sábado, junho 27, 2015

Elefantes na sala


• Pedro Silva Pereira, Elefantes na sala:
    «No início da semana, Christine Lagarde, directora-geral do FMI, disse que um acordo com a Grécia dependia de uma única coisa: que os negociadores se comportassem como "adultos na sala". O que depois se provou é que o problema na sala não era a falta de adultos, mas sim o excesso de elefantes.

    À hora a que escrevo, Bruxelas permanece ainda ensombrada pelo espesso fumo negro que sai das sucessivas rondas de negociações com a Grécia. Todavia, paradoxalmente, apesar da enorme intensidade dramática deste prolongado impasse à beira do precipício, todos sabem que é praticamente inevitável que acabe por haver acordo. Em primeiro lugar, porque ninguém quererá assumir o ónus de, com a saída da Grécia, mergulhar a zona euro numa arriscada aventura por "águas desconhecidas" que seria capaz de ressuscitar, mais tarde ou mais cedo, aquele mesmo famigerado "nervosismo dos mercados" que já uma vez arrastou a Europa, enquanto o diabo esfregava um olho, para uma gravíssima crise das dívidas soberanas. Em segundo lugar, e decisivo, porque, depois de todas as cedências feitas pelo Governo grego, já não seria possível responsabilizar o Syriza pelo falhanço nas negociações.

    Na verdade, depois da forma quase efusiva como foram recebidas e saudadas, tanto pelos parceiros europeus como pelos mercados, as recentes propostas "construtivas" do Governo de Atenas, é impensável insistir, com um mínimo de credibilidade, na tecla da indisponibilidade de Tsipras e Varoufakis para chegar a um compromisso razoável que permita assegurar a permanência da Grécia na zona euro. Bem pelo contrário, os líderes gregos revelaram-se disponíveis para correr sérios riscos políticos internos para levar ao Parlamento helénico uma proposta muito exigente, que está a léguas das suas (irrealistas) promessas eleitorais.

    Como aqui escrevi (27-2-2015) logo que foi divulgada a primeira lista de reformas apresentada pelo Governo grego, que serviu de base ao pré-acordo com o Eurogrupo e deu lugar à actual fase de negociações, "a permanência da Grécia no euro e as garantias (provisórias) de financiamento do Estado e da economia helénicos foram conseguidos à custa de uma cedência generalizada por parte do Governo grego quanto à execução de uma parte substancial do seu programa político, tal como votado pelos eleitores. E a dimensão da cedência tenderá a revelar-se ainda maior quando o Governo de Atenas for chamado a detalhar e quantificar o impacto orçamental de algumas das medidas que agora anunciou". Mesmo que o Governo grego consiga, como tudo indica face às propostas apresentadas, consagrar metas orçamentais menos estapafúrdias e evitar medidas de cortes nos salários e nas pensões, só a extrema generosidade de Daniel Oliveira (Expresso, 23-6-2015) permite a extraordinária conclusão de que o acordo que se vai desenhando "não é recessivo" e que o pacote de medidas "é de austeridade, mas não a aprofunda".

    A verdade, evidentemente, é outra: o enorme aumento de impostos já admitido e proposto pelo Governo grego, sobretudo no IVA, no IRC e nas contribuições sociais, acompanhado da redução de diversas prestações, integra um vasto pacote de novas medidas de austeridade que totalizam 1,51% do PIB apenas no segundo semestre de 2015 e 2,87% em 2016. E tudo isto, recorde-se, para um acordo meramente provisório, destinado apenas a assegurar o recebimento da última "tranche" do programa de assistência financeira em vigor (porventura com a sua extensão até ao final do ano), o que significa remeter para mais tarde uma nova e complexa negociação sobre o futuro financeiro da Grécia no euro, incluindo a questão incontornável da sua monumental dívida pública. Em suma, se o objectivo do Syriza era um acordo para a permanência no euro que passasse pela renegociação da dívida pública e pelo abandono da política de austeridade, poderá dizer-se, já nesta altura, que não conseguiu uma coisa nem outra. O que não quer dizer, note-se bem, que seja um erro aceitar aquele acordo, por uma razão simples: não há para a Grécia uma alternativa melhor. Talvez com esta dolorosa experiência a extrema-esquerda compreenda melhor o que significa a responsabilidade de governar.

