sábado, julho 04, 2015

UNESCO


• Francisco Seixas da Costa, UNESCO:
    «Em 2012, o Governo decidiu que a nossa missão junto da UNESCO deixaria de ter um embaixador dedicado exclusivamente à organização, como sempre aconteceu, e que o lugar passaria a ser exercido, cumulativamente, pelo embaixador em França.

    Várias vozes se ouviram contra esta decisão, demonstrando a insensatez da mesma, num tempo em que o país comemorava ainda a elevação do fado a "património imaterial" da UNESCO, quando aí levávamos a cabo uma delicada negociação para a compatibilização da construção da Barragem de Foz Tua com o estatuto do Alto Douro Vinhateiro como "património material", além de outros dossiês complexos.

    Portugal enfraqueceria assim uma das frentes de defesa e promoção da língua portuguesa, numa organização a que o Brasil ou Angola dedicavam embaixadores e uma crescente atenção, onde o modelo cumulativo de representação só era seguido por um grupo reduzidíssimo de pequenos países da UE. O acompanhamento das questões do mar, a que Portugal dedicava uma atenção pelo menos retórica, ficaria igualmente debilitado por este gesto.

    O credenciado diplomata que ocupava o posto da UNESCO estava nele há menos de um ano e teve de ser transferido para outro destino. Mudar um embaixador é caro, envolve encargos, significa a perda de uma rede de contactos. Encerrar a residência de uma embaixada também, com finalização de contratos, despedimento e indemnização de pessoal, transporte de mobiliário, etc. Mas a decisão cumpriu-se, claro. E o embaixador em França (que, por acaso, era eu) assumiu as novas tarefas. A UNESCO não gostou e fez-nos sentir isso.

    Passaram três anos. Foi agora anunciado que o Governo decidiu recolocar um embaixador junto da UNESCO. A questão, que fique claro, não está na pessoa escolhida, está na incoerência entre as duas decisões. Lá vamos ter que realugar uma casa, mobilá-la, contratar pessoal e toda a panóplia de passos necessários à instalação do novo chefe da missão.

    Ao senhor presidente da República, a quem parece que cabe a última palavra sobre a nomeação dos embaixadores, não terá por acaso ocorrido perguntar ao Governo por que motivo a solidez das razões que levaram a retirar o embaixador em 2012 (com a sua anuência) parece estarem infirmadas em 2015? Mudou o ministro? Ora essa! Então as decisões não são do Governo e esse não é o mesmo? E, no Governo, não é hoje vice-primeiro-ministro a pessoa que, em 2012, era o ministro dos Negócios Estrangeiros?

    Fica a ideia de que se anda a brincar com o dinheiro e com a dignidade do Estado.»

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