Talvez um defeito de Isabel Moreira, que a tese de mestrado certamente não dissipou, seja ter algumas ideias fixas. Cismou que a ingerência se esgota quando são ordenadas as escutas e que o acesso ao resultado das escutas já não é ingerência. De novo, Isabel, qual é o fundamento desta sua interpretação? É que repetir essa afirmação até ao cansaço não a transforma em argumento. Continua a ser sempre, e só, uma afirmação não demonstrada.
Por outro lado, Isabel Moreira insiste na ponderação. Também sei o que é o princípio da concordância prática entre direitos fundamentais e outros interesses constitucionais contrapostos. Sucede que, neste caso em particular, o artigo 34.º, n.º 4, da Constituição intencionalmente quis retirar esta matéria do âmbito da ponderação, ao proibir — directa e expressamente — qualquer ingerência nas comunicações privadas, salvo nos termos e para efeitos de um processo criminal.
Portanto, não se trata apenas de uma matéria de intimidade da vida privada, a aferir em contraponto a outros valores constitucionais. Trata-se de uma ingerência que a Constituição, a priori, limitou ao âmbito do processo penal, vedando-a para qualquer outro efeito. A protecção das comunicações ficou assim blindada, fora do âmbito da ponderação.
De resto, admitindo que essa ponderação era possível, quem a faria? A própria comissão parlamentar, à luz dos seus critérios políticos e com sujeição à vontade das conjunturais maiorias partidárias? Isso seria colocar os direitos fundamentais na mão das maiorias de cada momento e ao sabor da luta político-partidária, quando, bem pelo contrário, e como a própria Isabel Moreira costuma invocar, os direitos fundamentais têm uma vocação anti-maioritária e estão acima do combate político-partidário.
Passemos agora à frente, porque Mota Amaral já decidiu.
5 comentários :
A ingerência existe durante todo o processo, e que vai desde a autorização à utilização e destruição. É assim que o código as (escutas) disciplina. É de facto preocupante dizer-se que, no âmbito das escutas, a utilização não é ingerência.
Caro Migul,
Mais claro do que você aqui deixa dito...só: OMO + OMO lava mais branco.
A clareza, hoje em dia, é um bem tão escasso, que me deixo surpreender por tamanha evidência argumentativa.
Não quero entrar em polémica para a qual não tenho qualquer competência critica, mas agradeço-lhe a luminosidade e o pragmatismo.
Parece que até o "homem" da marmeleira já entendeu.
Abraço,
J. Albergaria
A Isabel complica um bocado a questão mas, na verdade, não existe uma divergência de fundo entre as vossas interpretações!! Apenas de forma!!! Ás vezes o envolvimento académico distorce a questões, complicando-as. E o distanciamento de análise por vezes simplifica demais!!!! Embora no presente caso me pareça que a distorção resulta da demasiada proximidade!!!
Cumprimentos,,
Sousa Mendes
Eu, por mim,já pensei em tirar um dia de férias (ou dois?) para ir a correr imenso, ler a "tese de mestrado" da dona Isabel. É já a seguir...
A modéstia da dra Isabel Moreira é certamente uma das suas melhores virtudes.
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