segunda-feira, setembro 26, 2011

Enriquecimento injustificado

António José Seguro explica hoje no DN o voto do PS sobre o enriquecimento ilícito:
    'O combate à corrupção é uma prioridade da agenda política do PS. O que o PS não aceita é que um cidadão português seja preso sem que tenha sido apresentada prova do crime de que é acusado. Não aceita o PS, e estou certo de que não aceita a maioria dos portugueses. Aceitar esta inversão do ónus da prova constituiria um retrocesso civilizacional.

    O combate à corrupção, como é reconhecido internacionalmente, trava-se com uma abordagem global, multifacetada, em várias frentes. Um combate que, não menosprezando aperfeiçoamentos legais, deve ser acompanhado da dotação de meios eficazes e operacionais para o cumprimento da actual legislação de combate à criminalidade económica e financeira. Foi nesse sentido que o PS apresentou na Assembleia da República uma proposta que sancione rendimentos e patrimónios injustificados. Fê-lo com preocupações de eficácia e de operacionalidade, respeitando a Constituição da República Portuguesa. De uma forma muito clara e sucinta relevo as ideias-base da nossa proposta:- considerar como crime declarações falsas ou ausência de declarações sobre rendimentos e património dos políticos e de altos cargos públicos; - congelar a favor do Estado os rendimentos e património sem justificação e avançar com investigação criminal pelo Ministério Público.

    Deste modo, através de um processo muito eficaz e imediato, o Estado salvaguardava os seus interesses e acautelava eventuais subterfúgios que permitissem a fuga de património e rendimentos. Um outro dado inquestionável é o de que a proposta do PS não corre o risco de ferir a Constituição e, por isso mesmo, poderia ter aplicação imediata. Acresce que é pretensão do PS alargar estas medidas a outros agentes públicos e responsáveis que agem em nome do Estado. No entanto, estas propostas foram chumbadas pelo PSD, CDS, PCP e BE. Fizeram-no por mero jogo partidário. Quiseram passar para a opinião pública a ideia de que o PS não está interessado no combate à corrupção. Falsidades.

    Comportamentos lamentáveis destituídos de sentido de Estado. Em Julho, no primeiro debate com o PM, disponibilizei o PS para a criação de um forte consenso interpartidário para o combate à corrupção. Mas a maioria PSD/CDS ignorou a nossa disponibilidade e excluiu, deliberadamente, o PS desse consenso nacional. Lamento afirmar, mas chegou à altura de o dizer: este comportamento (da maioria PSD/CDS) parece tornar-se num padrão de comportamento político. Pode corresponder a objectivos partidários, mas enfraquece o interesse nacional. Um padrão que pode sair muito caro a Portugal.

    A nossa proposta alternativa é séria. Somos oposição responsável e construtiva. Apresentámos uma proposta corajosa. Equilibramos o objectivo fundamental de sancionar o enriquecimento sem justificação (partilhado pelo PS, sem margem para qualquer dúvida) com meios eficazes em respeito pelos mais sólidos princípios constitucionais do mundo ocidental: presunção da inocência e, no crime, o ónus da prova pertence a quem acusa. A Constituição consagrou princípios que resultam da nossa evolução civilizacional e apreendidos pelo poder constituinte. A previsão constitucional não é o princípio da história. É a consagração de uma experimentada cultura de vida em sociedade. É aliás uma consagração de princípios liberais, na verdadeira acepção do termo, de protecção do indivíduo perante abusos do Estado. É uma defesa das pessoas, das suas liberdades e da sua dignidade.

    A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC) foi nesse sentido quando estabeleceu que cada Estado deve combater o aumento significativo do património de um agente público para o qual ele não consegue apresentar uma justificação razoável face ao seu rendimento legítimo, no respeito pela sua Constituição.

    Foi isso que o PS fez. Com grande rigor. O PSD e o CDS trocaram o Estado de direito e o respeito por princípios civilizacionais por apelos mediáticos que apenas conduzirão a medidas ilusórias, continuando a alimentar a descrença dos portugueses no empenho político para o combate à corrupção. A corrupção é inimiga do Estado de direito e enfraquece o nosso regime democrático, ameaçando também o nosso desenvolvimento económico. Merece largo consenso nacional e muita seriedade na sua abordagem. O PS reafirma que até ao final do ano continuará a apresentar propostas e desencadeará iniciativas que acabem com o "passa culpas" entre poder político e judicial, resistindo aos apelos populistas que, tomando a parte pelo todo, desresponsabilizem quem deve ser responsável. Os diagnósticos estão feitos. Ainda durante este mês iniciaremos um conjunto de reuniões com os representantes dos operadores judiciários, investigadores e organizações não governamentais, com vista a estabelecer um amplo compromisso nacional, sério e eficiente, respeitador dos direitos fundamentais, de combate à corrupção. Agiremos com sentido de responsabilidade e determinados em acabar com opacidades que apenas contribuem para suspeições generalizadas sobre a vida pública. A transparência é a chave para esta reforma.'

1 comentário :

Rosa disse...

Seguro foi bem claro:e lembrei-me dos passos que esta lei já trilhou...enorme falta de coerencia...tem de se estar muito atento com as "reviravoltas" que estes governantes dão...e o PS deve, sempre, explicar as coisas pois as pessoas têm tendência para se esquecer rapidamente.
Até porque têm uma vida bem complicada.