quinta-feira, novembro 19, 2009

Um exemplo, por favor

            “Artigo 377º-A
            Enriquecimento Ilícito

            1 - O titular de cargo político, o titular de alto cargo público ou o funcionário que (…) adquirir (…) ou bens de consumo, de valor manifestamente discrepante do seu rendimento declarado para efeitos fiscais e que não resultem de nenhum meio de aquisição lícito é punido com pena de prisão até 5 anos.
            2 – Se o enriquecimento previsto no número anterior, resultar de vantagens obtidas pela prática de crimes cometidos no exercício das suas funções públicas o agente será punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.”
              Projecto de lei do BE (com a sintaxe intacta)



Um reconhecimento prévio: o anúncio de que o BE apresentara uma nova iniciativa sobre o crime de enriquecimento ilícito foi hábil. Conforme foi divulgado pelo Público, ficou a ideia de que o BE teria dedicado os últimos tempos a construir uma solução jurídica que configurasse este novo crime de forma a não violar o princípio da não inversão do ónus da prova.

Vai-se a ver e o projecto de lei agora apresentado (o PJL 43/XI) é exactamente o mesmo que fora apresentado pelo BE na anterior legislatura (o 769/X).

Adiante. Admitindo, porém, que todos os contributos para este debate são positivos, há, pelo menos, duas questões que carecem de resposta clara.

A primeira pergunta que moscarda o espírito é que ilícitos podem estar aqui incluídos? São os crimes que já constam do Código Penal? Se assim for, existe alguma vantagem nesta estranha criminalização de crimes, a que aqui se procede? Se o objectivo é o agravamento da pena, não bastaria alterar a moldura penal no respectivo artigo?

A única alternativa lógica é, portanto, haver meios ilícitos de enriquecer que não estejam abrangidos por nenhum dos crimes do código. Neste caso, agradecia-se um exemplo. É que, na ausência deste, a única interpretação possível e lógica é que, de facto, se consagra aqui a inversão do ónus da prova.

Aí sim, este artigo faz pleno sentido, ficando o acusado com o ónus de provar a licitude da aquisição e, não o conseguindo, automaticamente provada a sua ilicitude. Assim, sim, caberiam aqui mais casos para além dos crimes já previstos no código, entendimento que é confirmado pelo n.º 2, que admite que o enriquecimento ilícito possa não resultar da prática de crime.

É verdade que na exposição de motivos do projecto de lei se declara que cabe “ao Ministério Público, no âmbito dos seus poderes de investigação, o apuramento dos indícios necessários à acusação e a prova dos mesmos para efeitos de condenação”. No entanto, não estando este princípio vertido em qualquer passagem do articulado do diploma, isto mais não é do que “wishful thinking”.

E não ocorrendo a inversão do ónus da prova — como garante Francisco Louçã —, este artigo deixa pura s simplesmente de fazer sentido.

8 comentários :

Anónimo disse...

Alem dos pontos já identificados, para mim é criptico o que significa "que não resultem de nenhum meio de aquisição lícito"

Eu não sou jurista, mas para mim em português o "meio de aquisição" não é a mesma coisa que "a obtenção dos meios".

O que raio é um "meio de aquisição ilicito"? È a forma como adquiri e não a forma como obtive os meios para adquirir.

Esta proposta não só subverte o ónus da prova e admite a punição sem estar sujeito á practica de algum crime, como é escrito de forma incompetente.

Decorre directamente do texto da proposta que os objectos desta lei não são abrangidos desde que deixem o dinheiro debaixo do colchão...ou os mantenham numa conta á ordem durante 5 anos.

Miguel

Anónimo disse...

Com textos destes ainda querem que a Justiça opere. Alguém sabe quem é o jurista de serviço do B.E.?

Pedro L disse...

O jurista não sei quem é, mas talvez até seja algum dos «incendiários» que costumam aqui vir opiniar «quais mourinhos» do direito.

chacal disse...

A PIDE e os fascistas andam por aí.

Anónimo disse...

Mas, o BE faz algum sentido?
Tou em querer que não.
Então, as "bacoradas" do Louçã, ainda fazem menos, penso eu, de que.

Zeca

Francisco disse...

E a alternativa? Manter o status quo?

Anónimo disse...

Qual status?

Anónimo disse...

quo! status quo.