quarta-feira, agosto 25, 2010

E se o crescimento tivesse chegado ao fim?

• João Pinto e Castro, Pensando o impensável: e se o crescimento tivesse chegado ao fim?:
    Fomos educados na convicção de que o crescimento é um facto da vida tão natural como o ar que respiramos.

    (...)

    Inversamente, alguns autores julgam detectar sintomas de que entrámos já na era da estagnação económica persistente. Porém, mesmo que assim fosse, passaria muito tempo até podermos estar certos disso. Alguns países e algumas actividades cresceriam por algum tempo mais que outros, sugerindo que talvez esses exemplos pudessem ser imitados. O primeiro sinal seguro seria a multiplicação de conflitos violentos pelo controlo dos recursos, a começar pela água.

    Embora seja cedo para se tirar uma conclusão, podemos especular sobre as consequências do estado estacionário para as nossas sociedades se, e quando, ele vier. Na visão optimista partilhada por Mill e Keynes, a estagnação equivaleria à admissão de que o problema económico se encontraria resolvido, propiciando a reorientação dos esforços colectivos para o desenvolvimento cultural, moral e social da humanidade. Idealmente, teríamos sociedades tão prósperas como hoje, mas incomparavelmente mais estáveis, mais cultas, mais igualitárias e menos agressivas.

    Mas seria possível garantir elevados níveis de emprego sem crescimento? Ausente a meta do crescimento a todo o custo, tornar-nos-íamos decerto menos tolerantes para com as desigualdades que alegadamente são o seu preço. A competição perderia parte dos seus atractivos. As políticas distributivas tornar-se-iam mais populares (talvez demasiado), visto que a economia tenderia a ser encarada como um jogo de soma zero. Tenderia a questionar-se a liberdade de concorrência, a começar pela internacional. É de temer que menos crescimento implicasse também menor fermento cultural e menor abertura de espírito.

    Acresce que o actual estado de desenvolvimento não é suficiente para que a distribuição equitativa dos recursos proporcione um nível de vida aceitável à população do planeta que permanece na pobreza extrema. Por isso, mesmo na hipótese pouco provável de que os países desenvolvidos se resignassem ao seu grau presente de bem-estar, é óbvio que nem chineses, nem indianos, nem (por maioria de razões) africanos aceitariam deixar de crescer.

    Com tantas dúvidas e perplexidades, uma coisa é certa: uma sociedade de crescimento zero seria muito diferente da actual, e a transição para ela, ao frustrar expectativas acumuladas ao longo de gerações, dificilmente se faria de forma pacífica.

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