Mário Pinto, professor universitário e colunista regular do Público, já nos brindara, há 15 dias, com uma peça de antologia: há mulheres que abortam por “capricho, negócio, feitiço, vinganças, crueldades, tudo”. Ontem, voltou às páginas do Público para burlar o seu patrão. Em vez de cumprir o contrato, escrevendo, o professor da Católica copia laboriosamente as declarações de voto de vencido do Tribunal Constitucional.
É claro que Mário Pinto só copia o que lhe interessa. Como bom “democrata”, não lhe interessa a posição maioritária do Tribunal Constitucional. Interessa-lhe, sim, o conjunto de posições individuais expressas pelos juízes vencidos. Nestes, desde sensibilidades alegadamente mais à esquerda (Mário Torres) até sensibilidades marcadamente direitistas (Benjamim Rodrigues), perpassa uma mesma incompreensão. Lá no fundo, o que existe é uma concordância política com aquela afirmação de Aristóteles segundo a qual a mulher é um “animal impudens” (ou seja, para quem é posterior ao Vaticano II, o que não é o caso de Mário Pinto, um “animal sem vergonha”).
Nada de ilusões. Sem anticlericalismo, não nos esqueçamos que, em pleno Séc. XXI, a Igreja Católica continua a achar as mulheres indignas do sacerdócio. Para justificar tão anacrónica doutrina, a Igreja invoca o argumento histórico (Cristo só teve discípulos), esquecendo-se de que o argumento é mesmo histórico, e canta umas loas acerca do papel da mulher como mãe. Não nos enganemos. A Igreja é machista e profundamente discriminatória. O mundo da Igreja é dominado por homens e as mulheres servem para pôr flores no altar ou estar recolhidas em conventos. Muita coisa tem mudado, mas é necessário fazer um longo caminho para conseguir mudar as mentalidades. E Mário Pinto não é daqueles que, dentro da Igreja, ajudará a percorrer esse caminho.
Na generalidade das declarações de voto que Mário Pinto transcreve, há um ponto em comum: com mais ou menos confusão acerca do significado do artigo 142.º do Código Penal (na sua versão actual), todos os juízes vencidos pressupõem que é constitucional não punir um aborto nos casos das indicações terapêutica, criminológica e eugénica.
O que os juízes vencidos dizem é que a mera opção da mulher, durante as primeiras dez semanas de gravidez, não deve bastar para excluir a punição. A este argumento já respondeu muita gente. Por último, o ex-bastonário José Miguel Júdice, um católico mais arejado do que Mário Pinto, compreendeu o óbvio: se a lei permite que não seja punido o aborto no caso de gravidez resultante de violação, qualquer outra causa considerada ponderosa pela mulher deve ser considerada admissível. É que nada explicaria que um embrião ou um feto fosse sacrificado por algo que não fez (a violação por parte do pai) se estivesse em causa já um ser nascido.
Quando se consagra o método dos prazos, aquilo que se reconhece é que a maior juíza do conflito, na primeira fase da gravidez, é a própria mãe. A ninguém penaliza mais a morte do feto do que à sua mãe e é ela que tem uma posição de suporte de vida intra-uterina.
Nesse caso, ainda há um conflito entre a liberdade e a autonomia da mãe e a vida intra-uterina, na primeira fase da gestação.
Talvez estes argumentos sejam subtis de mais para o Professor Mário Pinto, ao qual a qualidade de professor universitário (especialista em quê?) não bafejou com especial profundidade científica.
Mas, para além da superficialidade da sua argumentação, fica uma pequena desonestidade teórica: Mário Pinto não quer elucidar-nos de que lado estava quando a lei de 1984 foi aprovada, criando situações de aborto não punível (as tais indicações terapêutica, criminológica e eugénica, a que agora canta loas através de seis gargantas alheias)?
Não sei porquê, mas tenho o palpite de que já nessa altura estava do lado errado. Estarei enganado? No caso de não estar, tem o Professor Mário Pinto uma obrigação: antes de transcrever votos de vencido, explique-nos por que razão mudou de opinião entre 1984 e 2007. Até para que, seguindo o seu conselho, não o ouçamos dizer daqui a vinte anos que é favor da despenalização da interrupção voluntária da gravidez praticada por opção da mulher durante as primeiras dez semanas, mas não mais do que isso…
[Publicado também no Sim no Referendo]
É claro que Mário Pinto só copia o que lhe interessa. Como bom “democrata”, não lhe interessa a posição maioritária do Tribunal Constitucional. Interessa-lhe, sim, o conjunto de posições individuais expressas pelos juízes vencidos. Nestes, desde sensibilidades alegadamente mais à esquerda (Mário Torres) até sensibilidades marcadamente direitistas (Benjamim Rodrigues), perpassa uma mesma incompreensão. Lá no fundo, o que existe é uma concordância política com aquela afirmação de Aristóteles segundo a qual a mulher é um “animal impudens” (ou seja, para quem é posterior ao Vaticano II, o que não é o caso de Mário Pinto, um “animal sem vergonha”).
