domingo, março 27, 2011

O FMI não é propriamente a CGD, como agora nos querem fazer crer

O "Expresso" de ontem traz no caderno de Economia uma peça com o título "O FMI já chegou e ninguém sabia". Se o título diz tudo - a notícia compara as medidas de austeridade tomadas em Portugal, Irlanda e Grécia -, a moral da história parece então ser: "não tenham medo, porque se afinal houver uma intervenção do FMI, as coisas não serão piores do que já são". Infelizmente, a peça incorre numa dupla falácia.
    1) Primeiro, porque o que o Governo fez não é exactamente o mesmo que o FMI impôs na Grécia e na Irlanda. É lógico - e trivial - que existem semelhanças importantes nos programas de redução do défice a da dívida nos vários países: o menu de políticas não é infinito e a similitude inevitável. No entanto, o artigo ignora coisas essenciais. Em primeiro, a dimensão dos cortes. Por exemplo, no sector público, em Portugal não existe nenhum programa de despedimentos sistemático na função pública, como está previsto no programa irlandês, com a redução prevista de 25 mil funcionários (com esta medida, a Irlanda pretende voltar ao número de funcionários de 2005; mas isto só acontece porque o país fez crescer o sector público entre 2005 e 2008, processo inverso ao que ocorreu em Portugal entre 2005 e 2009, onde houve uma diminuição ao abrigo da reforma da administração pública). Outro exemplo: acham mesmo que a redução de salários na função pública acima dos €1.500/mês em Portugal é equiparável ao corte do 13.º e do 14.º mês que sofreram os funcionários gregos, ou que a política de moderação salarial no sector privado em Portugal é o mesmo que o fim dos subsídios de férias e de Natal no mesmo país?
      2) Depois, a entrada do FMI implicaria a imposição de ainda mais medidas, independentemente do facto de já várias delas já estarem a ser implementadas. Dado que o FMI não é propriamente a CGD, o recurso ao resgate só é possível num regime de forte condicionalismo, e levaria inevitavelmente a um acentuar da austeridade (fosse ela composta pelas mesmas medidas ou por outras novas). Basta lembrar que a Irlanda já tinha adoptado cinco pacotes de austeridade desde 2008 - ou seja, antes da entrada do FMI -, e que a intervenção deste levou a um intensificar das medidas, inscritas no National Recovery Plan 2011-2014. Também na Irlanda se podia dizer que o FMI "já lá tinha entrado" antes de Novembro de 2010, e mesmo assim a sua entrada levou a mais austeridade.

        "O que é que é mais austeridade?" perguntam.
        Bom, coisas como o corte de 30% no salário dos funcionários públicos, como aconteceu na Letónia (que pediu a ajuda do FMI em Dezembro de 2008), ou despedimento de mais dezenas de milhares de funcionários públicos, como aconteceu na Roménia (que pediu a ajuda em Abril de 2009), onde foram despedidos mais 100 mil, quase 10% do total.
          Contributo do Pedro T.

        5 comentários :

        Anónimo disse...

        O Expresso do militante n.º 1 está a tentar suavizar as coisas.

        Também acabámos de ver outro militante, o prof. Marcelo, a dizer que afinal eles aprovaram o PEC, mas votaram contra o Sócrates - ouvimos bem?

        Amanhã vêm mais mercados. Agarrem-se às cadeiras...

        Anónimo disse...

        A Caixa faz parte do POTE.

        Anónimo disse...

        Isto o Pote com a cobertura do FMI e do chefe de facção tem outro sabor...enquanto o FMI fica entretido a tratar da saúde ao povo, a ladroagem de sempre fica à vontade para escavar os buracos de vários bpns.

        Anónimo disse...

        O pote era uma metáfora. O que ele queria dizer naquela altura era "não queremos ir já à Caixa...", chegou agora a hora de irem à Caixa.

        Ana Paula Fitas disse...

        Faço link, Miguel... incontornavelmente, no próximo Leituras Cruzadas.
        Abraço.