• Manuel Caldeira Cabral, Solução europeia compromete PIB potencial:
- ‘O caso português é particularmente grave. O ajustamento da despesa está a ser mais acentuado exactamente onde era menos desejável – na queda do investimento privado. Os números revelados na passada terça-feira revelam que a queda do investimento se acentuou e que esta está a ser acompanhada pela queda da produção industrial.
A correcção de situações de défice externo e orçamental resulta sempre em diminuição da procura agregada e numa inevitável queda do PIB efectivo no curto prazo. Num ciclo normal, esta retracção cria lugar para um crescimento mais acentuado na retoma, levando a economia a retomar a trajectória do seu PIB potencial. No entanto, o prolongar e acentuar da actual crise está a criar um risco de se estar a comprometer não apenas o PIB de curto prazo, mas também a evolução do PIB potencial.
A forte diminuição do investimento, que se encontra hoje a níveis semelhantes aos de 1989, coloca em causa a evolução futura da economia. A falta de confiança dos investidores está já a comprometer o crescimento futuro, podendo significar que a retoma será mais lenta do que seria desejável. No caso português, a redução do investimento vai resultar num não aproveitamento de uma parte substancial dos fundos comunitários, desperdiçando um factor de atenuação da crise no curto prazo, e um impulso ao crescimento de longo prazo, se estes fossem aplicados em actividades produtivas.
Também o desemprego pode resultar em queda do potencial da economia. O aumento do desemprego de longa duração (confirmado pelos números desta semana) significa que muitos trabalhadores estão a degradar o seu potencial. O facto de os trabalhadores inactivos durante longos períodos, perderem aptidões, desactualizarem os seus conhecimentos, perderem confiança, etc., conduz à perda de capital humano, resultando em diminuições do PIB potencial no médio e longo prazo. O mesmo acontece aos jovens com o adiar da entrada no mercado de trabalho.
No caso português, há que juntar a este fenómeno a emigração de jovens qualificados. Num país em envelhecimento, esta perda significa uma queda importante no PIB potencial, uma perda de capacidade futura de pagar a dívida, de garantir a Segurança Social, etc.
Tudo isto significa que a trajectória de ajustamento que Portugal e os países da Zona Euro escolheram, que acentua a redução da despesa como único instrumento, além de mais dolorosa é também menos eficaz do que a trajectória seguida pelos EUA, Japão ou Reino Unido, que escolheram um ajustamento mais suave e utilizando um conjunto de instrumentos mais alargado, nomeadamente a desvalorização e o financiamento por emissão de moeda.
Esperemos que o Orçamento de Estado possa trazer novidades nas políticas de estímulo ao investimento, privado, produtivo, criador de emprego e de preferência em sectores transaccionáveis. O Ministério das Finanças terá de apresentar não só uma política de consolidação, mas também uma política de estímulo ao crescimento que a torne credível.’
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