terça-feira, julho 20, 2010

Dinamite Constitucional [5]

A moção de censura (des)construtiva: o PSD anda a tentar fazer passar a ideia de que consagra a moção de censura construtiva no seu projecto de revisão constitucional. E, de facto, até utiliza a expressão. Só que este é mais um caso em que o nome não coincide com a coisa. Veja-se:

A moção de censura construtiva é uma figura — que não se encontra consagrada na nossa Constituição, embora tenha sido proposta e/ou sugerida em sucessivas revisões constitucionais, sempre sem sucesso — que visa reforçar a estabilidade governativa, dificultando a possibilidade de derrube parlamentar de governos minoritários. De acordo com esta figura, os partidos da oposição só poderiam derrubar o Governo em funções se estivessem preparados para apresentar (e suportar politicamente) uma solução alternativa de Governo.

Ora, o que o PSD agora propõe é uma coisa completamente diferente. Para já, ao invés de condicionar a possibilidade de apresentação de moções de censura à construção de um Governo alternativo, consagra duas modalidades distintas de censura: a censura simples e a censura construtiva. Só aqui, ao criar estas duas vias em paralelo, está a alargar e não a restringir as possibilidades de derrube de Governos minoritários — o que vai contra o espírito e os objectivos supostamente em causa.

Mas é pior ainda: é que, ao contrário do que actualmente acontece, a aprovação da moção (dita) simples passa a implicar obrigatória e necessariamente a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições legislativas.

Ou seja, a oposição passa a poder, em alternativa: substituir o Governo em funções por outro; ou convocar novas eleições. Em vez de se reforçar a estabilidade governativa, cria-se é uma enorme instabilidade governativa, em que os Governos minoritários ficam completamente à mercê da oposição que, a todo o momento e consoante as conveniências de ocasião, pode provocar uma crise política, sem qualquer possibilidade de intermediação ou arbitramento do Presidente da República.

Actualmente, derrubado o Governo, o Presidente tem ainda a possibilidade de encontrar outras soluções governativas no quadro da mesma composição parlamentar. De futuro, deixaria de assim ser: mal os partidos da oposição quisessem, convocariam eleições.

Assim configurada, portanto, a moção de censura não é construtiva, é hiper-destrutiva, porque não restringe, antes aumenta as hipóteses de derrube do Governo por parte da oposição: a oposição poderia, à sua livre escolha, nomear novo Governo no mesmo quadro parlamentar ou, assim que lhe fosse conveniente, convocar novas eleições. E tudo isto sem que o Presidente fosse tido nem achado…

[A continuar]

1 comentário :

Mário disse...

Isto é mesmo um projecto de revisão feito por um monárquico! Faz-se uma tal embrulhada com PR, AR e Governo, descredibilizando os orgaos de soberania da Republica, para que isto pareça mesmo «uma república», com todos a gritar: Aqui-del-rei!
Quem é que não tinha topado a coisa...