sexta-feira, outubro 06, 2006

Para lá do Envelope 9

1. O José e eu temos estado a trocar pontos de vista sobre o inquérito ao Envelope 9. As duas posições estão suficientemente explicadas para que se justifique a continuação da conversa. Haveria, a partir de agora, uma repetição de argumentos. No entanto o José voltou a fazer um comentário a este post, que está disponível na caixa de comentários.

2. O apuramento de responsabilidades pela inclusão de elementos estranhos ao processo Casa Pia ficou decidido no dia em que o 24 Horas noticiou a existência do Envelope 9. Souto Moura, após se ter comprometido, de madrugada, com o ex-presidente da República a concluir um inquérito “a curtíssimo prazo”, emitiu, na tarde desse mesmo dia, um comunicado a assegurar à nação que o Ministério Público não era responsável pelo sucedido. Depois, poderia esperar-se o quê?

3. O ruído em torno do Envelope 9 não deve fazer esquecer um aspecto para o qual Pacheco Pereira chamava a atenção na Sábado de 28 de Setembro:

    ‘A revelação do 24 Horas acrescentava um elemento muito incómodo para o MP, a existência das listagens de telefonemas, que pelos vistos nos dizem agora se deve a um “erro” da PT e nunca foram abertas nem por polícias nem magistrados. Muito pouco verosímil (…). Os jornalistas conhecedores do processo não se limitam a informar que lá estavam estas listagens, mas que não são excepção a muito mais informação em caixotes, que também lá está e não deveria estar porque nada tem a ver com o processo mas com a pesca de arrasto justicialista.

3 comentários :

josé disse...

Caro Abrantes: tome lá resposta, de rajada e a rasar.

"Os jornalistas conhecedores do processo não se limitam a informar que lá estavam estas listagens, mas que não são excepção a muito mais informação em caixotes, que também lá está e não deveria estar porque nada tem a ver com o processo mas com a pesca de arrasto justicialista.’"

Ora bem. Já sabemos que o aspecto essencial da defesa em qualquer processo, é... defender os acusados.
Mas as regras quanto a essa defesa têm limites, na própria lei. Não vale tudo.
O que Pacheco Pereira diz abertamente em programas de grande audiência, é muito grave em termos de se poder efectivamente questionar a natureza da investigação criminal que se faz em Portugal e o modo como nesse processo concreto se efectuou a direcção pela autoridade judiciária competente no momento. Esta autoridade, não é apenas o MP ( o que o entendimento aparente de JPP parece não alcançar) mas também os juízes de instrução que intervieram. Quase todas as matérias sensíveis em termos de direitos liberdades e garantias, co-envolvem a responsabilidade de JIC´s.
Assim, o que se coloca abertamente em causa, nos programas da Quadratura e noutras sedes, é a correcção e a legalidade da própria investigação. É legitimo pôr em causa a investigação de um processo, no que se refere à sua correcção?
Sem dúvida! Mas, no tempo certo ou logo que se conheçam os motivos fundamentados para tal.
Será esse o caso que estamos a falar e será esse o caso da Quadratura de J.Pacheco Pereira?
Desconfio que não.
Em primeiro lugar, permito-me duvidar da súbita atenção que um processo concreto provoca em pessoa tão distante das práticas judiciárias. Mas, não pessoalizemos. As dúvidas, mesmo assim, permanecem.
Quando se diz e escreve que “ muito mais informação em caixotes, que também lá está e não deveria estar porque nada tem a ver com o processo mas com a pesca de arrasto justicialista.”, o que é que se pretende dizer, para além da bacorada continuada, com o nome mal empregue de “justicialismo”, aqui aplicado em vez de uma pretendida alusão aos “justiceiros”?
Pretende-se dar a ideia geral que se domina o assunto do que deveria ou não deveria lá estar. Dominará mesmo? E este domínio não deveria então ser melhor explicado, indicando concretamente o que é que efectivamente lá estará e porquê?
E quem é que dá estas notícias? São…”os jornalistas”! Que jornalistas? Quais são os nomes deles para que todos saibamos quem são os que assim duvidam da correcção das investigações, para além do que os advogados de defesa já disseram e fizeram em concreto nas peças processuais?

