segunda-feira, outubro 29, 2012

“Suspeitar que o primeiro-ministro só mantém esses privilégios com o fito de, com eles, tentar comprar indulgências judiciais”


• António Marinho e Pinto, Austeridade e privilégios:
    ‘Num segundo momento, a ministra da Justiça (que não chegou a vice-presidente do PSD pela cor dos olhos ou dos cabelos) tratou, no maior sigilo, de tomar outras medidas mais eficazes, prometendo aos magistrados que continuarão a usufruir do privilégio de poderem viajar gratuitamente nos transportes públicos, incluindo na primeira classe dos comboios Alfa. Para isso garantiu-lhes (sempre no maior segredo) que o Governo iria retirar da Lei do Orçamento a norma que punha fim a esse privilégio. O facto de o Orçamento já estar na Assembleia da República não constitui óbice, pois, para a ministra, a função do Parlamento é apenas a de acatar, submisso, as pretensões dos membros do Governo, incluindo os acordos estabelecidos à sorrelfa com castas de privilegiados.

    Mas, mais escandaloso do que esse sigiloso acordo político-judicial é a manutenção para todos os magistrados de um estatuto de jubilação que faz com que, mesmo depois de aposentados, mantenham até morrer direitos e regalias próprios de quem está a trabalhar. E ainda mais vergonhoso do que tudo isso é a continuidade de privilégios remuneratórios absolutamente inconcebíveis num regime democrático, sobretudo em períodos de crise e de austeridade como o atual.

    O primeiro-ministro, se ainda possui alguma réstia de dignidade e de moralidade, tem de explicar por que é que os magistrados continuam a não pagar impostos sobre uma parte significativa das suas retribuições; tem de explicar por que é que recebem mais de sete mil euros por ano como subsídio de habitação; tem de explicar por que é que essa remuneração está isenta de tributação, sobretudo quando o Governo aumenta asfixiantemente os impostos sobre o trabalho e se propõe cortar mais de mil milhões de euros nos apoios sociais, nomeadamente no subsídio de desemprego, no rendimento social de inserção, nos cheques-dentista para crianças e - pasme-se - no complemento solidário para idosos, ou seja, para aquelas pessoas que já não podem deslocar-se, alimentar- -se nem fazer a sua higiene pessoal.

    O primeiro-ministro terá também de explicar ao país por que é que os juízes e os procuradores do STJ, do STA, do Tribunal Constitucional e do Tribunal de Contas, além de todas aquelas regalias, ainda têm o privilégio de receber ajudas de custas (de montante igual ao recebido pelos membros do Governo) por cada dia em que vão aos respetivos tribunais, ou seja, aos seus locais de trabalho.

    Se o não fizer, ficaremos todos, legitimamente, a suspeitar que o primeiro-ministro só mantém esses privilégios com o fito de, com eles, tentar comprar indulgências judiciais.’

11 comentários :

Rosa disse...



Directo e eficaz, Dr. Marinho Pinto!

Um caçador tinha em c disse...


Estás enganado, Marinho: os Magistrados portugas merecem todas essas regalias por um único motivo, que por acaso até são três: trabalham muito, depressa e bem!

Um caçador tinha um cão... disse...



O último comentário é meu.


Ass.: Um Caçador Tinha Um Cão E A Mâe Do Caçador Era Também O Pai Do Cão.

Fernando Romano disse...

EMBORA SAIBAMOS.... É BOM LEMBRAR!

A nossa Justiça, devido à ação de muitos dos seus agentes, não se libertou da influência do "fero monstro". É bom lembrar algumas das cumplicidades e privilégios de então, que se têm refletido nos últimos anos do séc. XXI na cultura e prática da justiça portuguesa, em plena democracia.

Durante 350 anos (1939-1821) a justiça portuguesa viveu dominada pelos tribunais distritais da inquisição portuguesa e os tribunais régios eram simples simulacros de uma justiça civil. Imperava a indisciplina entre os membros dos tribunais a todos os níveis, integrá-los era um trunfo decisivo para redimir conflitos entre famílias e bandos de poder das vilas e cidades, era permanente o lançamento de infâmias entre os membros dos tribunais decorrentes das relações de concorrência e rivalidade, e a instigação à denúncia falsa para confiscação, não só de bens, mas também de lugares na administração pública.

