"(…) Eu era um miúdo, ainda na Faculdade, quando fui trabalhar para a Comissão de Extinção da PIDE, para supostamente ajudar a organizar a investigação de processos-crime contra os pides. Consultando os dossiês desse miserável mundo policial, rapidamente percebi que a PIDE guardava as escutas para muito mais do que acusar em Tribunal Plenário as suas vítimas do nefando crime de serem contra o regime. As escutas arquivadas continham também abundante matéria que apenas tinha que ver com a vida pessoal e íntima dos opositores do regime, e cujo conhecimento seria mais tarde utilizado para telefonemas anónimos a denunciar infidelidades conjugais e coisas do género. Criei logo aí uma definitiva repulsa por essa actividade nojenta que consiste em escutar conversas alheias. Claro que, infelizmente, tenho de aceitar que, num tempo de terrorismo e crime altamente organizado e sofisticado, as escutas policiais se tornaram um mal necessário para evitar males bem maiores. Mas não sejamos hipócritas: continua a tratar-se de um trabalho sujo.
O mal está, assim, em quando essa actividade deixa de ser excepcional e dirigida à investigação de crimes excepcionais, quando deixa de ter como finalidade primeira a recolha de indícios e a confirmação de suspeitas, que depois terão de ser mais bem investigadas e completadas por outras provas, e se transforma numa actividade rotineira e, em muitos casos, no único e confortável meio de prova. E, pior ainda, quando, como vem sendo habitual, havendo sérias dúvidas de que essa única prova recolhida possa assegurar vencimento em tribunal, se fomenta a ‘fuga’ do conteúdo das escutas para os jornais, a fim de conseguir uma condenação popular, em lugar de uma condenação judicial. Quase todos os chamados ‘casos mediáticos’ vividos entre nós recentemente são exemplos flagrantes desta prática perversa e que já entrou, sem escrutínio deontológico, nos hábitos policiais e nos hábitos jornalísticos. Há dias, a propósito do ‘caso McCann’, um jornal inglês concluía, espantado e cheio de razão, que, em Portugal, a polícia continuava, como há cem anos, a procurar e valorizar, acima de tudo, a auto-incriminação do suspeito: ou por confissão (espontânea ou ‘forçada’), ou por escuta telefónica. Uma vez isso conseguido, dispensa-se de investigar mais o que quer que seja. Quando se descobriu que, por engano ou por excesso de zelo, até o Presidente da República foi escutado no ‘caso Casa Pia’, o anterior procurador veio afirmar candidamente que “não haveria mais” do que sete ou oito mil escutados habitualmente - como se fosse pouco! Para mais, lavra a suspeita consistente de que, ao contrário do que reza a lei, as escutas nunca são levadas ao juiz de instrução num prazo razoável, que estes não têm tempo para perder horas e horas a ouvir gravações e que aquilo que não interessa para a instrução não é imediatamente destruído. Vivemos, como todos sabem, sob a lei do faz-de-conta. São escutados inocentes e culpados - talvez cinco inocentes por cada culpado; são enviadas para os jornais todas as escutas que interessa divulgar; e são mantidas ou divulgadas partes de escutas sobre assuntos que nada têm que ver com o que se investiga. Defender que isto continue assim é preconizar a continuação de dois males: a devassa da vida íntima de cada um como prática aceitável e habitual; e a incompetência investigatória como fatalidade a estimular. Muito gostaria de saber o que pensariam os defensores desta “liberdade de informação” no dia em que acordassem e lessem a transcrição de uma sua conversa nos jornais, sem que fossem suspeitos de crime algum: apenas o ‘crime’ de serem suspeitos pelo facto de terem sido escutados." [Reproduzido d’O Jumento]
sábado, setembro 08, 2007
Sugestão de leitura
Miguel Sousa Tavares escreve no Expresso sobre "ESCUTAS, SEGURANÇAS E FANTASMAS". Eis um extracto:
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9 comentários :
"Quando se descobriu que, por engano ou por excesso de zelo, até o Presidente da República foi escutado no ‘caso Casa Pia’"
Eu tipo que diz tamanha mentira merece ser citado?
Vai dormir, Miguel.
Concordo com a defesa do Miguel S. Tavares, mas só em parte. Uma coisa é a divulgação de escutas durante o andamento do processo. Diferente é a publicação das escutas que serviram de prova no processo, após trânsito em julgado. Com a conclusão do processo,não há justificação para que a publicação das escutas utilizadas como prova, só possa ocorrer com o consentimento das pessoas escutadas. Qual a razão de um tratamento diferente destas provas de outras provas, como por exemplo, um carta?
Será inocente esta atitude legislativa?
Esta mentirola básica, já desmentida na altura e durante o inquérito parlamentar, continua a ser propalada por este comentador de meia tijela.
Que mais se pode esperar de um sabichão deste calibre?
Ouve ALGUMA escuta ao PR Sampaio?
Não digam disparates.
Completamente de acordo com os pontos de vista do MST.
O Miguel Sousa Tavares, pelos vistos, é uma grande sumidade.
Segundo o própio, "era um miúdo, ainda na Faculdade, quando (foi) trabalhar para a Comissão de Extinção da PIDE".
E não foi apenas ver lá gajas ou fazer companhia ai pai.
Foi "para supostamente ajudar a organizar a investigação de processos-crime contra os pides".
Granda cachola a deste gajo.
Não admira que agora se dedique a fazer comentários basicamente sobre tudo.
Até com a MENTIRA sobre escutas a Jorge Sampaio?
O problema q MST fala é este mesmo!
Os comentários deveriam ser sobre o que ele escreveu e não sobre apreciações acerca da sua pessoa e do sitio onde trabalhava e a fazer o quê! Eu concordo com o MST! Concordo com esta lei!
Se as pessoas são culpadas e as escutas foram escutadas em tribunal e pq são importantes e decisivas, devem ser publicadas, como serão sem qq consequência!
Se não foram ouvidas no processo ou se a pessoa não foi condenada, não têm nada de publicar as escutas!
É pena que continuem a concordar com um tipo que repete sucessivas vezes uma mentira, se calhar sem se aperceber (a falta que fazem os revisores de textos). A mim, aldrabões e mentirosos, só me dão asco.
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