• Rui Pereira, Desejo e realidade:
- ‘Temos de reconhecer que o "processo de empobrecimento em curso" está a decorrer com celeridade, mas sem fim à vista. Por que anunciou, então, Passos Coelho (falando como líder partidário, mas pressupondo o cargo de Estado) o início do fim da crise? Decerto pretendeu insuflar optimismo num país cada vez mais deprimido e, provavelmente, já terá sido contagiado por um fenómeno característico dos pequenos grupos radicais, que acaba por atingir os partidos do "arco da governabilidade" nas horas mais difíceis – confundir os desejos com a realidade.
Confundir os desejos com a realidade é uma forma de violação da "Lei de Hume", que está na base do moderno conceito de Ciência (incluindo, claro está, a Ciência Política). Segundo essa lei, não é legítimo deduzir argumentos de dever ser de afirmações de ser, e vice-versa. Assim, não podemos prever que a recessão vai acabar apenas porque ela "deve" acabar, ou seja, porque é bom que acabe. Do dever ser só podemos inferir um programa de acção – devemos fazer tudo para pôr fim à crise, colocando o país no rumo do crescimento económico com justiça social.
Portugal está a necessitar de palavras de esperança e de projectos mobilizadores como um faminto de pão para a boca. Temos de contrariar a todo o custo a nossa proverbial tendência para a melancolia, a inércia e o derrotismo. Todavia, só palavras verosímeis e projectos realizáveis podem fornecer aquela dimensão subjectiva de optimismo e confiança que os economistas consideram essencial para a retoma da actividade económica. Os maus placebos têm, pelo contrário, um efeito contraproducente e impedem o sucesso de futuras terapias.’
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