    A verdade é que os termos essenciais do acordo nunca estiveram nas mãos do Governo grego, como nunca estão nas mãos do devedor. Decisivo, mesmo, é que do outro lado da mesa, com a faca e o queijo na mão, havia demasiada gente politicamente interessada no pior acordo possível para a Grécia, aquele que significasse a menor legitimação de uma alternativa política ao pensamento dominante e a menor inflexão possível na política de austeridade. Esses defensores radicais da "linha dura" foram, desde o início, os verdadeiros "elefantes" naquela sala das negociações. Infelizmente para a Grécia, e ao contrário do que disse Lagarde antes de ela própria travar um acordo que parecia eminente, não foi a falta de "adultos" que dificultou a negociação. Foi o poder de uma manada de elefantes.

    P.S. - A incontornável actualidade das negociações com a Grécia impede-me de comentar esta semana a interessante resposta de Francisco Louçã, no blogue do Público, ao meu artigo da semana passada sobre a Parceria Transatlântica (TTIP). Voltarei oportunamente ao assunto, não perde pela demora.»

2 comentários :

Anónimo disse...

In a large Greek Colony, 200 B.C., cavafy

That things in the Colony are not what they should be
No one can doubt any longer,
And though in spite of everything we do go forward,
Maybe - as more than a few believe - the time has come for a Political Reformer]
But here's the problem,
Here's the pitch:
They make a tremendous fuss
About everything, these Reformers (what a belief it would be?
If no one ever needed them). They probe everywhere,
Question the smallest detail
And right away think up radical changes
That demand immediate execution.

Also, they have a liking for sacrifice:
Get rid of that property
Your owning it is risky
Properties like those are exactly what ruin colonies
Get rid of that income
And the other connected with it
And this third, as a natural consequence
They are substantial, but what can we do?
The responsibility they create is damaging

And as they proceed with their investigation,
They find an endless number of useless things to eliminate -
Things that are, however, difficult to get rid of

And when, all being well, they finish the job,
Every detail now diagnosed and sliced away
And they retire, also taking the wages due to them
It will be a miracle if anything's left at all
After such surgical efficiency

Maybe the moment has not yet arrived,
Let's not be too hasty.
Haste is a dangerous thing
Untimely measures bring repentance
Certainly, and unhappily, many things in the Colony are absurd
But is there anything human without some fault?
And after all you see, we do go forward.

Anónimo disse...

O mundo necessita de Lideres com pensamento grande e conhecimento profundo das misérias do mundo. Liders com alma e com historia de vida. Como Obama, como o Papa Francisco. De Lideres com uma linha democrática e moderada. Não de fanáticos. Saiu-nos Merkel, essa filha ... de pastor protestante, nada e criada e formada na Alemanha de leste. Saiu-nos o gnomo da cadeirinha de rodas. Saiu o merdas barroso, mas ainda anda a minar! Do lado da social-democracia e do socialismo estamos no grau zero da indigência, metidos no bolso do PPE, de costas para o eleitorado. Saiu-nos o coligado Steinbruckner. Saiu-nos o Dijsselbloem, e saiu-nos a gelatina do Hollande! São todos os políticos dos nossos dias, o que há. Fanáticos serventuários dos mercados, gente sem ideais, sem pátria, sem alma e sem espinha dorsal. Estamos aqui, estamos metidos noutra guerra. A terceira guerra europeia, de cerco e guerrilha. A Europa do pensamentu único, a europa alemã, do egoísmo e da malvadez, ainda não sabe que já foi apanhada no terror interno e no grande anel de fogo à sua volta, a leste e a sul. No Titanic também tocavam a valsa!Em Berlim cantava a Marlene D.
Reflito nos caprichos da sorte, que nunca o é. Que um homem como Churchill, foi em limite o escolhido por um povo cercado, escolhido por uma elite e por instituições democráticas que tiveram a grandeza de o escolher. Fez toda a diferença para a humanidade. E penso como o saudoso e decadente Dominique Strauss Khan (DSK) se deixou abater. ironicamente com ele no poder, nunca teríamos descido tão baixo. Cm ele nem o FMI, nem a França, nem a União Europeia, teriam chegado aos grau zero da decadência politica e económica. Polémico, não? Mas real!