- Como vão atingir-se em 2011 os objectivos de redução do défice?
Com as medidas que propusemos e que se encontram validadas pelas instituições que têm como missão avaliá-las. Temos o objectivo de reduzir o défice dois pontos percentuais, com um conjunto de medidas que são consideradas corajosas e suficientes pela Comissão Europeia, que chama a atenção para a necessidade de manter este esforço em 2011, ano no qual praticamente queremos tirar mais três pontos percentuais ao défice. Isso implicará medidas que constarão no Orçamento do Estado de 2011, mas que já estão previstas no PEC. Uma das mais importantes é estabelecer tectos nas deduções fiscais com despesas na educação e na saúde.
O PSD já disse que não aceita isso.
Pois não. Sabemos que o PSD preferia que impuséssemos cortes profundíssimos nos salários dos funcionários públicos. Actualmente o que acontece é que os contribuintes dos escalões mais altos deduzem cinco vezes mais que os contribuintes do terceiro escalão, os que têm rendimentos médios. Ou seja, quanto mais rendimento tenho mais deduzo, menos impostos pago e mais beneficio de despesa fiscal, assumida pelo Estado. Nós achamos que essa regressividade é contraditória com o princípio da progressividade fiscal. Não queremos acabar com as deduções, queremos é estabelecer tectos para as deduções da saúde e da educação, de forma que 3 milhões dos 4,5 milhões de declarações fiscais fiquem de fora destes tectos. Quem ficará prejudicado são os rendimentos mais altos, que beneficiam desproporcionadamente de deduções. Ora o PSD não quer que as pessoas que recorrem aos serviços privados de saúde e educação também paguem, como contribuintes, para os serviços públicos. Essa é uma diferença essencial e que põe o PSD fora do Estado social.
O PSD diz que ninguém deixará de ter acesso à saúde por não ter rendimentos.
Claro, é a teoria do Estado mínimo. É a teoria de converter o serviço público de saúde e de educação - e também a segurança social, não tenhamos dúvida - em serviços para os pobres. Ora o que caracteriza o Estado social europeu é construir sistemas públicos de natureza social que integram todos e não são apenas dirigidos para os pobres.
A diabolização do PSD por querer atacar o Estado social é a grande bandeira política do PS nos próximos meses...
A coisa é muito mais séria do que isso. Ninguém está a diabolizar. O que o PSD fez nos últimos dias foi apresentar um projecto de revisão constitucional que não tem pernas para andar. Nunca haverá uma revisão constitucional com base neste projecto e o PSD sabe-o muito bem. O que o dr. Passos Coelho fez foi apresentar ao país o seu manifesto político e ideológico. Disse claramente aos portugueses "eis ao que venho e eis o que quero: o que quero é substituir o chamado Estado-providência pelo Estado-garantia". Isto está nos antípodas daquilo que tem sido não só a posição do PS mas a prática de anteriores lideranças do PSD, designadamente quando tiveram responsabilidades de governo. O que é hoje claro é que o PSD substituiu uma liderança do "não se pode fazer nada", com a dr.a Ferreira Leite, por uma liderança que se revela imatura. O que está hoje à vista dos portugueses é a insustentável leveza do dr. Passos Coelho.
O PS agradece esta proposta por permitir marcar uma clivagem ideológica depois dos acordos de bloco central?
Não. Estamos perante um problema muito delicado. A insustentável leveza da actual liderança do PSD vê-se em primeiro lugar por revelar não ter consciência das dificuldades que o país atravessa. Não vivemos tempos de fazer um debate ideológico sobre uma nova Constituição, mas sim de combater a crise económica. Depois, a leveza e imaturidade da actual liderança vê-se pelo facto de não ter noção do sentido das prioridades. E depois por não ter um sentido do tempo político. Vamos discutir os poderes presidenciais em plena campanha para as presidenciais? Isto faz algum sentido? E depois, finalmente, parece que o dr. Passos Coelho está a revelar-se mais um porta-voz de interesses do que um líder político.
Quais interesses?
Eu uso a palavra "interesse" não no sentido pejorativo. Mas com a proposta gravíssima de alteração do artigo da Constituição sobre despedimentos, o PSD assume-se como porta-voz de uma reivindicação antiga das entidades patronais. Aliás, não é por acaso que, no mesmo movimento em que faz isto, o PSD propõe a desconstitucionalização do princípio da concertação social. A resposta da UGT, que é uma central sindical com forte influência do PSD, não podia ter sido mais clara. O que está aqui em causa na proposta de substituir a expressão "justa causa" pela expressão "razão atendível"? O que está em causa é a liberalização pura e dura do despedimento individual. Tirar o adjectivo "justo" da Constituição quando se trata de despedimento individual é dizer "despeçam à vontade: já não é preciso que a causa seja justa para que o trabalhador perca o emprego". Isto é próprio de um partido que tem no nome "social-democrata"? Não me parece.
1 comentário :
Muito sumo consta aqui! Na realidade a merecer estudo atento dos socialistas pois os combates próximos contra os NeoLiberais Destruidores do Estado Social passa por o que Santos Silva alerta. Um 'must'.
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