Em Portugal, ao contrário do que se passava com a inquisição noutros países, os privilégios concedidos aos agentes da inquisição eram deveras apetecidos, tais como: isenção de impostos, de serviços comunitários, de serviço militar, de alojamento de tropas e até podiam usar vestuário de seda..., mesmo não sendo cavaleiros, etc., etc.

Pode dizer-se que todos os agentes da justiça e da magistratura, e "familiares" (nos dias de hoje encontramos estes nos mídia, por todo o lado), apoiados pelos homens ricos e gente abastada, conselheiros, mesmo a régia, gozavam de todos os privilégios, inclusive o de etiqueta e representatividade, detendo rédeas apertadas sobre toda a vida pública e cultural do país. Os de hoje (muitos deles) bem gostariam de ser recebidos a uma légua dos sítios e cidades a que se deslocam.

Durante 300 anos cristalizou-se uma cultura de proeminência dos agentes da justiça assente em crimes, violações, roubo, confiscação de bens, não só, convém realçar, entre os que faziam parte da inquisição, mas também entre os que pertenciam aos tribunais civis.

O próprio poder local municipal foi alienado por esta poderosa organização com a cumplicidade do poder político de então.

O que se passa hoje (e nos últimos anos) na justiça portuguesa, nomeadamente as relações de muitos dos seus agentes com este governo e seus conhecidos amigos..., demonstra claramente que aquela cultura tem ainda influência poderosa na justiça portuguesa. Nessa denúncia tem tido Marinho e Pinto desempenho a merecer vivo aplauso.

A perseguição que fizeram ao ex-Primeiro Ministro é bem o exemplo de que ainda há fortes resíduos da Inquisição na justiça portuguesa, onde se manifesta, para além do mais, muita cagança e roncar em muitos dos seu agentes.

(Comentário feito na base de apontamentos de leitura do livro de Francisco Bettencourt, "História das Inquisições: Espanha, Portugal e Itália")

Teófilo M. disse...

E ninguém protesta!?
Será medo?

james disse...

Protesta?

Nem Sócrates conseguiu inverter o curso das coisas, quanto mais este povinho que quando entra num Tribunal tropeça à beira do altar, atrapalhado, respeitoso e temeroso como se estivesse numa igreja (atente na configuração arquitectónica dos Tribunais e veja como se posicionam espacialmente os operadores judiciários).

Vc caro Teófilo, ainda deve acreditar no Pai Natal, desculpe que lhe diga.

BUÍÇA (Séc. XXI) disse...



Obrigado, Fernando Romano.


Afinal, a "causa das coisas" é sempre muito simples, a sua "explicação" é que pode complicar tudo.


Começo agora a ver muito melhor o "Filme" todo da História de Portugal, das Guerras Liberais, da Carbonária e da República e de quanto o 25 de Abril terá tido uma "ejaculação precoce", em termos societais...

james disse...

Adenda: a não ser que queira importar a Revolução Cultural de Mao Zedong e ponha M. P. e juízes a plantar vinha no Ribatejo...

Anónimo disse...

Diz que há uma espécie de SIADAP para juízes. Lolololol.

Mas primeiro o furacão Sandy.

Anónimo disse...

Claro que Passos não vai fazer nada e que o objectivo é, exactamente, ter esta poderosa corporação(judicial)como aliada.Depois do que vimos passar-se com Sócrates , era óbvio prever que nunca mais -(enquanto houver Democracia)- , Governo algum ,de qualquer cor partidária , teria liberdade para tomar medidas que desagradassem à classe.

Casimiro Baltazar da Conceição disse...



Então... se calhar o melhor é optar mesmo pela vindima forçada, mas pelo sim pelo não na Malcata (ou até nos Urais), que o Ribatejo é ameno demais...