Quando o vice-presidente Borges abre a boca, o PSD constipa-se

Manuela Ferreira Leite foi muito cautelosa nas directas do PSD. Raramente abriu o jogo. E quando o fez, o objectivo parece ter sido o de dar caneladas aos adversários na corrida pela liderança e não o de revelar as suas posições. Aconteceu isso relativamente à anunciada privatização da Caixa Geral de Depósitos (CGD) defendida por Passos Coelho:

“A CGD em teoria pode ser privatizada. Mas neste momento, a CGD dá lucros ao Estado e a ser vendida seria por compradores estrangeiros. Sugerir a sua venda é não ter a mínima das sensibilidades para o que significa a Caixa para o nosso tecido familiar. Seria um erro político sem dimensão, num país em que existe enorme insegurança, em que a ideia de uma instituição pública e portuguesa ainda atrai e dá confiança a muitas das pequenas e médias poupanças.”

Tendo Ferreira Leite qualificado a proposta de privatização da CGD como “um erro político sem dimensão”, que se esperaria que António Borges respondesse quando questionado acerca do assunto? O vice-presidente do PSD dispara mais rápido do que a sua própria sombra: “Não há razão nenhuma para que o maior banco português pertença ao Estado.”

Segundo o Diário Económico de hoje, o PSD está em pé de guerra por causa das declarações de Borges sobre a CGD:

Mas divergências quanto à CGD são apenas um exemplo de várias outras divergências em relação às posições do novo PSD — que, no caso de Santana ou Menezes, teriam sido exploradas até à medula. Na entrevista ao Diário Económico, o vice-presidente do PSD, qual elefante numa loja de porcelanas, faz em fanicos a imagem do partido cuidadosamente cerzida pelos Pachecos.

Mas há outra razão pela qual vale a pena ler a entrevista de António Borges. Para nos apercebermos da arrogância com que olha para o país:

“Viajo bastante mas não é muito diferente do que sempre foi a minha vida, fora os três anos em que estive no Banco de Portugal. De resto estive sempre mais fora do que cá. E isso tem uma enormíssima vantagem, que é a de não estar completamente dominado por um pais que está voltado para dentro.”

E é esta arrogância que permite ao vice-presidente do PSD dizer, sem pestanejar, que não tem “a mais pequena dúvida” de que há “um clima de medo” por parte “dos empresários que têm receio de perder negócio”. Ele que andou a pedir ao então primeiro-ministro Santana que lhe desse um jeitinho nos negócios da Goldman Sachs, porque sem isso não singrava na vida. Como veio a acontecer, infelizmente.