Entremos em aspectos mais técnicos:

Um processo , seja ele qual for, depois de entrar na fase de julgamento, passa a ser do domínio efectivo dos juízes do Tribunal. Só com requerimento ao juiz ( presidente se for colectivo), alguém lá vai mexer ou mexericar.
Por outro lado, enquanto se encontra pendente de julgamento, não poderá ser assim objecto de manuseio e devassa por quem quer que seja, acrescenco a isso o facto de eventualmente se encontrar ainda em segredo de justiça, por determinação de um juiz.
Pergunto:
Como é que se investiga a investigação realizada num determinado processo se este ainda não chegou ao fim e se este não pode ser livremente consultado por um eventual inspector de uma sindicância qualquer ou até mesmo de uma comissão de Inquérito na AR ( embora estas possam dentro de determinadas circunstâncias que no caso concreto nem me parece que se verifiquem)?
Faz- se uma investigação ad-hoc, assim "a modos que" para se definir responsabilidades também "em modo que" se adivinha, por ser já tão explícito para quem anda atento a estas coisas?

O BE e o PS não têm consultores jurídicos para dizerem aos comentadores da praxe para estarem calados, em vez de andarem a fazer estas figuras?
Quanto aos da Quadratura, estão desde já desculpados- não são do ramo e segundo tudo indica, querem pô-lo num lado enquanto vendem o vinho noutro… dando-se assim ares de sabidolas e vendendo portanto o seu peixe a bom preço e que é o de comentadores de luxo.
Não me parece que o sejam.

josé disse...

Quando se diz no postal que depois de o comunicado da PGR ter dito que o MP não era responsável pelo sucedido e ao perguntar-se "depois, poderia esperar-se o quê?", pode sempre dizer-se que depois das investigações realizadas, se poderia esperar que o tal comunicado de 13.1.2006 pudesse estar errado nas suas conclusões. Mas não estava...o que só prova que havia boa-fé na PGR, ao contrário do que o jornal apregoou.

O comunicado desse dia, é este:
Na edição de hoje do jornal “24 horas” foi publicada uma notícia, da autoria dos jornalistas Jorge Van Krieken e Joaquim Eduardo Oliveira, com o título na primeira página “Até os telefonemas de Sampaio foram investigados no processo Casa Pia”.
De acordo com essa notícia, o Ministério Público solicitou à PT e juntou aos autos facturação detalhada de números de telefones da rede fixa instalados em residências de vários titulares de órgãos de soberania e pessoas que detêm ou já detiveram elevados cargos públicos, integrando essa notícia uma listagem dos nomes dos titulares dos telefones em causa e do número de chamadas efectuadas através desses telefones.

A facturação em causa, ainda segundo a mesma notícia, estaria em cinco CD’s juntos aos autos, guardados no envelope nº. 9.

Tal notícia é falsa.
A publicação de notícias falsas traduz uma inaceitável violação do dever de informar com rigor, isenção e veracidade que impende sobre a generalidade dos meios de comunicação social, pelo que importa repor a verdade dos factos:

O envelope nº. 9, a que se reporta a notícia, contém 5 disquetes onde se encontra registada a facturação detalha de um único telefone fixo atribuído a um dos indivíduos constituídos arguidos no processo, o Dr. Paulo Pedroso.
Tal facturação detalhada foi solicitada à PT, por despacho do Ministério Público, a coberto de despacho do Juiz de Instrução Criminal competente, e reportava-se, exclusivamente, ao telefone fixo da pessoa indicada, a qual, à data, estava a ser investigada.

Não foi, em momento algum, pedida a facturação detalhada dos telefones instalados nas residências citadas das pessoas em causa, não existindo – nem podendo existir – no processo qualquer despacho a solicitar à operadora PT o envio desses elementos.

A divulgação destes factos reveste enorme gravidade, sendo completamente inadmissível que o Ministério Público e a investigação efectuada no âmbito do processo “Casa Pia” sejam, desta forma, postos em causa.

Cumpre finalmente reiterar que, mercê da notícia em foco, foi já ordenada a instauração de inquérito destinado a apurar responsabilidades pela origem, autoria e conteúdo de tal notícia.

Lisboa, 13 de Janeiro de 2006

josé disse...

"O envelope nº. 9, a que se reporta a notícia, contém 5 disquetes onde se encontra registada a facturação detalha de um único telefone fixo atribuído a um dos indivíduos constituídos arguidos no processo"

Esta passagem do comunicado, não estava correcta. Afinal, havia mesmo outros números de outros telefones.
Para colmatar esse erro, foi dado esclarecimento.
NO entanto, 8 de Março de 2006, foi dado conta do seguinte, pela PGR, em

NOTA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL

O Jornal “24 Horas” decidiu dar conhecimento público, no dia 13 de Janeiro, da existência, juntas ao “Processo Casa Pia”, de disquetes contendo a facturação detalhada do número de telefone de um ex-arguido do processo, facturação que mantinha agregada e ocultada uma das “contas Estado” que a PT também enviara, à data, aos investigadores. Tais disquetes estão no processo há anos, guardadas num envelope com o número nove, acessíveis a todos os sujeitos processuais, e nunca julgadores, acusação ou defesa nelas viram especial relevância para a defesa dos interesses que o estatuto processual de cada um lhes atribui.

