quarta-feira, março 11, 2015

Depois dos brutais sacrifícios, onde está a economia portuguesa? [2]

Da conferência intitulada «Grécia e agora?», organizado pelo Instituto de Direito Económico Financeiro e Fiscal (IDEFF), reproduz-se a intervenção de João Galamba:


    «(…) Agora, nós crescemos menos e é menos sustentável. Porquê? Porque, por cada euro do PIB, ou seja, por cada euro que a economia cresce, nós degradamos mais do que no passado o nosso tão fantástico défice externo que tinha sido corrigido. Ou seja, nós dantes tínhamos um défice, é verdade, mas ele já vinha de trás, porque não há memória nos últimos anos — acho que nunca deve ter acontecido — de a economia portuguesa ter crescido tão pouco (0,9%) e não ter investido significativamente.

    O investimento, ao contrário do que diz o ministro Paulo Portas, não cresceu 5%, cresceu 2,3%, estando hoje ao nível de 1986, o ano em que começaram a vir fundos europeus para Portugal. Portanto, nós regredimos 30 anos em níveis de investimento e o que conseguimos crescer nem serve para manter a capacidade produtiva.

    Mas, portanto, hoje por cada euro de PIB, por cada euro que Portugal cresce, nós degradamos muito mais a balança externa do que no passado. Ou seja, se nós quisermos de facto dizer se estamos melhor ou pior do que no passado, todos os dados mostram que estamos pior: crescemos menos e crescemos de forma menos sustentada.

    A única razão por que não temos um défice externo como no passado é que ainda temos muito emprego para recuperar, muito consumo para recuperar e muito investimento para recuperar. Mas, se com 0,9% nós já degradamos o saldo externo em 30%, se 0,9% degrada 30%, acho que qualquer pessoa perceberá que o ajustamento magnífico do défice externo dos últimos anos foi totalmente insustentado. Porque, se este ano com 0,9%, degrada 30%, é fazer as contas e perceberemos rapidamente que o défice desaparecerá num ápice assim que os portugueses recuperarem algumas condições de vida.

    Nós temos aqui se quisermos uma quadratura do círculo que é: ajustámos brutalmente o défice externo quando o défice público correu mal. Porquê? Porque como fizemos colapsar a procura interna e fizemos colapsar o emprego — havia menos contribuições sociais, menos IVA, menos consumo, e, portanto, as receitas fiscais foram por aí abaixo. Agora, que deixamos de corrigir o défice externo e até o estamos a degradar, corre mal no défice externo e corre bem no défice público. Porquê? Porque grande parte do crescimento do consumo foi assente em automóveis, que pagam muitos impostos — pagam imposto automóvel, pagam o IVA. Portanto, paradoxalmente quando correu bem no défice externo correu mal no défice público e quando agora corre mal no défice externo volta a correr mal no défice público.

    O que é que isto mostra? Que não corrigimos nada, apenas andámos aqui conjunturalmente a ajustar as coisas, mas não ajustámos nada de verdadeiramente estrutural e a prova disso é que, quando começamos a recuperar um bocadinho, voltam logo os desequilíbrios do passado. (…)»

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