terça-feira, maio 10, 2011

Coisas que o Alexandre Homem Cristo (e Pedro Passos Coelho) podia(m) aprender (2)

Alexandre Homem Cristo [AHC] continua a descrever o estado da educação. Depois do truque de ontem, hoje há mais, e um daqueles dos clássicos. AHC afirma que as taxas de escolarização e de conclusão do ensino básico e secundário aumentaram imenso porque passaram a ser contabilizados os alunos dos cursos do Novas Oportunidades. Os gráficos deles “demonstram-no”. O problema é que AHC é melhor a descrever do que a analisar, e, consequentemente, a retirar consequências técnicas e políticas.

Onde está o Wally no seu argumento? No indicador que usa: a taxa de bruta de escolarização (ou o número de alunos que terminam um nível de ensino), que deve ser colocado no seu contexto e tem pouca leitura comparativa. AHC não encontrará comparações internacional relevantes a partir da taxa bruta de escolarização do ensino básico ou secundário. O indicador essencial para avaliar a capacidade de um sistema educativo formar jovens é a taxa real de escolarização. Qual é a diferença?

- A taxa bruta de escolarização dá-nos a “relação percentual entre o número total de alunos matriculados num determinado ciclo de estudos (independentemente da idade), e a população residente em idade normal de frequência desse ciclo de estudo” (definição aqui, página 122);
- A taxa real de escolarização dá-nos a “relação percentual entre o número de alunos matriculados num determinado ciclo de estudos, em idade normal de frequência desse ciclo, e a população residente dos mesmos níveis etário” (definição aqui, pág.123).

No que diz respeito à taxa de bruta de escolarização, como se vê no gráfico em baixo (daqui, pág. 30), os seus valores são quase superiores a 100% (exceptuando a educação pré-escolar), o que é compreensível, tendo em conta que há alunos mais velhos e atrasados em relação ao nível de ensino em que deviam estar a estudar. Ela aumenta substancialmente em 2008/2009 porque os alunos em RVCC são adicionados aos números. É só isto. Tudo é transparente, tudo está discriminado, como as próprias tabelas de AHC mostram.





Mas a taxa bruta de escolarização não é um indicador essencial, seja técnica, seja politicamente. Ter uma percentagem elevada num dado ano e num dado nível de ensino pode querer dizer que o sistema é muito ineficiente e produz imensa repetência (conclusão má), ou que houve um afluxo extraordinário de alunos (recuperados ao insucesso escolar, ou captadas através de vias alternativas de ensino), mostrando que o sistema foi capaz de adequar a oferta à procura (conclusão boa). Esses alunos podem ser mais velhos, quando entram no sistema por vias alternativas. E qual é o mal? O problema era se não fosse transparente.

Para comparações internacionais da escolaridade dos jovens, é a taxa real de escolarização que é relevante (ver quadro seguinte; dados daqui, pág. 29). É isto que o último quadro do post de ontem mostrava, quando comparava a taxa de conclusão do ensino secundário entre Portugal, a OCDE, e a UR19. Confundir a taxa bruta com a taxa real leva a que, por má fé ou ignorância, AHC afirme que o “sucesso estatístico” se deveu à contabilização dos inscritos no Novas Oportunidades.

Isto é falso. Se o AHC se der ao trabalho de separar o trigo do joio – isto é, a taxa real da taxa bruta – percebe que a taxa real foi sempre subindo, sem explodir “artificialmente”:

- no 2.º ciclo do ensino básico, o valor era de 86,4% em 2004/05, e 94,9% em 2008/09;
- no 3.º ciclo do ensino básico, era de 82,5% em 2004/05, e 87,3% em 2008/09;
- no ensino secundário, era de 59,8% em 2004/05, e de 68,1% em 2008/2009.





Outra forma de olhar para este fenómeno de crescente capacidade do sistema captar os jovens na idade relevante – e não os mais velhos via Novas Oportunidades - é olhar para a taxa de escolarização no ensino secundário aos 15, 16 e 17 anos (aqui, pág.56), que sobe continuamente desde o valor mais baixo atingido em 2005/2006.





E quanto ao “facilitismo”, temos que usar os instrumentos de avaliação internacionalmente disponíveis, em vez da demagogia barata e preguiçosa. O instrumento é o PISA, que historicamente sempre serviu para “provar” que os nossos alunos não aprendiam nada. Os resultados do PISA2009 mostram melhorias notáveis. Resultado? Agora o PISA já não interessa.

Esperamos mais “análises“ de AHC sobre o “estado da educação” em Portugal.
    Pedro T.

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