domingo, agosto 26, 2012

“RTP: privatizar ou não privatizar, eis as questões” (2)

    Quais são as componentes essenciais da prestação do SPRTV?
    Não obstante a definição do serviço público competir ao Estado, a sua conceção não pode deixar de assentar em vários princípios, sob pena de violação do seu núcleo essencial. Os princípios da universalidade - chegar a todos os públicos e através de todas as plataformas possíveis; do pluralismo - representar a expressão e permitir o confronto das diversas correntes de opinião; da diversidade - multiplicar os géneros, temas e interesses suscetíveis de tratamento pela comunicação social; da igualdade - programar, de modo não discriminatório, para os diversos sectores da sociedade; da coesão e integração nacional - refletir na sua programação, através de referenciais comuns (valores e gostos), as necessidades e os interesses da população no seu todo e em particular das minorias sociais; da qualidade - pautar a sua programação por uma exigente ética de antena e pela promoção de atividades educativas, desportivas, culturais; da inovação - adaptar-se tecnologicamente e promover a experimentação ao nível dos conteúdos, são alguns dos princípios que necessariamente norteiam o SPRTV, suscitando largo consenso na doutrina nacional, nas instâncias internacionais e na legislação dos países europeus.

    O Estado não pode adotar uma definição "minimalista" de serviço público?
    A definição de SPRTV não pode envolver a sua própria negação. A Comunicação da Comissão n.º 2009/C 257/01 acolhe as conclusões da resolução do Conselho relativa ao SPRTV, de 25.01.1999, onde se estabelece que "um amplo acesso do público, sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades, a várias categorias de canais e serviços constitui uma pré-condição necessária para o cumprimento das obrigações específicas do serviço público de radiodifusão". Assim, o serviço público não pode deixar de responder aos interesses dos diversos públicos, integrando várias categorias de canais e serviços de acesso livre que respondam às necessidades da sociedade no seu todo.

    Pode o serviço público de televisão ser prestado com um só canal livre de âmbito nacional?
    Cada vez menos, atenta a crescente diferenciação dos públicos e fragmentação das audiências. Um canal free-to-air que congregue informação, formação e entretenimento para o grande público não pode deixar de ser complementado por um ou mais canais de acesso livre que respondam às necessidades de públicos específicos e minorias. Tornar-se-ia impossível oferecer num só canal, diariamente e em horários adequados: 9 horas de programação infantil diferenciada (pré-escolar, 1.º ciclo e 2.º ciclo), magazines culturais, religiosos e de promoção do conhecimento, divulgação das atividades de mais de uma centena de organizações da sociedade civil, documentários nacionais, séries e filmes de qualidade que não podem ser vistos noutros canais, hoje oferecidos pela RTP2; mais de 7 horas de informação, incluindo regional, debates, programas de valorização cultural e de entretenimento, com salvaguarda da dignidade das pessoas, hoje disponibilizados pela RTP1.

    A RTP cumpre o serviço público a que está obrigada?
    Um estudo recente do Obercom (de 09.2011), demonstrando que "há, entre os portugueses, uma forte associação e identificação positivas face à ideia de um serviço público de televisão em Portugal", conclui não só que "a percepção dos inquiridos sobre o papel do serviço público quanto à qualidade da informação veiculada é francamente positiva", como também que em matérias como o pluralismo político e a diversidade da programação, a promoção da cidadania, a contribuição para a identidade nacional, o serviço público revela uma clara mais-valia face aos operadores privados. Além disso, o serviço público é, por força do sistema de fiscalização instituído, anualmente escrutinado por auditorias externas independentes e pela ERC, que o têm invariavelmente considerado cumprido, tanto nos aspetos de programação como financeiros. Nota-se, no entanto, que as questões do cumprimento e do ganho social gerado pelo SPRTV nunca foram sequer ponderadas pelas instâncias decisórias, permanecendo ocultas as razões que presidem ao desejo de "privatizar" o serviço público e de fechar um canal.

1 comentário :

josé neves disse...

A pessoa certa para responder a tais questões seria o Pacheco, ele o grande defensor da privatização, a tal que libertaria Portugal da "asfixia democrática".
O Pacheco ainda não se pronunciou sobre esta questão que tanto o preocupava-ocupou durante a "manipulação" e "asfixia" tão sentida e temida por sua excelência no tempo Sócrates.
E a piada está que agora, sem falar de manipulação, asfixia ou controlo de liberdade de opinião, publica post-queixinhas, adiantando que o faz porque, vejam bem, dos ventos e ares actuais pressente que, quase certo, em breve tais coisas não passarão ou não poderão ser ditas nos media.
Ó Pacheco e que tal solicitar uma comissão parlamentar de inquérito ao estado e qualidade da tua cabeça?