- ‘Há prioridades na perseguição penal? Só uma sociedade sem hierarquia de valores pode dar resposta negativa. A Constituição e a lei, apesar de basearem a atividade das magistraturas e das polícias no princípio da legalidade, estabelecem uma escala de crimes e penas que revela que há bens cuja proteção é prioritária, como a vida, a integridade ou a liberdade.
Por outro lado, se não forem consagradas pela lei, segundo critérios de interesse comum, e aceitáveis com um amplo consenso, as prioridades acabarão por ser estabelecidas, na prática,de modo informal. Nesse caso, as prioridades serão ditadas por rotinas, interesses profissionais ou estímulos exteriores, como a influência política ou a repercussão mediática.
Porém, tal definição de critérios, alheia a uma lei democrática de política criminal, é ilegítima. Na verdade, não podem ser os interesses particulares a definir as prioridades da política criminal ou o modo de atuação das autoridades penais. Se isso acontecer, pode concluir-se que uma função do Estado terá sido tomada por interesses que lhe são estranhos.
No passado, por exemplo, os crimes de maus tratos e violência doméstica, abuso sexual, corrupção e ambientais não constituíam prioridades da política criminal, sendo até tolerados pela sociedade e pelo poder político. Hoje, pelo contrário, reconhece-se consensualmente que eles põem em causa valores essenciais do Estado de Direito democrático.’
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