domingo, março 02, 2014

A palavra aos leitores — CARTA DO CANADÁ

Fernanda Leitão enviou-nos mais um texto, no qual relata a passagem de Cavaco Silva pelo Canadá:

APONTAMENTO EM SÁBADO DE CARNAVAL


Se não fosse a RTP nem me apercebia que é Carnaval, tão ausente essa tradição está do Canadá inglês. Assim, tomei o pequeno almoço ao fim da manhã e de seguida fui ao cineminha do meu bairro ver O Filho de Deus, ontem estreado, confesso que curiosa de ver Diogo Morgado num filme sério de grande fôlego. Gostei, da interpretação dele e do filme. É natural, sou cristã, o filme sensibilizou-me. Mas se o não fosse, ninguém me poderia tirar a simpatia e o orgulho por um compatriota jovem que, a exemplo de milhares doutros, teve de rumar ao estrangeiro porque na Pátria os chamados poderes públicos são exercidos por gente ignara, bronca, tosca, que tem vindo a espezinhar tudo quanto lhe cheire a Cultura, a Ciência, a Pensamento. Oxalá todos os nossos jovens encontrem a sua hora de oportunidade no estrangeiro. Ao menos isso.

No dia anterior, o Presidente da República Portuguesa, que tem andado em viagem de pedir a colaboração dos empresários lusos emigrados, fez saber que queria homenagear a comunidade portuguesa de Toronto oferecendo-lhe, gratuitamente, um espectáculo musical no Elgin Theatre, para o qual convidou Nelly Furtado e António Zambujo. Antecedido de uma distribuição de medalhas e de um cocktail dentro do teatro. É claro que houve uma enchente. Tivesse o PR convocado a comunidade para um salão paroquial ou para um clube, invocando informações acerca da Pátria, que teria metade da plateia, no melhor dos casos, não porque os emigrantes não se preocupem com a Pátria, mas porque deixaram completamente de dar para o peditório dos políticos. Ora aqui se vê que o PR, embora perceba pouco de chefia do estado, é um mestre de marketing: sabe, de cor e salteado, como atrair público.

E agora imagine quem me lê quanto custou o aluguer dum teatro elegante, na baixa de Toronto, os cachets dos cantores e dos músicos, e o cocktail que, sendo à portuguesa, já se sabe que foi de fartazana. Se a festa fosse oferecida e paga pelo Sr. Aníbal Cavaco Silva, eu acharia esquisito depois de esse senhor ter choramingado através da comunicação social que a reforma não lhe dá para viver. Mas não ia além do achar esquisito, o problema era do Sr Aníbal e apenas dele. Agora, que fosse oferecido pelo PR quer dizer pago com dinheiros públicos, dinheiros de todos os contribuintes, incluindo os muitos emigrantes que pagam impostos em Portugal por ali terem propriedades ou receberem pensões de reforma, já é outra história. Os factos obrigam a dar razão aos que, na pouquíssima imprensa não vendida e nas redes sociais da internet, afirmam que a Presidência da República portuguesa fica mais cara aos portugueses do que a Casa Real aos espanhóis. Para não falarmos do triste espectáculo à Fidalgos da Casa Mourisca, falidos mas cheios de prosápia, que é toda esta tournée a pretexto de investimentos. Já o Portas também se farta de viajar com esta desculpa. Eu digo que é desculpa porque investimentos, viste-los por um óculo.

Houve condecorações. A Nelly Furtado foi condecorada, e muito bem, que é uma jovem talentosa, com carácter, que está a fazer uma carreira internacional importante. Mas também foi condecorado um sujeito que faz telhados, e isso acho mal porque há mais quem os faça e há mais tempo. E porque, quando lhe cheirou que estava em aflições financeiras o First Portuguese Club, o primeiro a organizar-se na comunidade aqui estabelecida desde 1953, o sujeito se apresentou como comprador afirmando, alto e bom som, que o fazia apenas para salvar o clube e prestar um serviço à comunidade. Comprou o casarão pelo preço da uva e depois, empurrou porta fora os idosos que ali tinham o seu centro de dia, e paulatinamente instalou um cabaré, mais ou menos isso. Cada um realiza os sonhos que tem e abre comércio no que gosta. O que me aborreceu nisso tudo foi que o busto de Camões, em bronze, ali ficou de porteiro, o triste coitado, perante a impotência apatetada dum cônsul que por cá passou a quem eu perguntei se não o afligia ver o poeta rebaixado àquele nível. Eu não considero decente um tipo destes receber uma condecoração.

Resumindo, para o caso de não terem compreendido o que sinto: comecei a penitência da Quaresma ainda no Carnaval.

8 comentários :

Anónimo disse...

Por mim, a penitência seria , comer cavaquinhos porque não são peixe nem carne!

Evaristo Ferreira disse...

Pois é, o presidente Cavaco deixou o país a jejuar, foi para terras de Manitoba, que tem por incumbente uma rainha dura como o aço, e anda entretido, não à caça da baleia ou de ursos pardos, mas a visitar portugueses que naqueles terras conseguiram chegar a empreendedores. Com que fim? Com a ideia de os repatriar, prometendo-lhes sucesso neste país depauperado? Ou será para esquecer o Carnaval de Loulé?
Fiquei surpreendido ao saber que entregou uma Comenda a um tal Zé do Telhado, um especialista em coberturas (sem telhas). Talvez seja por ter medalhas em saldo, ali no palacete de Belém.
Parabéns a Fernanda Leitão, por esta sua "reportagem presidencial". O Câmara Corporativa não podia ter arranjado melhor repórter para cobrir a viagem de Cavaco.

S. Bagonha disse...

"Comprou o casarão pelo preço da uva e depois, empurrou porta fora os idosos que ali tinham o seu centro de dia, e paulatinamente instalou um cabaré". E foi condecorado por cavaco. Bem, uma apostinha que se fosse o contrário, o homem ter comprado um casarão onde funcionava um cabaret e depois fazer daquilo um centro de dia, de certeza que nem tinha cheirado a medalhinha?

A. Leitão disse...

A Fernanda Leitao não é aquela jornalista reaça que se notabilizou em 75 nos jornais de extrema direita?

Miguel Abrantes disse...

Não encontro nada de "reacionário" no que escreve Fernanda Leitão.

A. Leitão disse...

Nem eu...

Fernanda Leitao disse...

Para A. Leitão

Ainda sou reacionária e serei até ao fim, reajo porque nas minhas veias não corre coca-cola. Corre sangue vivo, português. Em 1975, reagi frontalmemnte como aqueles milhares que se juntaram na Alameda, contra as avançadas ditatoriais do PCP por entender que era injusto e estúpido deixar que um grupo minoritário quisesse impor aos portugueses outra ditadura. O preço que paguei foi os coiotes desse partido, os que chamavam fascista a toda a gente, me porem o rótulo de extrema direita. O que, como estarão lembrados os da minha idade, era a cópia da cartilha seguida pelo regime salazarista: esse chamava comunista a quantos não concordassem com ele.
Que havemos de fazer? A democracia é um aprendizado que não acaba nunca.

ignatz disse...

há leitão, escreve-se com agá, né?