terça-feira, outubro 16, 2007

Novas trapalhadas de velhos foliões – a “nova constituição” [3]

Paulo Mota Pinto, ex-juiz do Tribunal Constitucional e militante do PSD, também se insurge contra a “nova constituição” de Menezes, que até agora era apenas defendida nas páginas de O Diabo por Alberto João Jardim.

Depois de recordar que uma simples consulta da jurisprudência constitucional ajudaria a verificar que os tais «resultados de sete-seis, seis-sete” são pouco frequentes», Mota Pinto sublinha que é “bem sabido que uma das marcas características do "terceiro-mundismo" político está na atracção dos apelos a rupturas ou "experimentalismos" constitucionais, em substituição das alterações graduais e pontuais que se justifiquem e, sobretudo, do estudo e do debate de propostas concretas e realistas para a "política quotidiana".»

Aqui se reproduz o artigo de opinião de Mota Pinto, saído no Público, que se intitula Um Tribunal “sulista, elitista e liberal”?:

    «No encerramento do XXX congresso do PSD, o líder recém-eleito defendeu mudanças no Tribunal Constitucional (TC) considerando que ser este conhecido "por resultados de sete-seis, seis-sete, de acordo com a maioria parlamentar que está em funções, não prestigia aquilo que é a fiscalização da democracia".

    E acrescentou não ter "receio de acreditar que com uma discussão nacional ampla, que numa secção especial do Supremo Tribunal de Justiça, com magistrados profissionais possa ser avaliada de forma mais isenta, permanentemente isenta, a constitucionalidade das leis em Portugal".

    Não tivessem sido proferidas pelo presidente do maior partido da oposição, e estas afirmações não teriam importância de maior. Todavia, foram-no, e não podem deixar de ser repudiadas por quem preze o nosso modelo de justiça constitucional, ou modelos análogos adoptados em muitos países do continente europeu (e não só) cuja estabilização democrática se verificou na segunda metade do século passado.

    É patente para quem seja minimamente conhecedor da actividade do TC, por exemplo durante a última década, a falsidade da afirmação implícita de que nele se verificam tendencialmente "resultados de sete-seis, seis-sete, de acordo com a maioria parlamentar que está em funções".

    Certamente, se assim fosse, tal não prestigiaria "aquilo que é a fiscalização da democracia". Sucede, porém, que não é, e teria bastado uma rápida consulta à jurisprudência constitucional disponível no sítio do Tribunal, para, mesmo sem estudo exaustivo, se ter de concluir pelo contrário: tais "resultados de sete-seis, seis-sete" são pouco frequentes, menos ainda se podendo dizer que variam "de acordo com a maioria parlamentar que está em funções", e sendo, por exemplo, inexistentes em processos directamente relativos a partidos políticos, como os das respectivas contas.

    Independentemente disto, é, porém, logo a utilização de uma pretensa tendência nos resultados das "votações", para um "julgamento sumário" do TC, e com ele de modelos semelhantes existentes, por exemplo, em Itália, em Espanha, na Alemanha (apenas para referir alguns países mais próximos do nosso), etc, que denota o mais grave: a incompreensão da especificidade da formação da vontade decisória na jurisdição constitucional, a qual é baseada em razões, numa fundamentação que vale pela sua substância e não é redutível ao "rolo compressor" da maioria, ou a um resultado análogo ao... desportivo ("sete a seis", "cento e vinte e dois a setenta e cinco", etc).

    Por mais que se pretenda reduzir a tal perspectiva a actividade da Assembleia da República (o que também é errado numa "democracia deliberativa", em que a vontade política se deve formar com base nas razões carreadas ao debate parlamentar), ela é incorrecta para o Tribunal Constitucional.

    Reconhece-se que este, como todos os árbitros (no caso, da constitucionalidade) e muitos tribunais, nem sempre tem boa imprensa, sendo a sua imagem muitas vezes moldada pela errada aplicação às suas decisões da linguagem de análise parlamentar.

    É, porém, de estranhar que nessa falsa ideia simples alinhem tão facilmente dirigentes máximos de partidos com responsabilidades importantes no nosso desenho e prática institucional. E é até, sem dúvida, contraditório com a tendência registada nas revisões da Constituição e da Lei do Tribunal Constitucional, de sobrecarregar crescentemente este com funções alheias ao estrito controlo da constitucionalidade, próprias de um "terceiro imparcial" também em relação à actividade política - o caso, por exemplo, das funções de depositário de declarações de património e rendimentos de titulares de cargos políticos, de fiscalizador (mediante entidade própria que funciona junto do TC) e julgador das contas dos partidos políticos, de última instância em contencioso eleitoral e de garante último da democracia interna dos partidos políticos (competência esta, como se sabe ainda recentemente invocada na disputa eleitoral interna no PSD).

    Não significa isto, certamente, que se não possa pensar em mudanças na configuração do Tribunal, quer quanto ao seu enquadramento e à forma de designação dos seus membros, quer, por exemplo, quanto à sua localização geográfica.

    Na "discussão nacional ampla" que as teria de preceder não deve, porém, esquecer-se: que o actual TC já contém, por imposição constitucional, "magistrados profissionais", num mínimo de seis em treze, constituindo hoje até a maioria dos juízes em funções; que na grande maioria dos países mais próximos do nosso existe um órgão jurisdicional como o TC, e que é necessário que a pluralidade das mundividências existente em cada momento se reflicta na interpretação da Constituição, o que dificilmente aconteceria com o controlo da constitucionalidade por um Supremo Tribunal, hoje como no período posterior ao 25 de Abril (e quer este fosse o Supremo Tribunal de Justiça, quer o Supremo Tribunal Administrativo); e que propostas de alteração de instituições relevantes do nosso sistema constitucional não devem ser usadas sobretudo para encher agendas "rupturistas", de duvidosa viabilidade e mérito.

    É, aliás, bem sabido que uma das marcas características do "terceiro-mundismo" político está na atracção dos apelos a rupturas ou "experimentalismos" constitucionais, em substituição das alterações graduais e pontuais que se justifiquem e, sobretudo, do estudo e do debate de propostas concretas e realistas para a "política quotidiana".

3 comentários :

Anónimo disse...

Isto não so é o reeditar das trapalhadas da São Caetano, como demonstra algo mais grave - o homem não tem uma ideia para Portugal, começo a questionar se ele chega a 2009, com a má moeda que ele arrasta - ainda por cima esperar 20m pelo chefe da espuma? - nada de novo na São caetano

Ze Boné

Anónimo disse...

As teses de Menezes sobre (ou melhor, contra) o Tribunal Constitucional são uma autêntica ameaça contra a democracia. É gravíssimo que um dos dois maiores partidos portugueses seja liderado por um indivíduo destes.

Anónimo disse...

Há que se reformar essa constituição comunista cheia de ranço do 25 de Abril (um país no qual o PCP FESTEJA o aniversário da Constituição só pode estar fadado ao fracasso e ao atraso. Quando vi isso na TV levei um susto – estava tudo explicado), mas realmente acabar com o Tribunal Constitucional, não pode ser.

Tem que se dar um fim ao 25 de Abril. Há que se mudar a constituição e parar de se comemorar o 25 de Abril. Não faz sentido. É menos um dia de trabalho.


Edie Falco