meios de prova.
Palavras para quê? É um opinion maker português…
PS — O facto de um magistrado ter enviado as escutas para a Assembleia da República não desmente nada do que se diz. Se um magistrado envia as escutas para um jornal, violando grosseiramente os seus deveres, nem por isso o jornal pode licitamente publicar os conteúdos. O parlamento não deveria ter pedido as escutas ao magistrado, se compreendesse o sentido do princípio da separação de poderes. Mas recebidas as escutas, nem por isso a Assembleia da República pode apreciar ou ter em conta as escutas (sejam resumos ou transcrições), porque o envio não dispensa a (inexistente) autorização constitucional e legal.
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6 comentários :
Os programas de variedades na rádio e na televisão têm poderes para solicitar aos Tribunais quaisquer documentos em seu poder que possam interessar aos ditos programas? Não. É que as Comissões Parlamentares têm.
O Abrantes está com muito medo...
Felizmente, o vosso fim está perto, só é pena que seja depois de nos terem mandado para a bancarrota. Os socialistas são uma cambada de inúteis e de incompetentes (é só ver Grécia e a Espanha…)!
O Abrantes está com muito medo...
Felizmente, o vosso fim está perto, só é pena que seja depois de nos terem mandado para a bancarrota. Os socialistas são uma cambada de inúteis e de incompetentes (é só ver Grécia e a Espanha…)!
Continuo a não entender que ninguém tome a iniciativa de deslindar o assunto, entre aqueles que poderão ter talvez essa possibilidade e mesmo obrigação.
Com os magistrados de Aveiro a república não pode contar, pois foram eles que iniciaram o erro, enviando os documentos e dando cobertura à sua utilização ilegal. De resto, já encontrei na blogosfera referências a uma alegada proximidade de nomes ao PSD... mas talvez seja só intoxicação...
À comissão, ficar-lhe-ia bem ela mesmo tomar a iniciativa de procurar esclarecer o assunto junto de quem é competente para tal, assunto que, à evidência, não fica resolvido com uma votação interna. E entretanto suspender aquilo que me parece ser muito grave, que é prosseguir numa prática sobre a qual, mesmo internamente, há tanta divergência.
Não sei bem qual é o papel do Presidente da Comissão, mas penso que a função não se limita a distribuir a palavra e controlar os tempos de intervenção. Não tem uma responsabilidade particular? Ou basta-lhe introduzir os protestos que lhe chegam no triturador de papel?
O Presidente da Assembleia da República está alheio a todo o processo? Não tem poder e obrigação de tomar as iniciativas tendentes a garantir que na casa que dirige a lei é correctamente interpretada e respeitada?
O Procurador Geral da República não terá direito e obrigação de velar pelo cumprimento da lei, dentro da AR como fora dela, e iniciar os mecanismos necessários para se assegurar dessa legalidade? Tanto mais que o PGR tem, desde ontem, outro aspecto a considerar, além do uso ilegal dos documentos: a descarada violação do segredo de justiça, por parte do deputado Pacheco Pereira...
Ou não há ninguém que mexa uma palha, ou não há meio de intervir, e uma comissão, uma vez constituída, pode funcionar impunemente, em roda livre, ao arrepio da lei e da dignidade que deveriam preservar? É surpreendente verificar que se pode desrespeitar assim a lei, conscientemente, com premeditação e à vista de todos, e ninguém possa ser responsabilizado por isso. Péssimo exemplo.
Pobre país este, que tão pobres representantes elege... e paga.
Para estes senhores voltámos ao farwest.
Voltámos ao tempo do rancho da Ponderosa na série do Bonança.
Naturalmente que o Pacheco Pereira interpreta o papel de Hoss, um dos manos Cartwright.
A jogada dos palhaços é já que os jornais não podem publicá-las damos nós o lamiré contornando a lei.
Na hora da verdade ides ver o que vai sair à casa!
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