- ‘(…) a seriedade política e intelectual impõe que se analisem os motores desta correção. Os dados mais recentes do comércio internacional da economia portuguesa permitem-nos perceber a natureza da excecional quebra do défice comercial. Trabalhando perto de 100 sectores económicos da chamada Nomenclatura Combinada, e comparando os dados de janeiro a setembro de 2012 com os valores homólogos para 2008, importantes dados se revelam.
A redução do défice foi de 65% em termos nominais, cerca de 9.6 mil milhões de euros. Mas a análise por sectores/produtos desta variação merece uma leitura mais cuidadosa.
Cinco sectores concentram cerca de 60% da melhoria global verificada: automóvel; máquinas, aparelhos e material mecânico; elétrico; obras de ferro e aço e metais preciosos. Nos três primeiros sectores as importações caíram 4.5 mil milhões de euros e as exportações estagnaram.
É nesta concentração sectorial da redução da balança de bens que os problemas se adensam. Porque nesses sectores há um fortíssimo contributo da diminuição de importações apenas parcialmente contrariado pelas exportações do sector automóvel e pelo "fenómeno ouro"; porque estas atividades não possuem significativa capacidade de substituir importações no prazo curto; e porque se verifica uma quebra dos valores exportados em bens duradouros da fileira eletromecânica fazendo com que a quebra de importações tenha que compensar as exportações perdidas.
Estes fatores evidenciam de forma indiscutível a fragilidade deste ajustamento e até, em alguns casos, o seu efeito perverso em termos de modernização da economia e acréscimo do PIB potencial.
É certo que estes dados não diminuem o importante contributo da nova capacidade gerada na fileira floresta/papel/mobiliário, a solidez exportadora do sector do calçado, o progresso na fileira agroalimentar. Mas este esboço sintético mostra com evidência que os progressos não se aprofundarão sem um regresso do investimento produtivo em muitas destas atividades.
Valorizemos o que de bom se passa na modernização da nossa economia e no dinamismo de muitas empresas. Mas não é menos verdade que uma parte substancial da mais recente "correção estrutural" simplesmente não o é. Em grande parte ela é, antes, fruto de uma substancial quebra no consumo das famílias e de uma brutal quebra do investimento.
Podemos prolongar sustentadamente uma quebra na importação de bens de consumo duradouro? Em parte sim, teremos que o fazer.
Mas poderemos prolongar a queda acentuada do investimento produtivo? Seguramente que não, se queremos voltar a crescer.’
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