- ‘O vosso empresariado descobriu a China para vender o que produzíamos nas vossas fábricas. Para lá tratou de deslocalizá-las, substituindo-nos (e a vocês) por explorável mão-de-obra local. A falta de competitividade das nossas economias não é só culpa nossa: a UE desindustrializou-se nas últimas décadas, pagou a agricultores para não produzirem e a pescadores para não pescarem. E agora, que não temos fábricas, agricultura ou barcos, vêm empresas alemãs buscar-nos jovens qualificados mas sem trabalho. Dão jeito também para conter os vossos salários.
O euro pode ruir amanhã: por mais cimeiras que façam, esses aprendizes de feiticeiro não controlam o feitiço que puseram à solta nos mercados financeiros. Os vossos bancos, com o choque do Lehman Brothers, terão aprendido a livrar-se do subprime tóxico incautamente acumulado. Mas não despacharam obrigações emitidas pelos nossos Estados e desvalorizadas quando a Sra. Merkel negou que dívidas soberanas pudessem ser resgatadas. Depois tiveram mesmo de ser. E os especuladores ficaram a perceber que valia a pena especular, muitos apostados em arrasar o euro. Ao exigir haircuts aos privados no resgate da Grécia, a Sra. Merkel deu-lhes gás: dispararam juros e o contágio na zona euro.
A especulação já dobra Espanha e Itália e ameaça França. É urgente que a Alemanha deixe o BCE assumir-se como financiador de último recurso na zona euro. Na verdade, o BCE já acorre a aflições, mas compra dívida a investidores, em vez de directamente aos Estados. Quanto ao reforço do FEEF, já se viu que não vamos longe, com o patético apelo aos chineses...
Os portugueses estão a penar para equilibrar contas. Perigosamente, sem equidade social e em dose cavalar de austeridade recessiva, ditada pela nossa direita, mais "troikista" que a troika. Mas só com austeridade ninguém paga dívidas! Precisamos de estratégia e recursos para relançar crescimento e emprego. E de políticas de coesão e convergência para contrariar crescentes desequilíbrios macroeconómicos entre países do euro. Os vossos superavites orçamentais, amigos alemães, são contrapartida dos nossos défices.
Para não terem de nos sustentar, deixem mutualizarmos a dívida, para voltarmos aos mercados a juros comportáveis; respeitando regras, bem-entendido, mas beneficiando da boa notação que vocês e poucos na zona euro ainda mantêm. Chamem-lhes eurobonds, "obrigações de estabilidade" ou o que queiram.
Queremos mais Europa, incluindo união fiscal, contra a evasão, a fraude e o dumping fiscal que priva os nossos Estados de cobrar impostos a empresas que se domiciliam no Luxemburgo ou na Holanda sem declarar o que ganham pelo mundo. Queremos o imposto sobre transacções financeiras que propõe o ministro Schauble, para fúria do Cameron e da City - além do que renderá para investirmos na economia, trava a drenagem para off shores.’
2 comentários :
O facto é que neste momento, com os programas de austeridade, os paises intervencionados estão a ser castigados e a efectuar sacrificios para que nada se altere. Por mais austeridade que façamos continuamos sem acesso aos mercados e iremos continuar enquanto durar o braço de ferro com a merkl. Para todos os efeitos estamos a trabalhar forçado para obter uma goluseima no fim, sendo que já nos apercebemos que essa goluseima não existe nem nunca vai existir, se continuar este estado de coisas.
Concordo totalmente com a análise realista e desassombrada da Ana Gomes, assim como com o comentário do anónimo das 11.55PM.
Esta é a realidade, não a que o governo nos tenta mostrar...é um"bluff" total.
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