O Expresso on-line anuncia que a comissão de serviço de Paulo Macedo não será renovada, pois o Governo não terá encontrado forma de lhe continuar a pagar, sem infringir a lei, o principesco vencimento que exige. Não sei se a notícia corresponde à verdade. Admita-se que sim e faça-se um pequeno exercício retrospectivo.
A reforma da tributação da despesa, nos meados dos anos 80, e, sobretudo, a reforma da tributação dos impostos sobre o rendimento e sobre o património, nos finais dessa década, foram decisões absolutamente precipitadas. Foram razões políticas que as impuseram, sem ter em conta que não chegava preparar uns códigos fiscais (cerzidos só deus sabe como).
Nem a estrutura da administração fiscal estava preparada, nem as questões relacionadas com a operacionalidade dos impostos estavam asseguradas. Terá sido o esforço dos funcionários do fisco (a par de umas engenhocas artesanais) que salvou a face dos governos de então.
Por exemplo, os dados constantes das declarações de IRS eram então recolhidos nuns “cartuchos”, que eram enviados pelo correio para serem lidos pelo sistema informático central. Não havia programas para fazer a liquidação de todos os tipos de rendimentos sujeitos a IRS. Não havia programas de cruzamento de dados. Ninguém tinha a menor ideia do IRS pago nos CTT ou na banca. As repartições de finanças davam ainda passos muito tímidos na informatização. E tantos, tantos outros exemplos poderiam ser dados.
Os sucessivos governantes não abriram os cordões à bolsa para munir a administração fiscal dos meios informáticos de que ela necessitava. Eduardo Catroga, na sua breve visita ao Terreiro do Paço, e, sobretudo, Sousa Franco foram os ministros das Finanças que, em primeiro lugar, se aperceberam do descalabro. Muitos dos programas informáticos que agora permitem a Paulo Macedo luzir foram nessa altura concebidos ou encomendados.
Por outro lado, houve, nos últimos anos, uma mudança radical relativamente à atitude a tomar em relação à fraude fiscal. Guterres teve de recuar perante campanhas demagógicas contra a exigência de passar factura, a exposição pública dos devedores, a tributação dos sinais exteriores de riqueza e, em geral, a introdução dos métodos indiciários em direito fiscal. O Prof. Marcelo, que então liderava o PSD, a tudo isto se opôs (embora agora seja o campeão da luta contra o enriquecimento ilícito)… Paulo Macedo beneficiou também desta nova cultura na sociedade para aceitar o combate à fraude fiscal, que permitiu a adopção de um conjunto de instrumentos legais que, anteriormente, haviam sido negados à administração fiscal.
Quer isto dizer que o actual director-geral dos Impostos não acrescentou valor à DGCI? Não. Paulo Macedo trouxe inegavelmente uma maior agressividade na cobrança dos impostos. Mas a um director-geral exige-se mais do que ser administrador da empresa O Cobrador do Fraque.
E se Paulo Macedo, por um lado, pôde recorrer a um sistema informático que, pela primeira vez, permite o cruzamento de dados e, por outro lado, beneficiou de um vento favorável, do qual resultou a introdução instrumentos legais que facilitam a cobrança dos impostos, a verdade é que não conseguiu transformar o fisco numa administração moderna. Ele andou a rapar o tacho, o director-geral que vier a seguir, se se confirmar a notícia, terá muito trabalhinho pela frente. Depois de ser reactivo com Paulo Macedo, o fisco precisa de ser activo. É mais complicado — porque exige a eliminação de procedimentos obsoletos, porque requer que sejam desmanteladas certas cumplicidades, porque vai ser necessário passar a pente fino os alegados planeamentos fiscais "agressivos" e meter as mãos na economia paralela.
Com a licença do Doutor Saldanha Sanches, não se prevê que Paulo Macedo possa repetir as palavras de Luís XV: “Depois de mim, o dilúvio.”
PS — Dívida acumulada dos contribuintes ao Estado soma 16.500 M€. O Dr. Paulo Macedo é director-geral dos Impostos para o bom e para o mau, não é?
4 comentários :
De acordo. Um Director Geral tem que ser mais do que um gestor de uma base de dados.
Subscrevo este post. O problema, aqui, no entanto, não é a questão de princípio. É mais a finalidade.
O DGCI sai porque não é da maçonaria, nem adepto das forças vivas que o PS vai alimentando.
Aliás, para se ver isso, basta ler Vital Moreira.
Isto por aqui, continua a ser um arremedo do mestre.
Paulo Macedo saí por uma única e simples razão: não é da "causa nossa".
Que vá para o Millenium
A verdade é que o estado este ano apenas está a conseguir atingir os seus objectivos em alguns serviços público porque contratou milhares de estagiários aos quais paga uma miséria.
´Para estes não há férias, subsídio de Natal ou qualquer outro tipo de direito, sendo que como dentro da AP as chefias compreenderam que os objectivos só estão a ser minimamente cumpridos por causa desta mão de obra barata, resolveram em uníssono pedir ao governo a sua manutenção por mais tempo, porém, como ainda não conseguiram resolver o problema dailegalidade da precariedade profissional, os ministros andam todos a pedir pareceres para tentar impedir a saída dos estagiários, até porque em alguns casos o estado gastou com eles verbas elevadas em formação.
Esta situação podia talvez ser explicada pelo seu ministro da economia que já está habituado a publicitar no estrangeiro a nossa mão de obra barata, agora pode também juntar a isto a precariedade do vínculo profissional, citando o exemplo do estado português.
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