terça-feira, maio 31, 2011

A imprevisibilidade e instabilidade

• Vital Moreira, Troca de posições [hoje no Público]:
    ‘A frase de Paulo Portas, há dias, segundo a qual o CDS se encontra agora mais à esquerda do que o PSD nunca poderia ter sido proferida até agora sem ser tomada como simples boutade política O que a tornou inesperadamente credível não foi nenhuma deslocação do primeiro para a esquerda mas sim uma notória deriva do segundo para a direita. Quais são as implicações desta transfiguração política?

    (…) Tudo mudou com a chegada da Passos Coelho à liderança do PSD. Embora os sinais viessem de trás designada mente desde a proposta de Marques Mendes, há uns seis anos, de privatização substancial do sistema de pensões foi com o atual líder que apareceu uma agenda caracterizadamente neoliberal na esfera social e não somente na esfera económica. Desde o polémico projeto de revisão constitucional de há um ano até ao presente programa eleitoral em vista das eleições de 5 de Junho, tornaram-se claros os contornos da ofensiva laranja contra o “acquis social” pós revolução de 1975. Dela fazem parte, entre outros aspetos, o estabelecimento de um teto nas contribuições para o sistema público de pensões, desviando o resto para fundos de pensões privados a redução do SNS a um programa básico de cuidados de saúde, lançando o resto no mercado, ao mesmo tempo que se propõe a chamada liberdade de opção entre o sistema público e o privado, à custa do orçamento, o mesmo se propondo para o ensino, que seria rapidamente privatizado a expensas do Estado.

    Quando o líder do PSD se permite dizer, aliás sem receio de contestação, que o seu programa eleitoral é bem mais radical do que o programa da troika, ele não quer referir-se somente às medidas de ajustamento orçamental e financeiro mas também ao programa de privatizações e, bem entendido, à referida reconfiguração dos três pilares básicos do Estado social que são a educação a saúde e a segurança social. O PSD conseguiu o que desde o verão de 2010 era o seu objetivo prioritário, ou seja, fazer tudo para forçar o pedido de ajuda externa, para depois utilizar as condições políticas daquela para alavancar uma ofensiva em forma contra o nosso Estado social. Antes de combater a crise orçamental, o PSD está sobretudo interessado em servir se dela para acionar o seu próprio programa económico, social e ideológico.

    Como se não bastasse o fundamentalismo liberal em matéria económica e social, o líder do PSD resolveu inesperadamente juntar uma dose de reacionarismo ideológico, ao ensaiar um despudorado flirt com a cruzada da direita católica contra a despenalização do aborto. (…)

    Ao ultrapassar o CDS pela direita, o qual adotou posições menos aventureiras e mais prudentes em qualquer dos referidos domínios, o PSD não questiona somente a dimensão social e o liberalismo moderado da sua herança política e doutrinária, por mais indefinida que esta fosse. Reposiciona-se também no nosso espectro político-partidário, baralhando as tradicionais fidelidades ideológicas e sociológicas Decididamente, o nosso sistema político não precisava de mais este fator de imprevisibilidade e de instabilidade…’

1 comentário :

Ana Paula Fitas disse...

Caro Miguel,
Faço link.
Obrigado.
Abraço.