A notícia de 13 de Janeiro não se limita a dar conta da existência da “conta Estado” agregada. Revela um trabalho de investigação jornalística para saber a quem pertencem certos números, aliás, na maioria confidenciais, o que implicou, inclusive, a realização de telefonemas confirmativos para a casa do utente. Também nela se adiantou, não se sabe com que base, que o “Ministério Público controlou 80 mil chamadas de todos os titulares dos órgãos de soberania feitas de números privados”, que “até os telefonemas de Sampaio foram investigados no processo Casa Pia”, e ainda que “Os telefones de casa do Presidente da República, do Primeiro Ministro, do Presidente da A.R., do Presidente do Tribunal Constitucional, do Presidente do Tribunal de Contas e todas as chamadas que fizeram durante um ano e meio foram analisadas pelo Ministério Público (...)”.

Estas passagens, para além do restante conteúdo da notícia, a terem fundamento, revelariam uma factualidade de grande gravidade que responsabiliza inapelavelmente o Ministério Público. A não terem qualquer razão de ser, estar-se-ia perante notícia que, de qualquer modo, atingiria a investigação do “processo Casa Pia” e a credibilidade do Ministério Público.

Na nota emitida por esta P.G.R. no mesmo dia 13 de Janeiro, logo se anunciou “a instauração de um inquérito destinado a apurar responsabilidades pela origem, autoria e conteúdo de tal notícia”. Trata-se de um inquérito crime de que se poderão extrair tanto consequências disciplinares como penais e que está em curso. Sua Excelência o Senhor Presidente da República Jorge Sampaio também se pronunciou no mesmo sentido, foi na primeira hora informado, e tem sido posto ao corrente do andamento do processo, como ainda ocorreu na semana passada. No entanto, as opiniões, os comentários e as críticas têm-se multiplicado, com base em inúmeras incorrecções.

Assim, cumpre afirmar que vigora entre nós o princípio da legalidade, nos termos do qual, numa investigação-crime não pode determinar-se, à partida, que uma parte dos factos com relevância criminal, ou ainda certas entidades, devam ser excluídas da investigação. Daí duas consequências: não é possível deixar de investigar jornalistas ou um jornal, só por serem jornalistas ou estar em causa um jornal, do mesmo modo que não poderá deixar de se investigar a conduta dos demais intervenientes na “questão do envelope nove”, para além do que respeitar directamente à actuação do “24 Horas”.

E é isso que tem vindo a ser feito.

Importa esclarecer que, quando a 15 de Fevereiro ocorreram buscas (no Código de Processo Penal não existe a palavra “rusga”), reputadas necessárias pelo titular do processo, e que tiveram lugar com total respeito pela lei que temos, haviam tido lugar já inúmeras diligências. De tal modo que, presentemente, o processo conta com três volumes, mais de quinhentas folhas e dezenas de pessoas ouvidas.

Aconteceu no entanto que, para corresponder a um natural pedido de brevidade, logo que o Procurador-Geral recolheu alguns elementos sobre o que se terá passado, disponibilizou-se a revelá-los publicamente na Assembleia da República, o que aconteceu no dia 20 de Janeiro. Numa atitude inédita, contra a opinião de vários sectores e durante cerca de quatro horas. Antes, havia já tido contactos com Sua Excelência o Presidente da República e Ministro da Justiça sobre o mesmo assunto.

Durante tal audição, na 1ª. Comissão da Assembleia da República, transmitida em directo pela televisão, e cujo conteúdo continua disponível, adiantaram-se já várias respostas a questões que, só por má-fé, continuam a ser formuladas na comunicação social.

Entretanto, estando marcada pelo M.mo Juiz de Instrução para o próximo dia 13, um exame a material apreendido, nunca poderia dar-se por encerrado o inquérito antes dessa data.

A lei faculta o prazo de oito meses para a fase processual em curso. Tal prazo não irá ser usado e do despacho final será dado conhecimento público, ao abrigo do nº.9 do artigo 86º. do Código de Processo Penal.



Lisboa, 08 de Março de 2006

O Gabinete de Imprensa

Ana Lima "