quarta-feira, junho 11, 2014

Salvar para destruir

• Hugo Mendes, Salvar para destruir:
    «1. Ao contrário da contribuição extraordinária de solidariedade, que é uma forma de fazer os pensionistas participarem num esforço no atual contexto de emergência, uma contribuição de sustentabilidade deveria responder a um problema de, precisamente, "sustentabilidade". Apesar de todos os dias ouvirmos que o sistema de pensões é "insustentável", não há, ao fim de 3 anos de governo, nenhum estudo que materialize esta ideia. Pelo contrário, as projeções disponíveis da Comissão Europeia mostram que o sistema português é, no universo da UE, um dos mais sustentáveis até 2060; e o FMI, no estudo de 2013 sobre despesa pública, não disputa a conclusão, afirmando que o problema reside no financiamento no curto prazo, mas não no longo, onde a questão da sustentabilidade se coloca. Naturalmente, as condições (desemprego, emigração, natalidade) degradaram-se desde 2010, quando as projeções foram feitas; mas é por esse motivo que nenhuma reforma do sistema pode avançar sem a atualização daquelas e o debate público que se exige.

    2. Segundo o DEO 2014-18, a contribuição de sustentabilidade valerá, em 2015, 370 milhões de euros (afinal, menos do que o encargo anual assumido por este governo com a integração das pensões da banca em 2011, superior a 500 milhões de euros). Mas se estão em causa 0,2% do PIB, era preferível deixar a economia respirar e o emprego recuperar: a receita em contribuições sociais estimada para 2014 está 1000 milhões de euros abaixo do obtido em 2008, e a despesa com subsídio de desemprego 1300 milhões de euros acima. Este governo devia seguir o conselho de Keynes: "Tome conta do desemprego, que o orçamento toma conta de si próprio".

    3. Por muito que o governo diga que a introdução da contribuição de sustentabilidade aumentará o rendimento dos pensionistas em 2015, não há forma de os enganar: ela configura um corte definitivo de pensões já atribuídas. Para além do imbróglio constitucional em que se mete, o governo quer "salvar" o sistema de pensões à custa da destruição de um dos seus mais preciosos ativos: a confiança dos atuais trabalhadores que o sistema respeita os seus direitos enquanto futuros pensionistas. A banca e as seguradoras agradecem este "incentivo"

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