Fui ler o estudo do Banco de Portugal a que José Sócrates fez referência no último domingo. Foi o que também Luís Aguiar-Conraria fez, tendo aproveitado para projectar, partindo do multiplicador estimado no estudo do Banco de Portugal, o que aconteceria se o corte de 4,7 mil milhões de euros que o Governo ofereceu à troika fosse executado. Eis as contas de Aguiar-Conraria:
- ‘(…) Há uns tempos fiz um exercício considerando um multiplicador orçamental de 1,3. Pelos vistos, fui modesto. Economistas do Banco Portugal estimaram que em tempos de forte recessão como os actuais, no prazo de um ano, o multiplicador da despesa é 2. Valor que parece algo exagerado, mas a verdade é que está em linha com vários outros estudos internacionais. No pressuposto de que está correcto, levemos as contas até ao fim.
4,7 mil milhões de euros de cortes adicionais representam cerca de 2,85% do PIB. Considerando o multiplicador estimado pelo Banco de Portugal, este corte no orçamento provocaria uma queda no PIB 9,4mil milhões. Ou seja, cerca de 5,7%.
Só a queda no PIB provocaria um aumento da dívida pública de 125% para 132% do PIB. Adicionalmente, seria de esperar uma redução das receitas fiscais de cerca de 3,3 mil milhões. Possivelmente, estarei a exagerar na queda das receitas fiscais (35% da queda do PIB), mas a verdade é que também não estou a ter em conta a subida da despesa com subsídios de desemprego). Juntando todas estas contas, e admitindo que tudo isto é bastante grosseiro, reduziríamos o défice em cerca de 0.6 pontos percentuais.
Ou seja, com estes cortes, provocar-se-ia uma recessão brutal e sem precedentes, fazendo disparar o desemprego. Para no fim conseguir reduzir o défice público em menos de 1 ponto percentual do PIB e aumentar brutalmente o rácio da dívida pública. Seria uma loucura.’
Cavaco concluiu que o Governo não tem condições para se lançar sozinho nesta empreitada e, por isso, convidou o PS a associar-se, “com vista a um compromisso de salvação nacional que permita a conclusão, com sucesso, do Programa de Assistência Financeira e o regresso aos mercados, e que garanta a existência de condições de governabilidade, de sustentabilidade da dívida pública, de crescimento da economia e de criação de emprego.”
Perante este quadro tão negro, que “compromisso de salvação nacional” quer Cavaco? Talvez fosse útil que o PS, antes do início das negociações, tivesse a gentileza de oferecer aos seus interlocutores o estudo do Banco de Portugal a que se fez alusão e um novo estudo do FMI, no qual quatro técnicos apresentam resultados negativos de ajustamentos orçamentais em 17 países da OCDE entre 1978 e 2009: não apenas sustentam que a austeridade provoca mais desigualdade e desemprego de longo prazo como refutam também a ideia de que cortes na despesa pública são mais benignos do que aumentos de impostos. É que, como sabemos por experiência própria, estas novidades demoram a ser transmitidas ao Sr. Abebe Selassie.
2 comentários :
Há um inquietante silêncio por parte dos responsáveis do PS !!
Pois, caro Miguel Abrantes, mas, lá está, a pergunta recorrente: Portugal não é um protectorado, conforme o afirmado pelo N/ MNE, e por conseguinte, as instituições do N/ regime democrático ainda mandam alguma coisa??? E o Sr. Silva, parece-me que está mais preocupado com o que vai escrever nas memórias da Presidência da República, do que em exercer com efectividade o mandato para o qual foi eleito - infelizmente. Tamanho preço que os portugueses estão e irão pagar por não se ser capaz de reconhecer que Portugal bateu no fundo, ie, está falido, e que é preciso recomeçar do zero. Enfim...
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