quinta-feira, dezembro 18, 2014

A entrevista

• Rui Pereira, A entrevista:
    «Sujeito à medida de coação de prisão preventiva, José Sócrates foi proibido de conceder uma entrevista a um jornal semanário. A proibição suscitou curiosidade na opinião pública e várias questões jurídicas relevantes. Quem proibiu a concessão da entrevista: o Ministério Público, o juiz de instrução, o Diretor-Geral dos Serviços Prisionais ou todas essas entidades? A proibição é legítima à luz da Constituição e do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade? E justifica-se, no caso concreto, de acordo com os dados disponíveis?

    A lei aplicável (de 2009) estabelece que, "tratando-se de recluso preventivo, a autorização da entrevista depende ainda da não oposição do tribunal". A expressão "ainda" causou confusão, mas tem um significado preciso: nos casos de cumprimento de pena de prisão, cabe ao Diretor-Geral dos Serviços Prisionais conceder a autorização, por estar sobretudo em jogo um problema de administração penitenciária; estando em causa a prisão preventiva, é preciso que haja autorização do juiz e do diretor-geral. Se algum se opuser, não pode haver entrevista.

    Em suma, o juiz tem competência para impedir uma entrevista de um recluso preventivo e não apenas para "dar parecer". Cabe-lhe ponderar o prejuízo dessa entrevista para as finalidades da prisão preventiva (prevenir o perigo de fuga, perturbação do inquérito, continuação da atividade criminosa ou perturbação da ordem pública). É claro que a sua decisão é passível de recurso, mas a norma que o habilita a decidir não é inconstitucional. O recluso preventivo é excecionalmente privado da liberdade de expressão, em função de uma medida de coação avulsa.

    Justifica-se a proibição de dar uma entrevista neste caso? De entre todos os perigos, só a perturbação do inquérito poderá ser invocada. Porém, tal justificação não se basta com a inconveniência da entrevista na perspetiva da acusação. Seria necessário que a entrevista pudesse frustrar a atividade probatória, o que aconteceria se, por exemplo, tivesse o propósito de intimidar testemunhas ou de avisar suspeitos. Sem conhecer o processo, é difícil avaliar a medida de coação aplicada. Todavia, a proibição da entrevista não é facilmente compreensível.»

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