terça-feira, dezembro 11, 2012

"E dar-se-ão conta de como é tristemente cómico vê-los, a todos estes defensores da meritocracia e da excelência académica, beijar o anel de Miguel Relvas sempre que a ocasião se proporciona?"

José Vítor Malheiros, Da meritocracia considerada como uma das belas-artes [hoje no Público]: ‘
    ‘A meritocracia tem um problema: tem implícita a ideia de que nem todos merecem. Há quem mereça e há quem não mereça. Há uma ideia de selecção, de recompensa dos mais aptos. Isto não seria um problema em si se soubéssemos definir e delimitar os campos onde o mérito deve ser um critério. É evidente que nem toda a gente merece ganhar uma medalha de ouro na maratona, nem toda a gente merece ser chefe de uma repartição de finanças e nem toda a gente merece ser coronel dos Comandos. O problema não é esse. O problema é que há quem pense que o mérito é um critério tão bom que ele deve ser estendido a todos os domínios, mesmo ao dos direitos humanos. Ou seja: há quem mereça ter direitos e quem não os mereça. Está bem que há quem lhes chame humanos e universais mas isso é secundário.

    É esta a posição do neoliberalismo, que critica por esse facto políticas como o rendimento social de inserção (pobres ignorantes e sem trabalho não merecem nada) e que considera que não só há cidadãos que não merecem emprego (não sabem fazer nada) como, se estiverem desempregados algum tempo, até deixam de merecer subsídio de desemprego, casa, tratamentos médicos ou alimentação e devem apenas ter acesso a tudo isso se alguém lho dispensar como esmola.

    E esta é a fronteira onde a bela meritocracia se torna fascista.

    A facilidade com que esta fronteira é cruzada pode constatar-se pela frequência com que podemos ouvir reputados professores universitários, com uma formação que sugeriria maior sensatez e um cargo que recomendaria maior humanidade, defender a transformação da sociedade portuguesa numa sociedade meritocrática e defender que o mérito seja o único critério de acesso a qualquer benesse que a sociedade disponibilize ao cidadão. Dar-se-ão conta de que foi esta a argumentação usada pelos nazis para defender a eutanásia dos deficientes, aqueles que tinham "uma vida que não merecia ser vivida", uma vida sem mérito?

    E dar-se-ão conta de como é tristemente cómico vê-los, a todos estes defensores da meritocracia e da excelência académica, beijar o anel de Miguel Relvas sempre que a ocasião se proporciona?’

Sem comentários :