Nada de ilusões. Sem anticlericalismo, não nos esqueçamos que, em pleno Séc. XXI, a Igreja Católica continua a achar as mulheres indignas do sacerdócio. Para justificar tão anacrónica doutrina, a Igreja invoca o argumento histórico (Cristo só teve discípulos), esquecendo-se de que o argumento é mesmo histórico, e canta umas loas acerca do papel da mulher como mãe. Não nos enganemos. A Igreja é machista e profundamente discriminatória. O mundo da Igreja é dominado por homens e as mulheres servem para pôr flores no altar ou estar recolhidas em conventos. Muita coisa tem mudado, mas é necessário fazer um longo caminho para conseguir mudar as mentalidades. E Mário Pinto não é daqueles que, dentro da Igreja, ajudará a percorrer esse caminho.
Na generalidade das declarações de voto que Mário Pinto transcreve, há um ponto em comum: com mais ou menos confusão acerca do significado do artigo 142.º do Código Penal (na sua versão actual), todos os juízes vencidos pressupõem que é constitucional não punir um aborto nos casos das indicações terapêutica, criminológica e eugénica.
O que os juízes vencidos dizem é que a mera opção da mulher, durante as primeiras dez semanas de gravidez, não deve bastar para excluir a punição. A este argumento já respondeu muita gente. Por último, o ex-bastonário José Miguel Júdice, um católico mais arejado do que Mário Pinto, compreendeu o óbvio: se a lei permite que não seja punido o aborto no caso de gravidez resultante de violação, qualquer outra causa considerada ponderosa pela mulher deve ser considerada admissível. É que nada explicaria que um embrião ou um feto fosse sacrificado por algo que não fez (a violação por parte do pai) se estivesse em causa já um ser nascido.
Quando se consagra o método dos prazos, aquilo que se reconhece é que a maior juíza do conflito, na primeira fase da gravidez, é a própria mãe. A ninguém penaliza mais a morte do feto do que à sua mãe e é ela que tem uma posição de suporte de vida intra-uterina.
Nesse caso, ainda há um conflito entre a liberdade e a autonomia da mãe e a vida intra-uterina, na primeira fase da gestação.
Talvez estes argumentos sejam subtis de mais para o Professor Mário Pinto, ao qual a qualidade de professor universitário (especialista em quê?) não bafejou com especial profundidade científica.
Mas, para além da superficialidade da sua argumentação, fica uma pequena desonestidade teórica: Mário Pinto não quer elucidar-nos de que lado estava quando a lei de 1984 foi aprovada, criando situações de aborto não punível (as tais indicações terapêutica, criminológica e eugénica, a que agora canta loas através de seis gargantas alheias)?
Não sei porquê, mas tenho o palpite de que já nessa altura estava do lado errado. Estarei enganado? No caso de não estar, tem o Professor Mário Pinto uma obrigação: antes de transcrever votos de vencido, explique-nos por que razão mudou de opinião entre 1984 e 2007. Até para que, seguindo o seu conselho, não o ouçamos dizer daqui a vinte anos que é favor da despenalização da interrupção voluntária da gravidez praticada por opção da mulher durante as primeiras dez semanas, mas não mais do que isso…
[Publicado também no Sim no Referendo]
6 comentários :
Muito bom ao autor - descasca e da grossa.
Quanto á especialidade do prof, claro esta como agua, é da "juba de Leão" ao que dizem fortalece as raízes do couro cabeludo.
A grande Miguel, esta é de mestre. Continua, vais no bom caminho. Surra nestes marionetes de língua fácil, mas de paupérrima sabedoria..
M.Abrantes, por acaso já leu Vitor Dias seu camarada político tal como Vital Moreira? É que em matéria de plágio...É difícil gerir a informação e pensar por si próprio mas essa é a parte mais estimulante quando se colocam os neurónios a funcionar!MAs a inteligência e o bom-senso não se adquirem nos bancos da escola e essa é que é a "porra" da questão!O Vital M. no " Contra Informação"esqueceu-se que estava a falar para gente que o conhece de "ginjeira". Esqueceu-se que falava para portugueses que ainda não perdoaram ao PC e filiados, o que fizeram a Portugal e aos portugueses e que quanto houver memória a história indicará quem são os traidores da nação!
Ó Abrantes:
Fico pasmado como tu sabes de tudo.
Até da Igreja Católica!!!
És o meu ídolo.
Mas olha, uma das diferenças entre a Igreja Católica e outras Igrejas cristãs é precisamente o lugar de relevo dado à mãe de Cristo, em relação à qual existem três dos mais importantes dogmas católicos: ser mãe de Deus, a sua imaculada conceição e a assunção ao Céu.
Desconheço, aliás, de entre as mais importantes religiões monoteístas, igual relevo dado à mulher.
Incluindo a religião da judiairia internacional que monopoliza os "igualitários" meios de comunicação mundial.
judiaria internacional
Então e a Mafalda ainda não acabou as aulas?!
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