O António José Seguro que uma Judite de Sousa muito cordial trouxe ontem até às nossas casas é inverosímil. A firmeza tensa não bate certo com o chocante bodo aos ricos que resultou da reforma do Código do IRC. A voz grossa não se conjuga com a passividade perante as sucessivas atrocidades cometidas para liberalizar os despedimentos. A reclamação de vitória no recente acórdão do Tribunal Constitucional remete-nos para as peripécias em torno da fiscalização sucessiva do Orçamento do Estado para 2012, quando Alberto Costa e mais uns tantos deputados tiveram de avançar contra a vontade de Seguro. O ar resoluto não se harmoniza com as posições titubeantes em relação à reposição dos brutais cortes nos salários dos trabalhadores do Estado e nas pensões. A assumpção oral da defesa dos portugueses tropeça na inconsistência de uma estratégia de resistência ao desmantelamento do Estado Social. A intuição da propaganda esbarra no espartilho do Tratado Orçamental.
Uma entrevista não permite transformar uma personagem naquilo que ela não é. Uma personagem que, durante três anos, se revelou incapaz de mobilizar os portugueses para resistir aos múltiplos ataques ao Estado de direito, levados a cabo por uma pandilha que assaltou o poder com promessas falsas.
António José Seguro convenceu-se de que, fazendo-se de morto, o poder lhe cairia no colo. O que as eleições europeias mostraram é que os portugueses não acreditam que ele represente uma alternativa consistente à da pandilha que se alçou ao poder: porque, relativamente a questões fundamentais, cedeu, nuns casos, ou assobiou para o ar, noutros casos.
O problema central que aflige os portugueses não é o sistema político. São as políticas de empobrecimento e de destruição do Estado Social que esta pandilha leva a cabo — com uma oposição dormente por parte do PS. Naturalmente, a afirmação sonsa de Seguro de que não fará promessas nas próximas eleições legislativas para não ter de as quebrar no Governo não pode galvanizar os portugueses. Os cidadãos pressentem que Seguro, com mais ou menos afecto, só tem para lhes oferecer a continuação da austeridade.
O que o «novo» António José Seguro que Judite de Sousa nos serviu ao jantar mostrou é que ele leu, de pernas para o ar, os resultados de domingo. Quando os portugueses poderiam ter a esperança de que o PS se autocriticasse das cedências e hesitações políticas dos últimos três anos, o ainda líder do PS foi pescar às águas do populismo, com a agravante de tudo o que agora propõe atabalhoadamente ter rejeitado antes.
O aspecto empolgado com que António José Seguro se apresentou na TVI faz lembrar o canto do cisne. Os seus amigos deveriam trazê-lo à realidade, sussurrando-lhe ao ouvido: game over.
16 comentários :
Apoiado - é exactamente o que penso. Só não pensa assim, ou parecido, quem está satisfeito com as medidas criminosas deste governo, ou seja, quem aprova "os múltiplos ataques ao Estado de direito, levados a cabo por uma pandilha que assaltou o poder com promessas falsas." (entre aspas, citado do post).
MTorres
Excelente. É mesmo isso tudo.
Não imagino João Soares, Álvaro Beleza, o Laranjeiro, o Zorrinho, o António Galamba e o Brilhante, entre outros, a sussurrar-lhe: "game over".
Talvez, "in extremis", os anciões Almeida Santos e Mário Soares, tenham ainda que fazer o papel que Maria de Belém não fez...
É exactamente isso. Este homem, que levou três anos a empatar enquanto o povo sofria, sai de cena sem dignidade nenhuma.
António Costa já é irreversível...
O que estavam à espera!!!!
Alguém ainda se lembra do Contra Informação e do ... Tó-Zé Inseguro???
RS
O AJSeguro meteu-se numa camisa de sete varas e cada dia que passa (ou mesmo hora) fica mais embrulhado, é fatal.
E eles sabem, sim (JSoares, Beleza, Zorrinho e etc). Por mim, que sou uma otimista, é uma questão de dias até aceitarem o debate e o desafio, agora em termos normais. Mesmo significando terem de aceitar um novo ciclo no PS. O que irão fazer, não terão mesmo outra hipótese
"Ó senhor primeiro ministro, devolva lá um subsídio ...",
implorava ele na AR quando era discutido o OE para 2012, que cortou os 2 subsídios aos trabalhadores do sector público e reformados.
Momentos deprimentes esses que ainda recordo com "raiva".
O ainda chefe de fila do secretariado minimalista do PS fez voz grossa na entrevista simpática da Judite. Usou de argumentos que constituem um insulto à inteligencia de quem se suponha atento e informado. O que me afligiu (eu que n sou militante de nenhum partido) é a mesma falta de honestidade intelectual na argumentação de Seguro que sempre encontrei nos estarolas do governo. Parecia a sombra do Coelho. Com uma diferença: é que o azedume do discurso e a agressividade na linguagem e nos termos que dirigiu a Antonio Costa são muito mais acintosos do que aqueles mimos com que sempre tem tratado o governo. Isto explica muita coisa: o desastre eleitoral, a falta de credibilidade e perda de confiança junto do eleitorado tradicional do PS e a decadência irremediável de um líder sem chama, sem projecto e sem ideias. Resta-lhe ainda, tentar sair com dignidade!
https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=5eiM2wG2JGk
Belo texto. Muito bem escrito do ponto de vista retórico , senhor Abrantes SP.
O bater de asas de Costa provoca tsunami na Secretaria geral do PS e azia profunda acompanhada de tremuras convulsivas no laranjal
Caíu o pano, tózero elevado a menos infinito.
Já há mais de 2 anos que escrevi que era tempo de o PS passar à ofensiva. Estarão os opositores do actual secretário geral do PS Dispostos a esse procedimento ou trata-se apenas de uma evolução na continuidade? Estarão eles dispostos a contestar a actual arquitectura do Euro e da UE? Estarão eles dispostos a enfrentar com firmeza o Eixo Paris --Berlim e seus satélites?
Estou à espera destas respostas de forma urgente.
O António Costa vai dar mais um primeiro ministro de merda, outro distribuidor de tachos. Seguro não tem carisma mas ao menos é honesto!
Enviar um comentário