quarta-feira, dezembro 27, 2006

Comparações que doem (um post de… direito comparado) [1]




A comparação entre os sistemas processuais inglês e português causou uma dor aguda a alguns leitores do CC. Em resposta ao que eu escrevi antes sobre uma investigação rápida, discreta e bem sucedida das autoridades inglesas que indiciou um homem por cinco homicídios de jovens prostitutas, vieram os renitentes colocar estas objecções:

    1. Também na Inglaterra, foi divulgada a identidade dos responsáveis pela investigação;
    2. Na Inglaterra, o garantismo é muito menor e o suspeito foi encarcerado sem que lhe fosse prestada qualquer informação.

Estas duas objecções nada retiram ao que eu disse. Tal como se prevê em Portugal (cf. artigo 86.º, n.º 9, do Código de Processo Penal), também na Inglaterra é possível prestar esclarecimentos em casos de especial repercussão pública para evitar a perturbação da tranquilidade pública. Por isso, houve uma conferência de imprensa com os responsáveis pela investigação, que prestaram os esclarecimentos necessários.

O que não houve foi reportagens fotográficas em exclusivo, uma sucessão de entrevistas acerca dos gostos pessoais ou opiniões sobre a vida ou, pior do que isso, fugas para a comunicação social sobre a investigação.

A grande diferença é que, na Inglaterra, se não encontram diariamente nos jornais revelações sobre os processos ou sobre os responsáveis dos processos.

Em Portugal, infelizmente, aqueles que deveriam velar pelo segredo de justiça, magistrados e polícias, dedicam-se com afinco a violá-lo, para obter as boas graças da comunicação social. Em troca, alcançam os seus momentos de glória, que, para além de saciarem a sua vaidade pessoal e apaziguarem as suas frustrações de políticos não realizados, lhes permitem de forma pragmática lutar por lugares de destaque nas instituições e no aparelho de Estado.

Os jornalistas, no meio desta balbúrdia, são os menos culpados. A sua missão não é calar, como compete aos magistrados e polícias, mas, sim, revelar aquilo que está escondido. Aproveitam apenas a incontinência verbal e a ambição cega dos responsáveis pelos processos.

Os anónimos que reagiram ao meu post não desmentem este estado de coisas — como poderiam fazê-lo?

Para o desmentirem, teriam de me enviar, por exemplo, cópia de um tablóide inglês em que aparecesse um juiz enfiado numa capa de Super-homem, imitando aquelas cenas próprias de feira.

Para o desmentirem, teriam de me enviar uma crónica fotográfica da viagem da casa para o emprego de um magistrado.

Para o desmentirem, teriam de me enviar as fotografias de um responsável por um departamento de investigação abrindo o Código Penal e dizendo quais são as investigações a promover num processo complexo.

Para o desmentirem, teriam de me enviar uma entrevista em que uma assessora de imprensa acusasse o responsável máximo de uma magistratura de a mandar fazer telefonemas em off para os jornais, com o objectivo de manipular a mediatização de um processo.

Desconfio que os leitores anónimos em causa não me dariam este presente. Na Inglaterra, a investigação que eu referi foi discreta, célere e eficaz.

(continua)

8 comentários :

Portas e Travessas.sa disse...

A Inglaterra é um País organizado, hoje, porque na decada de 70, não o era, paulatinamente, os ingleses, a sua policia, controlam a ilha, o que não é facil, como se imagina.

Eu não percebo de leis, mas que as acho estranha, isso ainda percebo.

Não é concerteza com a teoria do coitadinho que se vai algum lado.

Há que preparar uma policia, como os ingleses fizeram para actuarno caso apontado como noutros.

A Policia de proximidade, a par da investigação, é dinheiro deitado á rua.

Cada vez vai ser pior.

Em vez de andarem preocupados em dar comendas aos Roquetes Amorins e companhia, deviam de dar a quem
zela pelo País

Não sei se alguma vez mudamos de agulha.

Chicago, Chicago

Anónimo disse...

"os jornalistas, no meio desta balbúrdia, são os menos culpados"

Deixe-me rir! Está na cara que não conhece a Inglaterra nem os jornais ingleses! Basta ver a forma como foi tratada a investigação do caso da Princesa Diana para compreender em que estado vai o segredo de Justiça nas ilhas de sua majestade.

Para além disso, por que não menciona as inúmeras situações em que os ADVOGADOS portugueses se dirigem aos jornais e televisões comentar processos em curso com o objectivo de se promoverem? Os nomes de João Nabais, Rogério Alves, José Maria Martins e tantos outros que se aproveitam de processos mediáticos com o intuito de saltar para a TV e de se auto-promoverem. O advogado João Nabais até em concursos televisivos participa e dá entrevistas a revistas cor-de-rosa. Largue a Magistratura!

Anónimo disse...

Meu caro Miguel Abrantes,as questões que coloca são verdadeiros testamentos do que se passa neste cantinho.
Todos aqueles que o contestam, so podem ser magistrados, juizes e jornalistas, grupo que compõe o triangula das vaidades, aliadas à incompetencia profissional.Os mais mediaticos, sabemos nós quem eles são.

Anónimo disse...

Sou o anónimo das Dez 27, 06:44:39 PM e não sou magistrado nem tenho quaisquer interesses na Magisratura.

Anónimo disse...

«magistrados e polícias, dedicam-se com afinco a violá-lo»
Linda escola, a desta gente.
E pelos vistos, sem ninguem acima, para lhes dar o devido correctivo - mudança de ramo, pex.
Nada a fazer.
Z

Anónimo disse...

Essa gente actua na, penumbra, icognita,subterranea e até subersivamente. são conhecidos, na giria policial,por sustentaculos. No meu entender, com mais uns abanões à "costa", passam a supranumerários

Anónimo disse...

Ora, seja qual for o sistema de responsabilidade encontrado para o exercício da governação pública, uma coisa é essencial aos governos – a autoridade, no sentido de possibilidade constitucional e efectiva de governar. E não pode crer-se que se chegou a boa solução quando os diferentes poderes funcionam de tal sorte que os governos ou não existem ou não governam: defendem-se.

Anónimo disse...

ó Melga:
Abana, abana que mais um bocado e estou a vir-me...